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Larissa Almeida
Publicado em 7 de novembro de 2024 às 02:15
Em cinco anos, a Bahia teve um salto de 161% no número de mortes decorrentes de intervenção das forças do Estado. Em 2019, foram 650 vítimas de ações policiais, enquanto, em 2023, o total foi de 1.702 vidas perdidas. Os dados são do boletim Pele Alvo: mortes que revelam um padrão, realizado pela Rede de Observatórios da Segurança. A quantidade de mortes contabilizadas pela Bahia no ano passado foi a segunda maior registrada pela entidade desde a primeira edição, quando o Rio de Janeiro teve 1.814 vítimas da letalidade policial.
Dudu Ribeiro, integrante da Rede de Observatórios da Segurança e pesquisador da Iniciativa Negra, aponta que o crescimento de casos corresponde a parte do período de vigência da Resolução 01/2019, aprovada pela Secretaria de Segurança Pública e pelas polícias baianas na gestão do ex-governador Rui Costa, que comprometeu a capacidade de a Polícia Civil investigar óbitos causados por policiais militares.
“Isso fez com que, não coincidentemente, as mortes provocadas pela Polícia Militar crescessem de forma exponencial. Essa resolução foi declarada inconstitucional pelo Tribunal de Justiça da Bahia apenas quatro anos depois da vigência. É por isso que a população sente os impactos dessas mudanças e está colhendo os resultados de uma política equivocada e ineficiente, que fortaleceu a lógica da guerra”, ressalta.
A falta de apuração das denúncias de ilegalidade, por sua vez, instaurou uma nova forma de registrar os casos policiais nos últimos anos. Eles basicamente passaram a ser reportados pelos próprios policiais ao Governo através de um informe. “É um documento que parece uma nota pronta que se repete para qualquer caso e localidade. Normalmente, diz que o policial foi acionado pela população, mas nunca há indicação de quem acionou e sempre se refere a uma hipotética prática criminosa que nunca é descrita”, detalha Samuel Vida, coordenador do Programa Direito e Relações Raciais da Universidade Federal da Bahia (Ufba).
Além disso, a postura do governo do estado em relação a todo esse cenário é outro fator que contribui para o crescimento do número de mortos por ações policiais, conforme afirma Samuel Vida. “O governo tem assumido uma postura de não reverberar a condenação moral e legal dos excessos. Nós temos casos emblemáticos que caminham para mais de 10 anos sem nenhuma manifestação governamental. Eu daria como exemplo o caso de Giovanni, o caso de Davi Fiúza ou o caso de Pedro Henrique”, diz.
“O que nós tivemos em 2015, no episódio da chacina do Cabula, foi um governador comemorando e comparando a ação policial que matou 12 pessoas a um jogo de futebol. Isso cria um ambiente que é lido pelas forças policiais, especialmente policiais que operam fora da legalidade, como uma espécie de aval, como uma espécie de cobertura por parte do governo petista”, acrescenta.
Diante desse quadro, a sugestão dos especialistas para dar um basta a letalidade policial é pensar a segurança pública para além da polícia. “Enquanto a gente tiver um equipamento de guerra no centro do pensamento sobre segurança pública, nós vamos continuar produzindo guerra. É necessário que a segurança pública seja pensada intersetorialmente e com foco absoluto na preservação de todas as vidas, inclusive na vida dos agentes da segurança pública, que tem adoecido e morrido por conta dessa lógica”, finaliza Dudu Ribeiro.