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Maysa Polcri
Publicado em 11 de outubro de 2024 às 15:38
Após a decisão do Conselho Acadêmico de Ensino da Universidade Federal da Bahia (CAE/Ufba) de restringir o acesso de egressos do bacharelado interdisciplinar (BI) ao curso de Medicina, o diretor da Faculdade de Medicina da Bahia, Antonio Alberto da Silva Lopes, defendeu a medida. Segundo ele, o curso passa por uma situação "dramática" devido ao número elevado de estudantes que ingressam em Medicina através de decisões judiciais. A decisão do CAE, que ainda será discutida em instâncias superiores, prevê a suspensão de três anos.
Antonio Alberto Lopes avalia como positiva a restrição e defende que ela não afeta as políticas afirmativas da universidade. Internamente, docentes avaliam que a medida é um retrocesso, uma vez que o acesso ao curso de Medicina foi ampliado a partir do ingresso de estudantes formados no Bacharelado Interdisiplinar (BI). Após três anos de curso, os egressos do BI podem concorrer às 32 vagas na Faculdade de Medicina, em Salvador.
O Conselho Acadêmico e a Faculdade de Medicina alegam que processos judiciais de alunos não cotistas têm feito com que o número de matriculados no curso cresça significativamente. As decisões da Justiça entendem que, após a graduação do BI, os alunos cotistas teriam as mesmas condições dos estudantes de ampla concorrência. Por isso, a Ufba tem sido obrigada a matricular um número maior de alunos a cada semestre.
O Instituto de Humanidades, Artes e Ciências Professor Milton Santos (Ihac), unidade da Ufba responsável pela oferta dos cursos de BI, repudiou a decisão de suspender o ingresso de estudantes eu migram do BI, como foi noticiado pelo CORREIO. A unidade recorreu ao Conselho Universitário (Consuni), que deve debater o tema em uma reunião ainda neste mês. Questionada sobre a decisão, a Ufba disse apenas que o tema está sendo debatido entre os conselhos da universidade.
"Um grande problema que as vagas para o curso de Medicina via BI têm gerado é o número crescente de medidas judiciais, obrigando a UFBA a acolher um grande excesso de estudantes no curso de Medicina nos últimos quatro anos, sob pena de multa diária", avalia Antonio Lopes
"Esse aumento imprevisível no número de estudantes compromete diretamente a qualidade do ensino, afeta a alocação de recursos e gera uma sobrecarga insustentável nas nossas estruturas administrativas e nos campos de prática, prejudicando a saúde de alunos, professores e técnico-administrativos", completa o diretor da FMB.
O professor foi eleito para o cargo de diretor da Faculdade de Medicina em maio do ano passado. Ele é o primeiro homem negro a ocupar o cargo desde que a faculdade foi criada, há 216 anos. Antonio Lopes avalia que a suspensão não impacta as políticas afirmativas da universidade e se diz um defensor das cotas.
"A afirmação de que a retirada das vagas do curso de Medicina do projeto pedagógico do BI possa afetar as políticas afirmativas e a inclusão na universidade é incorreta e desprovida de fundamento. Vale ressaltar que, em ambas as formas de acesso, tanto pelo SISU quanto pelo processo seletivo interno via BI, 50% das vagas são destinadas às cotas, sendo 64 vagas pelo SISU e 16 pelo BI (Lei 14723/2023). Portanto, o compromisso com a inclusão e com as políticas afirmativas está garantido, com ou sem a alocação de vagas de Medicina para o processo seletivo interno para concluintes do BI", reforça o diretor.
Confira abaixo o posicionamento completo do diretor
Como Diretor da Faculdade de Medicina da Bahia (FMB) da Universidade Federal da Bahia (UFBA), considero necessário esclarecer os pontos levantados na nota publicada no Jornal Correio sobre a decisão do Conselho Acadêmico de Ensino (CAE) de suspender por três anos a oferta de vagas do curso de Medicina para a seleção interna que ocorre no programa de Bacharelado Interdisciplinar (BI), com vigência para os novos ingressantes neste curso a partir de 2025. Quero deixar claro que considero extremamente necessária esta suspensão considerando a situação dramática que se encontra a Faculdade de Medicina da Bahia.
Em primeiro lugar, a afirmação de que a retirada das vagas do curso de Medicina do projeto pedagógico do BI possa afetar as políticas afirmativas e a inclusão na universidade é incorreta e desprovida de fundamento. Vale ressaltar que, em ambas as formas de acesso — tanto pelo SISU quanto pelo processo seletivo interno via BI — 50% das vagas são destinadas às cotas, sendo 64 vagas pelo SISU e 16 pelo BI (Lei 14723/2023).
Portanto, o compromisso com a inclusão e com as políticas afirmativas está garantido, com ou sem a alocação de vagas de Medicina para o processo seletivo interno para concluintes do BI. Vale ressaltar também que os estudantes que se encontram no curso (ingressantes no BI até 2024) permanecem com o seu direito assegurado, dentro das normas da UFBA. Como diretor da Faculdade de Medicina e defensor incansável das políticas de ações afirmativas, reitero que a inclusão social e a democratização do acesso são pilares fundamentais da nossa instituição.
Gostaria que fosse observado, que um grande problema que as vagas para o curso de Medicina via BI têm gerado é o número crescente de medidas judiciais, obrigando a UFBA a acolher um grande excesso de estudantes no curso de Medicina nos últimos quatro anos, sob pena de multa diária.
Esse aumento imprevisível no número de estudantes compromete diretamente a qualidade do ensino, afeta a alocação de recursos e gera uma sobrecarga insustentável nas nossas estruturas administrativas e nos campos de prática, prejudicando a saúde de alunos, professores e técnico-administrativos que trabalham para prevenir comprometimento ao atendimento dos pacientes que necessitam de cuidados de saúde nos hospitais e ambulatório ligados à Faculdade de Medicina. Esses fatores levaram o CAE, de forma ponderada e com base em dados concretos, e de acordo com suas competências, responsabilidades e o estatuto vigente da UFBA, a aprovar a suspensão de vagas para futuros ingressantes no BI, sem prejuízo para os que ora se encontram no curso.
Lamento que a reportagem publicada no Jornal não tenha mencionado esses aspectos críticos que afetam diretamente a capacidade de a Faculdade de Medicina continuar oferecendo um ensino de excelência e cuidados à saúde da população. A decisão do Conselho Acadêmico de Ensino não foi tomada de forma arbitrária, mas sim com o objetivo de preservar a qualidade do ensino no curso de Medicina, ao mesmo tempo em que buscamos soluções para mitigar os efeitos das judicializações que desorganizam todo o processo de ingresso e distribuição de vagas.
Finalmente, reafirmo que a Faculdade de Medicina permanece aberta ao diálogo na busca de melhores condições de ensino. No entanto, é imprescindível que este debate seja baseado em fatos e na realidade que enfrentamos.