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Fernanda Santana
Publicado em 28 de dezembro de 2024 às 02:00
O fim de ano passa, mas tem gente que fica com a sensação de que ele vai durar para sempre. E não por motivos felizes. É nesta época do ano que psicólogos notam o aumento do número de pacientes aflitos com a sensação de que o mundo lá fora vai bem, só eles não.
“Esse aumento de demanda começa desde os meses finais do ano: outubro, novembro, com as decorações de Natal nas ruas, o tema dos encerramentos, as confraternizações”, explica a psicóloga Laís Vilasbôas. “Ao contrário do que costumamos pensar, o final de ano pode não ser doce para muitas pessoas”, diz ela.
É um momento de ambiguidade, segundo Vilasbôas: se tanta festa pode gerar ansiedade, a decisão de se isolar também é um gatilho, para quem já é acompanhado por psicólogos ou não. “É como se o mundo estivesse muito distante de como nos sentimos internamente. Então, se não encontramos alguma forma eficaz de acolher o nosso sofrimento, isso aumenta, pois nos sentimos inadequados”, ressalta Vilasbôas.
O momento ressoa em um país ansioso. São ao menos 13,3 milhões de pessoas sofrendo com algum distúrbio de ansiedade, uma média 3,9% maior que a média mundial, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS).
O clima de renovação, mudança, promessas, reavaliação dos fracassos e reencontros deixa ainda mais vulneráveis a sintomas de ansiedade pessoas que, por exemplo, estão enfrentando o luto.
“O luto pode tornar o momento do final de ano extremamente difícil para qualquer pessoa que perdeu alguém recentemente, para quem está vivendo um processo de separação, de perda de emprego, do rompimento de um vínculo empregatício e de outros finais de ciclos ou relações.”
Mas como lidar com a ansiedade do final de ano?
Embora cada caso exija uma abordagem, há consensos científicos que podem ajudar a lidar com quadros de ansiedade provocados ou intensificados pelo fim de ano.
O exercício físico, por exemplo, nunca sai de moda, pela capacidade de liberação de hormônios de prazer. “O contato com a natureza e com a arte, em especial livros e filmes que tragam ao enredo a resolução de conflitos. A literatura científica é recheada de estudos com relação aos efeitos terapêuticos dessas estratégias”, explica o psicólogo Danilo Cruz.
“Nos inspiramos nas perspectivas colhidas aqui e acolá em filmes, livros, contos de fadas, fábulas, resolvendo nossos conflitos íntimos nas nossas vivências pessoais. Além disso, existe em psicologia o conceito de modelagem, que se refere à aprendizagem por observação das histórias que nos cercam”, ressalta Cruz.
O psicólogo costuma recomendar filmes como Na Natureza Selvagem e A Pior Pessoa do Mundo, com a intenção de “promover reflexões necessárias à superação dos conflitos”.
Mas você também pode ser o produtor da própria arte. “Escrever livremente”, afirma a psicóloga, “pode fazer bem”. “Recomendaria que a pessoa busque conhecer e investir em suas fontes de abastecimento. O que te faz bem? O que te faz sentir relaxado e em contato consigo mesmo? Pode ser escrever, estar em contato com amigos, um banho de mar”, acrescenta a psicóloga Isabela Santos.
Os encontros com amigos ou familiares, no entanto, não podem ser compreendidos como “obrigações” – vale tanto para quem não quer ir quanto para quem convidou. “Você não precisa participar de todas as confraternizações ou se sentir que precisa estar mais recolhido. Você não precisa se forçar a conviver com familiares que têm falas que ferem aquilo que você é”.
Os efeitos podem ser tão danosos quanto o do Burnout, por exemplo. Em dezembro, de acordo com o DataSUS, há um pico nos registros da síndrome do esgotamento mental: no ano passado, 25 (50%) dos 52 casos notificados se concentraram nesse mês.
O uso de redes sociais merece um capítulo à parte nas crises de fim de ano. “As redes sociais maximizam essas cobranças”, explica Isabela Santos. Neste ano, viralizaram postagens com a frase “como vou dizer que fui triste em 2024 se esse ano eu...”, seguida de imagens de realizações.
“É ótimo que a gente se dê conta daquilo que foi bom, mas isso cria a ilusão de que as outras pessoas viveram apenas conquistas e momentos positivos, enquanto o meu ano pode ter sido menos movimentado ou até ter sido marcado por perdas e momentos difíceis”, frisa a psicóloga. “Pode vir daí essa orientação de limitar o tempo ou evitar o uso nesse período”, acrescenta.
“Acompanhar pessoas mais reais ou consumir conteúdos como podcasts também pode ajudar”, aconselha a psicóloga Maria Vitória Calixto. Mas a intensidade da ansiedade no fim de ano também pode ser o indício de uma necessidade - o acompanhamento psicológico. Maria explica que a terapia ajuda a resgatar uma capacidade: avaliar o que te faz bem ou mal.
“A terapia traz esse benefício de você se dar conta do que te faz bem ou mal. Fazendo essa terapia você acaba fazendo um apanhado do ano. No consultório, trabalhamos através de cartas escritas por pacientes, por exemplo, sobre as expectativas para 2025. Porque de fato você começa a se ver melhor”. E essa habilidade atravessará qualquer Réveillon.
1) Se a ansiedade se manifestar na forma de crises de ansiedade ou de pânico, por exemplo, busque ajuda. Uma possibilidade é o Pronto Atendimento Psiquiátrico localizado no 5 ° Centro de Saúde Clementino Fraga.
2) Para aqueles que sentem necessidade ou desejam iniciar o acompanhamento psicológico, há opções acessíveis de atendimento psicológico gratuito, como as clínicas-escola das faculdades de psicologia que retomam o processo de admissão no início do ano.
3) Ligue 188: Centro de Valorização à vida.