Internações por demência na Bahia crescem 181% em dez anos

O lançamento do documentário “Kubrusly: mistério sempre há de pintar por aí”, que narra a história do jornalista Maurício Kubrusly, lançou luz à demência, um conjunto de doenças cerebrais que causam diminuição gradual da capacidade de raciocínio e memória. Na Bahia, o número de pessoas internadas por conta desta condição clínica cresceu 181% nos últimos dez anos. De acordo com dados do DataSUS, o registro de internações no estado por demência saltou de 37, em 2013, para 104, em 2023. Entre janeiro e setembro deste ano, 81 baianos foram hospitalizados pelas enfermidades.

Em 2024, 88,8% dos registros de hospitalizações, ou seja, 72 ocorrências, são de pessoas acima de 60 anos. De acordo com o censo de 2022 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a população de idosos cresceu aproximadamente 57% em relação a 2010 no país. Para o neurologista e professor da Universidade do Estado da Bahia (Uneb) Mateus do Rosário, o aumento de pessoas mais velhas é o que justifica a diferença tão grande no número das ocorrências ao longo do último decênio. “A demência incide mais em pessoas idosas. No entanto, a condição em si não é um motivo de internamento na maioria das vezes. Pode ser um diagnóstico complementar, por exemplo, uma pessoa demente que teve uma queda, um atropelamento ou alguma outra doença”, explica.

Segundo o médico, o conjunto de doenças neurodegenerativas possui fatores genéticos, mas não há consenso sobre todas as possíveis causas. O grupo de enfermidades é dividido entre quatro moléstias principais: doença de Alzheimer, demência vascular, demência com corpos de Lewy, demência frontotemporal. Em via de regra, a demência se caracteriza como um quadro crônico, que não possui justificativas psiquiátricas e gera um declínio progressivo das funções nervosas superiores. Ele explica que casos em pessoas mais jovens são raros e, em geral, são denominados como demências reversíveis. “Raramente é uma doença neurodegenerativa quando é uma pessoa de 40 a 50 anos. A gente chama estes outros casos genericamente desta forma, mas na verdade é uma condição que possui outras causas, como deficiência de vitaminas, infecção, trauma, coisas que possam explicar esse quadro que produz sintomas semelhantes”, declara Mateus.

O conjunto de doenças muda o comportamento do enfermo e todos ao seu redor. É o que conta o morador do Cabula Gabriel Pamponet, de 21 anos, que viu sua avó materna, a aposentada Neide Araújo, ser diagnosticada com Alzheimer há quatro anos. “Antes ela era uma pessoa muito independente, que fazia suas coisas normalmente sem precisar da ajuda de ninguém. Atualmente, ela é uma pessoa muito teimosa, inquieta e precisa de uma cuidadora todos os dias para ajudá-la”, relata.

A demência é uma condição que necessita de investigação e seguimento no atendimento médico para ter uma confirmação do quadro, o que dificulta a descoberta dos pacientes. Segundo estimativas do Ministério da Saúde, mais de 80% dos casos do conjunto de moléstias são subdiagnosticados no Brasil. Para Ligia Gualberto, coordenadora do setor de Atenção à Saúde da Pessoa Idosa da pasta, a estigmatização em volta da doença leva a muitas descobertas tardias. “É necessário desmistificar que a solidão e o isolamento, entre outros comportamentos que indicam sofrimento, seriam algo normal do envelhecimento, porque não são. A gente tem cuidados para ofertar e tem a oportunidade de atuar sobre fatores de risco e sintomas iniciais”, declarou no lançamento do Relatório Nacional sobre a Demência: Epidemiologia, (re)conhecimento e projeções futuras.

De acordo com Mateus do Rosário, não há uma prevenção específica para a doença, mas hábitos saudáveis como alimentação adequada, hidratação e atividade física podem ajudar. “Em geral, utilizamos medicamentos neuroprotetores. Caso não funcione, mantemos o tratamento de estimulação cognitiva, promovendo exercícios para o raciocínio do paciente. Há alguns casos, como Corpos de Lewy, em que também podemos utilizar medicamentos para auxiliar funções motoras”, esclarece.