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Vitor Rocha
Publicado em 8 de outubro de 2024 às 05:45
Fechada a apuração no último domingo (6), Salvador teve um marco histórico: a marisqueira Eliete Paraguassu (Psol) se tornou a primeira quilombola eleita para vereança na Câmara Municipal de Salvador. A ambientalista do Quilombo Porto dos Cavalos, na Ilha de Maré, recebeu 8.479 votos na capital baiana, integrando a lista dos 43 parlamentares que assumem a partir de 2025.
Atuando como ativista ambiental desde os anos 1990, a "mulher das águas", como se autodefine, afirmou que sua eleição representou a quebra de uma barreira, especialmente pela bandeira central de sua campanha: o combate ao racismo ambiental. "Sou pescadora, defensora do mangue, do meio-ambiente. O maior ganho foi a gente conquistar essa cadeira representando o povo das águas, os trabalhadores das águas e os povos quilombolas. Mesmo sabendo que vou trabalhar para Salvador, a cidade mais negra fora de África, que me acolheu com tudo que eu carrego. Eu carrego história, não carrego diploma. Eu carrego marcas de lutas sociais", destacou.
Doutor em Ciências Sociais pela Universidade Federal da Bahia (Ufba), Umeru Bahia disse que a eleição de Eliete na capital baiana pode ser um canal de defesa para as populações que sofrem com o racismo ambiental. "A importância de termos uma parlamentar eleita de origem quilombola é aumentar as possibilidades de evitar mais violações sobre as populações vulnerabilizadas. A eleição de uma parlamentar como Eliete Paraguassu é uma vitória de toda a sociedade e da própria democracia, porque é a chance de termos no parlamento uma representante política quilombola, pescadora, marisqueira e que poderá expor o racismo ambiental", opinou.
O sociólogo ainda explicou que o tipo de desigualdade socioambiental combatido por Eliete é produto de ações humanas que afetam o território de populações marginalizadas e que, por isso, deve ser combatido. "É racismo porque há uma violência contra uma etnia e é ambiental porque são violações no campo do ambiente, sobre o território", definiu.
Com foco na luta antirracista e ambiental, Eliete fará parte da bancada de oposição ao prefeito Bruno Reis na Câmara. Entre os 43 vereadores eleitos, sete são opositores, mesmo número de parlamentares apenas do partido de Bruno. No entanto, Eliete afirmou que, através da pressão popular e do apoio de movimentos sociais, será possível articular-se politicamente, mesmo diante de uma diferença parlamentar tão expressiva. "A gente tem aliança com o governo Federal. Eu tenho amigas e companheiras ministras que estão apoiando a campanha das águas. Os companheiros que são de esquerda, a gente é um quilombo. A gente vai se acolher um ao outro e se juntar para fazer frente ao que está posto na cidade", complementou.
A nova vereadora de Salvador ganhou notoriedade após denunciar, a partir dos anos 1990, a ausência de políticas públicas e o racismo ambiental na Ilha de Maré. Ela apontou que a ilha, majoritariamente habitada por pescadores, sofre pela proximidade com grandes indústrias. "A gente pautava questões que traziam processos de morte no território. As pessoas tinham um número de câncer alarmante, porque a gente está falando de menos de 1 km de um dos maiores complexos industriais do estado da Bahia", denunciou. Eliete também relatou que a água da região já esteve contaminada por metais pesados provenientes desses complexos, destacando uma pesquisa realizada pela Universidade Federal da Bahia (Ufba) em crianças da Ilha de Maré, na qual a grande maioria apresentava níveis de metais pesados acima do aceitável. Entre as contaminadas estava sua filha, Diana Conceição.
Eliete entrou para a política partidária em 2020, quando ficou como suplente para a vereança em Salvador. Posteriormente, atuou como coordenadora-geral de Assistência Técnica e Extensão Pesqueira no Ministério da Pesca do governo Lula, até retornar à Bahia e ser eleita em 2024. A baiana é filha do pescador Daniel Conceição e da marisqueira Zenilda Paraguassu, e tem dois filhos: Diana e Diego Conceição.