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Maysa Polcri
Publicado em 22 de janeiro de 2024 às 16:35
Menos de 3,2 quilômetros separam Madre de Deus, na Região Metropolitana de Salvador, e a pequena Ilha de Maria Guarda. O trajeto é percorrido em até dez minutos, quando realizado de barco. Tempo suficiente para que um naufrágio causasse a morte de sete pessoas, no domingo (21). Até agora, os órgãos públicos não sabem quantos passageiros estavam na embarcação, o que só deve ser determinado pela perícia realizada pela Polícia Civil. >
A ausência de informações sobre as circunstâncias do saveiro Gostosão FF no momento do acidente é resultado dos problemas de fiscalização na Baía de Todos-os-Santos. A embarcação envolvida no acidente é do tipo ‘recreio e esporte’ e não tem autorização para realizar o transporte pago de passageiros. Mesmo assim, ela levava pessoas que retornavam à Madre de Deus depois de uma festa realizada na ilha próxima. >
Sem fiscalização ou bilhetes de compra, a Capitania dos Portos não sabe informar quantas pessoas estavam na embarcação no momento do naufrágio. “É muito complicado precisar o número de passageiros. Quando chegamos ao local, muitas pessoas disseram que haviam cerca de 25 pessoas a bordo [...] Temos a informação de que há dois desaparecidos, que é o nosso principal foco de busca”, disse o Wellington Lemos Gagno, capitão dos portos da Bahia, durante coletiva de imprensa realizada na manhã desta segunda-feira (22). >
Por volta das 15h30, o corpo da sétima vítima do acidente foi localizado na Ilha do Pati. O homem de 41 anos foi identificado como Vanderson Souza. As equipes de busca ainda procuram por uma criança que está desaparecida. >
A embarcação teria deixado a Ilha de Maria Guarda depois das 19h30, que é o horário máximo permitido para a realização do trajeto. O dono do saveiro e piloto no momento do acidente está sendo procurado pela polícia. É comum que embarcações não autorizadas realizem o transporte pago de passageiros, de acordo com Ednei de Azevedo Silva, presidente da Associação do Transporte Marítimo de Ilha dos Frades. >
“Essa tragédia foi causada por uma embarcação que não deveria realizar comércio. Situações desse tipo sempre acontecem e nós não podemos impedir as pessoas de pegarem seus barcos e transportarem passageiros”, afirma. “Quando nós tentamos falar [que está errado] os marinheiros chegam a ameaçar e dizem que estamos querendo mandar na ponte”, completa. >
A ação só é reprimida quando a Capitania dos Portos realiza a fiscalização na localidade, o que tem sido intensificado durante a Operação Verão 2023/2024. A ação vai até 29 de fevereiro e, desde que teve início, em 15 de dezembro, realizou 9,6 mil abordagens. Mesmo assim, moradores de Madre de Deus denunciam a insegurança no transporte marítimo. >
“As vidas não são respeitadas. A gente paga R$1,50 por cada travessia, mas não tem segurança e nem coletes salva vidas para todos. Se cabem 15 pessoas, eles colocam o dobro, é sempre super lotado”, revela Mônica de Jesus, 40, que há dez anos mora em Madre de Deus. >
Como a Ilha de Maria Guarda faz parte do município de Madre de Deus, a prefeitura da cidade é a responsável por fiscalizar o transporte marítimo em conjunto com a Marinha. Quem explica é o advogado especializado em direito marítimo e portuário Zilan Costa e Silva. >
“Se o transporte é feito dentro do município, a competência de fiscalizar a qualidade do serviço é dele. Todavia, a Marinha fiscaliza a segurança da navegação, o que está relacionado ao atendimento das obrigações de segurança da embarcação e da habilitação da tripulação”, detalha. A Polícia Civil tem até 90 dias para enviar os laudos periciais para o Tribunal Marítimo. >
Segundo a Capitania dos Portos, a prefeitura de Madre de Deus não comunicou à Marinha da realização do evento na ilha próxima. Por isso, não havia nenhum tipo de fiscalização específica na região durante o momento do acidente. Questionada, a gestão municipal ressaltou que o evento ocorreu sem intercorrências no solo. “Não há obrigatoriedade em informar a Capitania pois não se tratava de um evento náutico, e sim no solo da Ilha”, disse a prefeitura. >
O advogado Zilan Costa e Silva lembra ainda da responsabilidade do dono do saveiro, que estava foragido até o início da tarde de segunda-feira (22). “O proprietário da embarcação pode ser responsabilizado, da mesma forma que acontece em acidentes de trânsito. A única diferença é que o inquérito é feito pela Marinha e o julgamento administrativo é feito pelo Tribunal Marítimo”, explica. >