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Governo leva cinco anos para abrir inventário para preservação de acervo de Frans Krajcberg

Inventário e catalogação das obras tiveram início em 2017

  • D
  • Da Redação

Publicado em 6 de dezembro de 2023 às 06:30

Krajcberg
Krajcberg Crédito: ARQUIVO

Em 2009, o artista polonês Frans Krajcberg doou todo o seu acervo para o Governo da Bahia. Morando em Nova Viçosa, no extremo-sul do estado, de 1972 a 2017, ano de sua morte, ele tinha o sonho de transformar o seu Sítio Natura em um museu ecológico. A escritura de doação foi assinada por Krajcberg e pelo então governador Jaques Wagner durante a abertura do Seminário Nordeste: Água, Desenvolvimento e Sustentabilidade, em Salvador.

Quase 15 anos depois, o desejo de Frans segue sem ser realizado: foi só em 2017, dias após a morte do artista, que ocorreu a abertura do testamento que reforçou as medidas que deveriam ter sido cumpridas ainda em 2009, até 150 dias depois da doação. Entre os dias 21 e 24, foi aberta a primeira etapa de inventário e catalogação das obras.

Em 2013, foi sancionada por Jaques Wagner a Lei Complementar que instituiu o Museu Artístico e Ecológico FransKrajcberg, sob a forma de fundação estatal e que teria sede e foro em Nova Viçosa. Em 2022, com o Sítio Natura – que também passou para o Estado em 2009 – abandonado e sem sinal de museu, o Ipac enviou caminhões para retirada das obras, alegando necessidade de restauração e empréstimos para exposições fora do estado.

De acordo com nota divulgada pela Secult, apenas em fevereiro de 2023 foi aberto o processo para realização do inventário para preservação do acervo, conforme a Portaria nº 010.

Nesta segunda-feira (4), como foi antecipado na coluna de Ronaldo Jacobina, no CORREIO, o Ministério Público divulgou a Ação Civil Pública promovida pelo órgão para que o Governo do Estado cumpra as obrigações do testamento. “O MP considera que o Estado da Bahia não está cuidando do patrimônio, com 48 mil itens, doado pelo artista ao Estado em 2009 com o objetivo de que suas obras fossem preservadas após sua morte”, escreveu Jacobina.

Segundo o promotor de Justiça Fábio Fernandes Corrêa, após o óbito do artista, "poucas ações efetivas foram tomadas pelo Estado para a preservação desses bens". Ele destaca que foi realizada a retirada de todas as obras do artista do Sítio Natura, em Nova Viçosa, que atualmente estão armazenadas no Museu Wanderley Pinho-Caboto, em Candeias, mas que não há notícia sobre o término da catalogação e das ações de restauro necessária às obras danificadas.

“Frans Kracjberg é um artista de referência internacional e sempre quis que o Estado da Bahia preservasse e divulgasse as suas obras, que são um protesto contra a destruição da natureza. infelizmente, o Estado está sendo omisso quanto às suas obrigações com consequências irreversíveis a esse patrimônio cultural”. Fábio Corrêa solicita à Justiça que, quando julgada a ação, além de determinar a execução de plano de gestão, obrigue o Estado a realizar a higienização, embalagem e catalogação do acervo; fiscalização em relação a supostas falsificações de autenticações e obras do artista; apresentação de atividades da Fundação Museu Frans Kracjberg, criado por lei estadual, e um plano de comunicação à população de Nova Viçosa no tocante às ações envolvendo as suas obras e ao Museu; dentre outras medidas.

Em nota, a Secretaria da Cultura (Secult) afirmou que o acervo doado pelo artista está sendo documentado e catalogado, e que a atual gestão da pasta está realizando, através do IPAC, tratativas para um estudo com foco na implantação de um Parque Ecológico no Sítio Natura, com uma infraestrutura que possibilite a abertura para visitação e democratização do acervo.

“Para esta abertura é necessária a renovação da dinâmica local, considerando a reconhecida importância do sítio para o mundo, criando novas oportunidades de vivência e apropriação, com uma utilização que dialogue com os ideais do artista, atraindo a comunidade, os turistas, bem como projetos e investimentos para a preservação do patrimônio existente”, diz o texto da Secult.

No entanto, de acordo com uma fonte próxima da história e carreira de Frans Krajcberg que não quer ser identificada, a criação de um parque ecológico não faz parte do compromisso assumido pelo Governo do Estado, apenas a fundação do Museu Artístico e Ecológico. Segundo a fonte, criar o parque “descaracteriza o verdadeiro sentido de tudo”.

De acordo com a fonte que pediu para se manter anônima, o governo tenta se defender nessa situação, mas existe uma escritura de doação e um testamento, e é esse o ponto principal que o MP-BA exige que seja cumprido.

A Secult foi questionada sobre o que foi feito com as obras entre 2009 e 2017 e, depois, entre 2017 e a outra abertura de processo de inventário em 2023. Entretanto, não houve resposta até o fechamento desta reportagem. Foi perguntado também quantas vezes as peças foram catalogadas e quantas vezes passaram por processos de restauração e manutenção.

O Ministério Público também foi procurado para responder sobre o andamento da ação, mas afirmou que só poderia responder no dia seguinte.

Casa demolida

Uma das reivindicações do MP é que o Estado indique as ações que serão realizadas na casa de Frans Kracjberg com a sua eventual restauração. O imóvel foi demolido em agosto de 2022, como parte de obras para construção do novo porto de Nova Viçosa. Na época, dois piers já haviam sido construídos para facilitar o acesso e o planejamento incluía um terceiro.

Ainda naquele mês, a prefeitura afirmou em nota que foi feito um levantamento junto ao cartório e o imóvel não estava registrado, tendo uma matrícula geral que pertence ao município. "Ainda que esse imóvel estivesse registrado em nome do artista plástico, este não consta da lista dos bens doados ao Estado da Bahia, no termo firmado em 2009", diz a nota.

O município disse ainda que havia discussões judiciais em andamento sobre a quem pertence o restante dos bens deixados por Krajcberg, que não estão na lista de espólio. "Desse modo, até que seja definido judicialmente, não pertencem ao Estado da Bahia os bens que não foram especificados no termo de doação". Já o governo diz que decisão judicial determina que tudo que Krajcberg deixou pertence ao Estado.

A Prefeitura de Nova Viçosa foi procurada para responder sobre o destino da casa, mas não respondeu até o fechamento da matéria.