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Thais Borges
Publicado em 2 de setembro de 2023 às 05:00
"É como Angela Davis tanto fala: quando uma mulher negra se movimenta, toda a sociedade se movimenta com ela". A referência da advogada Camila Carneiro, presidente da Comissão de Igualdade Racial da Ordem dos Advogados do Brasil - Seccional Bahia (OAB-BA), à célebre frase da filósofa estadunidense ajuda a entender e embasar o que tem acontecido agora: diversos movimentos em defesa da indicação de uma mulher negra para ser a nova ministra do Supremo Tribunal Federal (STF).
Em outubro, com a aposentadoria da ministra Rosa Weber, atual presidente da Corte, uma nova vaga passará a existir - e, em menos de seis meses, o presidente Lula poderá fazer a segunda indicação em seu terceiro mandato. A primeira foi em julho, quando ele indicou Cristiano Zanin para a vaga deixada pelo ex-ministro Ricardo Lewandowski - ou seja, mais um homem branco no lugar de outro homem branco.
Logo, nada mudou na atual composição do tribunal - todos brancos, com apenas duas mulheres entre 11 ministros. Isso, por si só, já gera insatisfação e desconforto de diferentes setores que defendem mais representatividade, paridade de gênero e equidade racial no Judiciário. Esse sentimento fica ainda mais forte à medida que as apostas de possíveis indicados para a vaga têm crescido colocando apenas homens em vantagem. Assim, se a representatividade feminina já é pequena, ficaria ainda menor, apenas com a ministra Cármen Lúcia.
Foi assim que, nas últimas semanas, cresceram os movimentos que defendem nomes de juristas negras ao STF. De movimentos sociais a acadêmicos, algumas dezenas de mulheres têm sido lembradas e, entre os nomes mais frequentes nas campanhas, estão os de três baianas: a promotora Lívia Sant'Anna Vaz, a procuradora federal Manuellita Hermes e a conselheira federal da OAB Silvia Cerqueira.
Pouco a pouco, as ações foram se avolumando. Um dos primeiros atos foi ainda no 8 de março, Dia Internacional da Mulher, quando 87 entidades divulgaram o 'Manifesto por Juristas Negras no STF'. Em abril, foi a vez da entidade Educafro Brasil divulgar uma lista com 10 nomes de pessoas negras - cinco mulheres e cinco homens - que, em sua avaliação, atendem aos requisitos para ocupar uma vaga na Corte.
No começo de agosto, a Mulheres Negras Decidem lançou uma 'lista tríplice' - indicou publicamente três candidatas para serem consideradas pelo presidente Lula. Já na semana passada, a congregação da Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia (Ufba) aprovou duas moções em favor de juristas específicas - Lívia Vaz e Manuellita Hermes, ambas egressas da instituição.
Membro da congregação da Faculdade de Direito, a professora Alessandra Rapacci lembra que, desde a criação do STF, em 1891, foram 170 ministros nomeados. Dentre eles, apenas três homens negros e três mulheres - nenhuma delas negra. "Nós pensamos que esses espaços de poder precisam ser ocupados de forma diversa: ter homens, mulheres, brancos, negros, indígenas. Quanto maior a diversidade, melhor, porque são diversas experiências e perspectivas para avaliar e julgar, o que significa também favorecer a democracia", explica.
Acesso
Na prática, a mudança no STF iria além do aspecto visual de seus integrantes, como explica a coordenadora política de Mulheres Negras Decidem (MND), Tainah Pereira. Para começar, na avaliação dela, a chegada de uma ministra negra pode transformar a forma como certos temas são discutidos e abordados na Corte, especialmente aqueles que têm a ver com liberdades e direitos individuais.
"Teríamos, pela primeira vez, uma pessoa oriunda de um grupo demográfico muito grande no Brasil, que são as mulheres negras. Esse grupo está muito mais próximo de quem é julgado do que de quem historicamente julga, então tem uma possibilidade de renovação das práticas do sistema de justiça", explica.
A lista tríplice da entidade tem, além da baiana Lívia Vaz, a juíza federal Adriana Cruz, da 5ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro, e a advogada gaúcha Soraia Mendes. A escolha, de acordo com Tainah, levou em conta mulheres que, além da competência e da capacidade de exercer a função de ministra, estavam se colocando à disposição para a disputa.
"Nos últimos 15 dias, surgiram alguns outros nomes e é muito importante dizer que o apoio a esses nomes que colocamos na nossa lista não significa negação de outras mulheres negras que possam figurar como 'supremáveis'. Nosso compromisso é com a indicação de uma mulher negra efetivamente aliada na luta antirracista nas gormas de opressão do estado e há muitas mulheres que cumprem esse requisito", pondera.
A demanda, segundo ela, é histórica. Apesar de mulheres negras serem 28,3% da população brasileira (41,5% na Bahia), as magistradas negras são as menos representadas na Justiça Brasileira. Elas são apenas 11,2% das juízas titulares e 12,1% das desembargadoras, segundo um estudo do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). No caso específico das desembargadoras, o percentual chega a ser maior do que o dos desembargadores negros, que é de 7,8%. Como se tratam de universos diferentes, contudo, o número bruto revela que elas são minoria em todos os contextos - são 45 desembargadoras negras contra 93 desembargadores negros.
Os debates sobre mais representatividade começam a crescer a partir dos anos 2000, quando também passa a haver um significativo aumento de pessoas negras encarceradas, principalmente em função das mudanças nas políticas sobre drogas no país. Em 2021, quando o ex-presidente Jair Bolsonaro estava prestes a indicar o (hoje) ministro André Mendonça, a discussão foi reacendida.
Na ocasião, a advogada Soraia Mendes lançou uma “anticanditatura”, que chegou a receber o apoio formal de 130 entidades e organizações da sociedade civil, em meio a uma campanha que defendia um STF “laico e independente”. Mendonça, que entrou no lugar de Marco Aurélio Carvalho, foi apontado pelo próprio Bolsonaro como “terrivelmente evangélico”. Naquele mesmo ano, houve outro marco: o lançamento do livro A Justiça é Uma Mulher Negra, assinado por Livia Sant’Anna Vaz e Chiara Ramos.
Enquanto isso, a maioria das pessoas que precisa da Justiça é negra, como ressalta a advogada Camila Carneiro, da OAB. “Se a maioria dos jurisdicionados, a maioria dos que buscam acesso à Justiça são pessoas negras, por que elas não exercem jurisdição? Por que a gente não se vê?”, argumenta.
Temas
Só este ano, o STF pautou - ou deve pautar - julgamentos com desdobramentos impactantes na sociedade, como o da descriminalização do porte de drogas para consumo pessoal e o marco temporal para demarcação de terras indígenas. No primeiro caso, o julgamento foi suspenso, após pedido de vista de André Mendonça, no mês passado, com o placar 5 a 1 pela descriminalização. Já o do marco temporal será retomado no próximo dia 20, com o placar 4 a 2 contra a tese.
Para a advogada, uma justiça justa deve refletir a sociedade não só na "cara" - ou seja, na composição - mas também nas decisões relativas à saúde, educação, políticas sociais e políticas de segurança pública. "Quando você vem de baixo, que é de onde a maioria das mulheres vêm, a gente consegue compreender a realidade melhor. Não significa que a gente vai decidir com parcialidade, mas que vai aplicar o conceito constitucional do que é igualdade e isonomia. Fica muito mais justo o processo", reflete Camila.
A OAB-BA não defende especificamente o nome de nenhuma candidata, no entanto, a entidade reforça que a Justiça deve ser paritária e equitativa, bem como que os espaços devem ser ocupados por pessoas plurais. De forma pessoal, porém, ela também é uma das juristas que engrossa a defesa de uma mulher negra na Corte. "Todas as três (baianas) são potências imensas e todas as outras mulheres que estão sendo aviltadas nesse processo também. Com qualquer uma delas, estaremos bem representadas", enfatiza.
Outros temas que podem ser discutidos com outro olhar, na avaliação de entidades ouvidas pelo CORREIO, são o reconhecimento facial por meio de câmeras - que se tornou política pública em estados como a Bahia - e questões relacionadas a direitos sexuais e reprodutivos. Há uma expectativa de que o julgamento da ADPF 442, que pede a descriminalização do aborto até a 12ª semana de gestação, volte à pauta este ano. A ação é relatada pela presidente Rosa Weber.
O STF não pauta os julgamentos por conta própria. A Corte trata do que chega até ela, como explica a professora Alessandra Rapacci, docente da Faculdade de Direito da Ufba. A ADPF do aborto, por exemplo, foi proposta pelo PSOL em 2017. No entanto, as decisões do tribunal têm implicações na sociedade. Além disso, ela aponta que é possível pautar certas discussões internamente, com a criação de grupos de trabalho internos, no funcionamento, capacitações e eventos temáticos.
“Tem também uma importância a partir do momento em que quem está no STF também vai estar à frente do CNJ. Então, é possível dar um direcionamento no sentido de pautar algumas discussões e orientar o Judiciário a partir de suas resoluções, como a gente teve agora durante a covid-19”, lembra, citando a resolução que determinava que pessoas com doenças graves e gestantes deveriam ser liberadas do cumprimento de pena no sistema prisional.
Quando um ministro assume a presidência da Corte, é essa pessoa quem irá definir quais ações e processos serão julgados pelo tribunal. “A gente vê, por exemplo, com o presidente passado (Luiz Fux) que a questão da descriminalização das drogas ficou parada. Rosa Weber assume e ela traz para a pauta. A discussão não partiu do STF, ele foi provocado, mas ele também pode fazer adormecer quando o processo fica ali parado”, afirma.
Preparadas
Desde que a Educafro propôs a lista com nomes de 10 juristas negros, cerca de 30 outros juristas entraram em contato com a entidade. Na lista da entidade, as cinco mulheres incluíam a promotora baiana Lívia Vaz, além da juíza federal Adriana Cruz, a advogada Soraia Mendes, a juíza auxiliar do STF Flávia Martins de Carvalho e a advogada Vera Lúcia Araújo.
“Não trabalhamos em prol de uma jurista ou um jurista. Nós trabalhamos por uma causa. Então, quando recebemos esses telefonemas de homens e mulheres negras dizendo que estão em cidades pequenas, que também têm mestrado, doutorado, que atuam há 20 anos, a gente fica feliz em ver a quantidade de negras e negras preparados no Brasil”, diz o diretor executivo da entidade, Frei David Santos.
Segundo ele, entidades e movimentos progressistas têm ficado assustados com os votos de Cristiano Zanin, tidos como conservadores. Zanin, por exemplo, foi o único a divergir no julgamento pela descriminalização do porte de drogas até o momento - como a sessão foi suspensa, o placar ficou em 5 a 1.
Esse sentimento tem feito com que a expectativa pela próxima indicação seja ainda maior. “Em 90% dos casos, os presos por porte de pequenas (quantidades de) drogas são negros e pobres. Será que esse homem (Zanin) não percebe isso?”, questiona.
O STF, na avaliação de Frei David, precisa refletir as diferentes realidades da população brasileira. Ele cita o exemplo do próprio presidente Lula, que teve uma trajetória em que passou pela pobreza antes de chegar ao Executivo do país. “A gente tem que querer e exigir que Lula seja responsável com o povo afrobrasileiro e com as mulheres. Estamos preocupados porque ele insiste em dizer que o cargo é dele, mas o cargo é do povo que o elegeu. Estamos sendo muito traídos pela esquerda ao longo da história e não aceitamos mais isso”, pontua.
Além da indicação, a entidade defende a mudança no decreto presidencial que determinou que 30% dos cargos de confiança sejam ocupados por pessoas negras. Esse percentual, no texto original, deve ser preenchido até dezembro de 2025. Na avaliação da Educafro, porém, é preciso fazer uma emenda que indique que até 30 de setembro de 2023, o percentual seja de 15%, com 25% em 30 de setembro de 2024 e, por fim, 30% até 30 de setembro de 2025.
“É inaceitável que ele coloque qualquer um mais uma vez, principalmente os amiguinhos que frequentam e jantam em sua casa. O povo negro não teve chance de frequentar a casa dele, então não vão ser amigos. Se o critério é esse, nós somos excluídos porque nós, negros, não conseguimos andar e almoçar com ele. Tem que ser mais republicano”, completa.
Endossando a nomeação de uma ministra negra, a nova reitora da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB), Georgina Gonçalves ressalta que as desigualdades sociais no Brasil passam pelo racismo, pelo patriarcado e pela misoginia. Primeira mulher negra a ocupar a reitoria da instituição, a professora foi empossada na última quarta-feira (30), em Brasília, depois de ter sido eleita pela primeira vez em 2019 e não nomeada pelo governo de Jair Bolsonaro.
Ela destaca o momento histórico vivido pelos brasileiros atualmente, em que mulheres deram provas de resistência e força na reconstrução da democracia. "Essa luta deve poder ser significada com a representação dessas mulheres nos espaços de poder. Portanto, uma escolha de uma ministra diz respeito não apenas como resgate e reparação, mas também como disposição de ter a presença desses corpos na nossa sociedade", diz.
Para a reitora, a demanda é do movimento de mulheres, mas deve ser de todos os democratas, com o objetivo de ter uma representação mais próxima da sociedade. "Eu sinceramente espero e acredito que o presidente Lula possa considerar essa possibilidade de representação. Isso deixaria muitas de nós felizes, com mais esperança e mais disposição de luta".
Manuellita Hermes, procuradora federal da AGU
"O percurso de Manuellita Hermes como procuradora federal, professora e pesquisadora evidencia sua total capacidade para suceder a Ministra Rosa Weber na Corte. Como mulher negra e nordestina, a experiência da jurista é um exponencial fator para a progressiva concretização de direitos no exercício da jurisdição constitucional, seja pelo notável saber jurídico, seja pela representatividade que será fomentada no STF”.
Com essa conclusão, a congregação da Faculdade de Direito da Ufba foi uma das instâncias e entidades que vêm defendendo a nomeação da jurista Manuellita Hermes ao STF. Formada pela instituição em 2006, Manuellita tem uma trajetória de trabalho que passa pela Bahia e por Brasília. Procuradora na Advocacia Geral da União (AGU), foi também advogada na Petrobras e secretária de altos estudos, pesquisa e gestão da informação no STF.
Dedicada aos estudos, desde cedo ela tentou aproveitar o que a Ufba oferecia, inclusive buscando disciplinas em outras unidades. Na graduação, se envolveu com os núcleos de assistência e assessoria do Serviço de Apoio Jurídico (Saju) da Faculdade de Direito. "Ter o apoio da academia, da minha casa primeira, a Ufba, por meio de uma moção espontaneamente organizada por professoras e professores, me enche de gratidão. Só tenho a agradecer a cada docente! Não se chega a nenhum lugar sozinha", comemora.
Soteropolitana da Boca do Rio, a procuradora diz que ver seu nome sendo ventilado entre candidatas e candidatos a deixa honrada. Ela cita como inspiração o trabalho das três ministras mulheres que já passaram pelo STF - Ellen Gracie, Cármen Lúcia e Rosa Weber. Ainda assim, reforça que a presença de mulheres negras em órgãos colegiados é importante.
"A democracia envolve pluralismo e diversidade. É relevante que o Judiciário, como guardião da democracia e da Constituição, espelhe a pluralidade do corpo social brasileiro, sem discriminação e regido pelos princípios da igualdade e da solidariedade", diz ela, que lembra que a representatividade tem efeito multiplicador. "Além disso, as nossas meninas e mulheres poderão olhar para aquela Corte e saber que é possível. Mulheres e crianças da Liberdade, bairro de meus pais, ou da Boca do Rio, onde nasci, poderão ter a certeza do poder transformador da educação e da universidade pública! Poderão sonhar e acreditar", acrescenta.
Doutora em Direito e Tutela pela Universidade de Roma Tor Vergata, ela desenvolve pesquisas nas áreas de direito comparado, direito internacional, direitos sociais, cidadania, migração e constitucionalismo feminista. Como professora e pesquisadora, atuou na Universidade de Brasília, na Escola Superior da AGU e no Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP).
"A eficácia do direito, tão propalada e almejada, perpassa pela construção de formas de erradicação da desigualdade de gênero e da discriminação étnico-racial que ainda se encontra em diversos âmbitos da sociedade brasileira. Em alguns casos, a presença feminina negra e nordestina pode trazer diferentes perspectivas em julgamentos em que haja a necessidade de um olhar plural de uma vivência, de uma experiência social e jurídica", analisa.
Silvia Cerqueira, advogada e conselheira federal da OAB
Filha de uma professora e de um motorista, a advogada Silvia Cerqueira nasceu na Liberdade, em Salvador. Única aluna negra no Colégio da Mercês, onde estudava, ela ouviu de um professor de História que seria uma boa advogada. Foi assim que decidiu fazer vestibular na Universidade Católica do Salvador (UcSal), onde se formou em 1978. Desde então, são 45 anos se dedicando à advocacia.
Na OAB, onde é conselheira federal desde 2007, soma outros 30 anos de atuação. “Acredito que a lembrança do nosso nome venha exatamente em função de estar batalhando com os meus pares e demonstrando aos demais companheiros que não são negros dessa necessidade que temos de ver as instituições como espaço de pertença de todos”, diz.
Ela explica que, formalmente, existem acessos garantidos por lei, mas, na prática, essa representatividade não se dá como deveria, sobretudo nos tribunais superiores. Segundo a advogada, as pessoas negras não se reconhecem nesses espaços.
Assim, temas que visam a promoção da igualdade são alguns dos que ela acredita que a presença de uma ministra negra no STF pode fazer diferença. Um mecanismo que pode ser usado nesse caso é a promoção de audiências públicas para escutar as diferentes vozes. Ela cita, ainda, debates sobre direitos humanos, meio ambiente e questão climática e sustentabilidade.
“Não dá mais para qualquer instituição, principalmente do Judiciário, estar distanciada do jurisdicionado”, defende. “Se eu recebo para julgar um caso de racismo, minha sensibilidade ao olhar vai ser diferenciada, porque eu sei o que é viver o racismo e o preconceito. Não quer dizer que outros colegas magistrados não tenham essa sensibilidade, mas é diferente sentir na pele”, acrescenta.
Além da atuação como advogada, Silvia é doutora em Direito Constitucional pela Universidade de Buenos Aires e autora de livros sobre gênero e raça no Judiciário. Em 2009, ela foi sub-relatora na consulta que o STF encaminhou à OAB para ADPF 186, que questionava a constitucionalidade do sistema de cotas com critério étnico-racial nas universidades no STF (a ação foi rejeitada). Atualmente, ela é segunda suplente do senador ngelo Coronel (PSD).
Ao longo da carreira, ela dedicou-se à temática dos direitos humanos com recorte de gênero e raça. Na OAB, foi uma das responsáveis por conseguir implementar 30% de cotas raciais no conselho federal. “O fato de ter uma mulher negra no tribunal superior é um exemplo que tem todo um significado. Neste primeiro momento, é simbólico, porque uma pessoa sozinha não terá capacidade de fazer transformação efetiva mas poderá dar muitos sinais internos no tribunal e também para toda a sociedade da necessidade de ter uma justiça plural e diversa”, completa.
Lívia Sant'Anna Vaz, promotora de Justiça
"Se eu pedir para qualquer um de vocês imaginar a Justiça, vocês pensaram numa mulher branca de olhos vendados, a Têmis da mitologia grega", dizia a promotora Lívia Sant'Anna Vaz no último sábado (26), durante o Festival Literário de Paracatu (MG). No entanto, ela argumentou em seguida que não era bem assim: para ela, a Justiça é uma mulher negra. "A Justiça é uma mulher negra porque Oyá não tem os olhos vendados", explica.
Oyá, outro dos nomes de Iansã, é a orixá dos ventos e da justiça, ao lado de Xangô. Para Lívia, que é co-autora de um livro também chamado A Justiça é Uma Mulher Negra, essa mulher-justiça é alguém que sempre terá uma espada em riste para enfrentar os desafios para construir justiça.
"Ela jamais terá os olhos vendados. Uma justiça de olhos vendados tem a capacidade apenas de manter as coisas como estão, de manter o status quo. Não é essa a justiça que nós queremos. Não é essa justiça que se faz a Mãe Bernardete, não é essa justiça que se faz aos povos quilombolas e indígenas do nosso país", completou, na ocasião.
Promotora do Ministério Público do Estado da Bahia (MP-BA) desde 2004, ela foi eleita uma das pessoas de descendência africana mais influentes do mundo pela Most Influential People of African Descent, entidade que já defendeu sua indicação ao STF em carta aberta.
Formada em Direito pela Ufba em 2003, ela também concluiu uma graduação em Relações Públicas dois anos depois, na Universidade do Estado da Bahia (Uneb). No ano passado, terminou o doutorado em Direito na Universidade de Lisboa.