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Maysa Polcri
Publicado em 3 de dezembro de 2024 às 05:49
Mesmo com encaminhamento médico para realizar cesariana, Kevelli Barbosa, de 22 anos, foi orientada a ter parto normal na Maternidade Albert Sabin, em Salvador, na última sexta-feira (31). Depois de sete doses de medicação para dilatação vaginal, a gestante foi submetida a cirurgia para retirada do bebê, que não resistiu. A mãe morreu em seguida. O caso acende o alerta para uma prática comum nas maternidades de Salvador, onde as cesarianas são negadas e o parto normal acaba sendo induzido.
Apesar de o parto natural ser o mais indicado por médicos especialistas na maioria dos casos, algumas exceções podem levar os profissionais a recomendarem a cirurgia. “Quando o batimento cardíaco do bebê é alterado, nós entendemos que ele está entrando em sofrimento fetal e a indução deve ser interrompida. Qualquer circunstância que coloque a mãe ou o bebê em risco precisa ser avaliada”, explica Jaqueline Neves, ginecologista obstetra.
A indução pode levar, segundo a médica, até 36 horas, e a recomendação é que sejam administradas entre quatro e seis doses de medicamentos para dilatação. No caso de Kevelli, foram sete doses e 24 horas de espera até que a cesariana fosse feita, após os batimentos do bebê diminuírem. Os atestados de óbito vão determinar as causas das mortes.
Patrícia de Sena Teixeira, 33, conta que também teve o parto normal induzido, mesmo com a indicação médica para a cesariana, em julho de 2020. “A própria médica da maternidade [Albert Sabin] indicou que deveria ser cesariana, mas os plantonistas não quiseram fazer. Eles só deixam a gestante passar pela cirurgia quando não tem mais jeito”, denuncia.
Patrícia de Sena só foi levada à sala cirúrgica quando os batimentos cardíacos da bebê diminuíram, assim como aconteceu com Kevelli. A pequena Laura Sofia precisou ser reanimada após o parto, mas se recuperou bem.
Segundo ex-funcionários da Maternidade Albert Sabin, que conversaram com a reportagem sob condição de anonimato, a equipe médica tem preferência pelos partos naturais. Isso acontece, segundo eles, por conta do fluxo intenso de pacientes e falta de profissionais. O parto normal também oferece, na maioria dos casos, menos risco para as mães e bebês.
“Como a cesárea é uma cirurgia, precisa de uma sala cirúrgica específica e uma equipe disponível por, ao menos, uma hora para realizar o procedimento. Enquanto que o parto normal pode ser feito por enfermeiros obstétricos”, explica. Com a demanda intensa de pacientes, as cirurgias atrasam o atendimento de outras gestantes.
“É somente uma maternidade para atender toda a região de Cajazeiras e adjacências. Essa população cresceu muito, e precisaria de outras maternidades para desafogar o fluxo, que é muito grande. Quando a gestante entra em uma lista de prioridades de parto cesariana é complicado porque são muitas gestantes de risco que passam na frente”, conta uma médica que trabalhou no local.
A Maternidade Albert Sabin, localizada na Estrada do Coqueiro Grande, em Cajazeiras, é uma das seis localizadas em Salvador. Além dela, formam a lista: Instituto de Perinatologia da Bahia (Iperba), Hospital Geral Roberto Santos, José Maria de Magalhães Netto, Maria da Conceição de Jesus e Tsylla Balbino.
A primeira maternidade municipal de Salvador está sendo construída, na Federação, pela prefeitura. Serão 200 leitos, entre clínicos e Unidade de Terapia Intensiva (UTI). A Secretaria de Saúde do Estado (Sesab) foi questionada sobre se há relação entre as técnicas de parto induzido nas unidades e a sobrecarga do sistema, mas não houve retorno até esta publicação.
A ginecologista obstetra Jaqueline Neves analisa que cada parto possui características específicas, e que o desejo das gestantes devem ser respeitados.
“As pessoas costumam achar que o parto cesariana salva vidas e, na verdade, pode ser o contrário. As pacientes, quando vão para uma cirurgia, precisam saber dos riscos e benefícios”, avalia. Entre as complicações possíveis do parto normal, estão: embolia pulmonar, perda de sangue, infecções, trombose e lesões nos órgãos.