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Millena Marques
Publicado em 21 de março de 2025 às 11:03
Imagine criar recifes artificiais por meio de estruturas de concreto, aço, madeira ou ferro para criar ecossistemas sem ferir a vida marinha. Essa estratégia existe e tem sido cada vez mais comum em Salvador. Trata-se do naufrágio controlado, um projeto que envolve o afundamento de embarcações não poluentes. Nesta sexta-feira (21), aliás, o ferry-boat Juracy Magalhães será afundado no Rio Vermelho. Mas, afinal, o que acontece com a embarcação no fundo do mar?
Bem, a estrutura metálica serve de aporte do recife artificial. Dessa forma, toda a vegetação que será recomposta na embarcação vai agregar à superfície do material. Quem diz isso é João Santana, gestor ambiental da Secretaria de Turismo do Estado da Bahia (Setur-BA). "Essa estrutura serve como base de toda a vida marinha que ali vai circundar após a realização desse afundamento", diz.
Segundo ele, a embarcação sofrerá um processo de decomposição após centenas de anos. "Uma embarcação no mar pode durar muitos anos. Ela de fato não é decomposta. Ainda mais no fundo do mar, onde o intemperismo e outros fatores que agridem, lá embaixo é muito minimizado", pontua. O biólogo Marcelo Peres, do Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Inema), diz que não há uma precisão sobre esse período por causa da oxigenação baixa no fundo do mar.
O ferry-boat Juracy Magalhães será afundado sete anos após sair de operação. O local escolhido fica próximo ao Largo da Mariquita, no Rio Vermelho, três quilômetros da costa e em uma profundidade de 30 metros. Essa é a terceira embarcação naufragada de forma controlada em Salvador. As outras duas, o ferru Agenor Gordilho e o rebocador Veja, foram afundados na Baía de Todos-Os-Santos em 2020.
"Esses afundamentos feitos proporcionaram um crescimento de mais de 400% na procura da atividade de mergulho aqui na Bahia. Para que vocês tenham ideia, hoje nós não temos mais vagas. As empresas que vendem essa experiência para a visitação do navio que vai ser afundado hoje, para domingo, já não tem mais nenhuma vaga. E os outros navios que estão também afundados, são bastante demandados", disse o secretário de Turismo da Bahia, Maurício Bacelar.
A Baía de Todos-os-Santos possui, ao todo, cerca de 10 embarcações afundadas por causa de acidentes, das guerras de independência ou pelo naufrágio controlado. Segundo Bacelar, Salvador é o maior parque de turismo de mergulho do mundo urbano. "As nossas embarcações afundadas estão muito próximas daqui do litoral e também há uma profundidade, o que possibilita de que amadores possam, em poucas horas, sendo treinados, fazerem essa experiência", diz.
Para o naufrágio controlado acontecer, a embarcação é totalmente despoluída, vistoriada pelos órgãos ambientais e pela Marinha. O processo licitatório da operação começou em abril de 2023. "Depois do estudo prévio, a gente fez diversas inspeções à embarcação, que a gente precisa ter certeza de que não tem nenhum resíduo. Um óleo, madeira, vidro. Foram quatro inspeções que a gente fez, acompanhados pela marinha, pela engenheira naval", diz Marcelo. Espécies invasoras também são retiradas embarcações durante o processo.
Meio ambiente e cultura
Além dos benefícios econômicos associados ao turismo subaquático, o afundamento controlado das embarcações gera benefícios para a biodiversidade. "Vai ser criado um abrigo novo, um refúgio da biodiversidade que você vai atrair. Novas formas de vida e, futuramente, peixes naquela área ali (onde a embarcação será afundada)", explica Marcelo Peres.
Para o secretário estadual de Turismo, esse projeto é uma forma que fortalecer atividades culturais. "É a gente manter no fundo do mar a cultura, o conhecimento de uma determinada época da navegação. Se esse navio não fosse afundado, ele provavelmente seria transformado em ferro velho e vendido. Com o afundamento planejado, não. Ele vai para o fundo do mar e preserva a memória de uma época", diz.