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Disputa entre CV e BDM tem afastado pessoas que precisam do serviço
Wendel de Novais
Publicado em 30 de outubro de 2024 às 06:30
O restaurante popular de São Cristóvão, que tem a circulação afetada pela tensão de uma disputa entre facções criminosas, é mais um ambiente impactado pela ‘geografia do tráfico’ em Salvador, que é a forma como as organizações criminosas se organizam e estão dispostas em territórios. Assim como um trecho de 230 metros na Rua Mello Moraes Filho, em Fazenda Grande do Retiro, o estabelecimento está no meio de um conflito armado entre as facções Comando Vermelho (CV) e Bonde do Maluco (BDM).
Apesar do restaurante estar situado na Avenida Aliomar Baleeiro, o local fica a cerca de 400 metros da entrada da Vila Verde, que tem a presença do CV. Indo na direção contrária, o estabelecimento fica a cerca de 500 metros de Colinas de Mussurunga, área do BDM. A localização coloca o restaurante no meio de uma rota usada por traficantes para confrontos com os rivais que chegam a acontecer durante a manhã, como lembra um morador em ocorrência registrada há duas semanas.
"Já teve dois tiroteios, sendo que o último aconteceu há 15 dias. [...] Aqui você corre risco, precisa fugir de uma bala de graça [perdida] aqui. Eu mesmo, no dia que o bicho pegou, tive que me deitar. A 'bala comeu', parou e depois começou de novo. Quando o povo abriu [a porta do restaurante], eu entrei aí e levou um tempão até a coisa se acalmar", relata ele, sem se identificar, garantindo que o registro se deu às 9h.
Uma outra moradora, que tem medo de revelar o nome, detalha o medo mútuo por todos na região. “Quem é de Vila Verde tem medo de rodar pelo lado das Colinas. Quem é das Colinas também não tem muita coragem de ir para o lado da Vila Verde. A gente, que mora no meio da coisa, fica com medo porque, quando eles trocam tiro, muitas vezes é nesse encontro aqui da avenida”, fala.
Procurado, o Instituto Fogo Cruzado, que monitora a violência armada em Salvador e Região Metropolitana (RMS), confirmou registros na área. De acordo com a instituição, na localidade de Vila Verde, em 2024, já foram registrados sete tiroteios, cinco mortes e dois feridos. Em Colinas de Mussurunga, foram registrados dois tiroteios, duas mortes e nenhum ferido. Os moradores, entretanto, admitem que, por conta do conflito das facções, diariamente há temor que novos confrontos aconteçam.
O problema já foi citado, inclusive, pelo prefeito Bruno Reis, quando o gestor lamentou o impacto do crime no serviço da Secretaria Municipal de Promoção Social, Combate à Pobreza, Esportes e Lazer (Sempre) em coletiva de imprensa.
"Vocês sabiam que o tráfico impede as pessoas de se alimentarem no Restaurante Popular de São Cristóvão? Que as pessoas não podem sair de uma área para se alimentar onde está o restaurante? Vocês acreditam nisso? Eu soube disso ontem pelo meu secretário de promoção social. Nós oferecemos 300 refeições diárias e não está tendo gente para comer porque as pessoas não conseguem sair de uma área para outra porque o tráfico não permite", apontou Reis.
Procurada para falar sobre a situação, a Secretaria Municipal de Promoção Social, Combate à Pobreza, Esportes e Lazer (Sempre) informou que, “mesmo com a ocorrência de situações de insegurança no território, cuja responsabilidade de apuração e atuação para manter o direito de ir e vir da população seja do governo do estado, a gestão municipal continua a manter a oferta da alimentação diariamente”. A pasta disse ainda que, de julho até hoje, já foram fornecidas 25.648 refeições no equipamento de São Cristóvão, custeadas totalmente pelo município, beneficiando cerca de 400 pessoas por dia.
A Secretaria de Segurança Pública da Bahia (SSP) também foi procurada para responder se tem um plano de combate ao conflito, mas não respondeu até o fechamento desta reportagem.