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‘Ela precisa estudar sobre o país em que vive’, responde Djamila a ataque de mãe de aluno do Vieira

Mãe de estudante criticou o Colégio Antônio Vieira, em Salvador, por usar o livro Pequeno Manual Antirracista

  • Foto do(a) author(a) Gil Santos
  • Gil Santos

Publicado em 1 de maio de 2024 às 17:35

Djamila é considerada uma referência em questões raciais Crédito: Danilo Oliveira/Ascom UNEB

A filósofa, escritora, feminista e professora universitária Djamila Ribeiro, 43 anos, respondeu aos ataques que a mãe de um estudante do Colégio Antônio Vieira, no Garcia, fez nas redes sociais. A mulher criticou a escola por usar a obra Pequeno Manual Antirracista nas aulas de religião. Estudantes contaram que as aulas falam de amor, aceitação e compaixão e que o combate ao racismo, que é crime, é tratado através do livro como um exemplo de como ser um bom cristão.

O Pequeno Manual Antirracista é uma das obras mais conhecidas de Djamila Ribeiro. Em cerca de dez capítulos curtos a autora discute sobre racismo, negritude, branquitude, violência racial e cultura. Ela aponta as origens do problema, as diferentes formas de manifestação e como enfrentá-lo. Em 2020, o livro foi vencedor do Prêmio Jabuti na categoria Ciências Humanas, e é considerado uma referência nos estudos raciais.

Djamila está de férias nas Bahamas, mas respondeu ao CORREIO. Confira na íntegra o posicionamento da autora:

Ao longo dos últimos cinco anos, desde que foi lançado, o livro tem contribuído para a pedagogia de conscientização sobre desigualdades históricas no Brasil. Tem sido base da bibliografia de escolas públicas e particulares, de diversas orientações. Um livro que vem contribuindo para uma prática pedagógica antirracista.

Fiquei muito feliz por saber que o Colégio em questão adotou o livro com o argumento de que o combate ao racismo é um valor cristão. E é de fato, Jesus pregou o amor ao próximo. Não sou cristã, porém me encanta a perspectiva da escola. Aliás, sobre isso, a mãe me ataca por eu ser de candomblé, iniciada aos 8 anos de idade. Gostaria de reforçar que o direito à liberdade religiosa é garantido pela Constituição de 1988 e por vivermos em um país laico, independente da escola ser católica, ataques como esse fere a nossa Constituição e limita a humanidade de quem ataca.

Essa mãe precisa estudar sobre o contexto social e racial do país em que vive, sobretudo porque reside em Salvador, um estado com o maior número de população negra, e também estudar sobre as leis que regem a Nação.

No mais, minha solidariedade à comunidade escolar e o endosso ao seu posicionamento cristão em adotar o livro.

Resposta do Colégio

Essa foi a segunda vez que o Colégio Antônio Vieira foi atacado por conta da bibliografia. Em 2019, mesmo ano do lançamento de Pequeno Manual Antirracista, um publicitário criticou a escola por usar a obra Na Minha Pele, de Lázaro Ramos. Na época, estudantes e ex-alunos defenderam a escola e lembraram que o padre Antônio Vieira, que dá nome ao colégio, lutou ferrenhamente contra a escravidão de povos e as discriminações. 

Em nota, o Colégio Antônio Vieira respondeu aos ataques a obra de Djamila. Confira o posicionamento na íntegra:

O Colégio Antônio Vieira, embasado na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, reconhece a importância de garantir o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil. Nesse sentido, adotamos uma abordagem inclusiva que visa tranversalizar toda a nossa prática educativa.

Destacamos a existência do Comitê para Educação Étnico-Racial e de Gênero no Colégio Antônio Vieira, que desempenha um papel fundamental na orientação de ações voltadas para essa temática. As questões antirracistas são trabalhadas em consonância com nosso Projeto Político-Pedagógico, seguindo os fundamentos da Companhia de Jesus e as diretrizes da Igreja Católica, inclusive o Pacto Educativo Global.

Para nós, a educação para as relações étnico-raciais é um imperativo de reconciliação e justiça. Por isso, incluímos livros e materiais didáticos que abordam essa temática de forma ampla e contextualizada em nossas aulas de Ensino Religioso. Essa abordagem não se limita apenas às disciplinas religiosas, mas permeia todo o contexto escolar, refletindo nosso compromisso com a conscientização sobre a importância de respeitar a diversidade.

Reconhecemos a importância da legislação vigente, como a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, a Lei nº 10.639/2003, bem como a Lei 7.716/89 e a Lei 14.532, que fundamentam o racismo como crime e a necessidade de assegurar a efetivação das diretrizes estabelecidas. Nos empenhamos também a cumprir a nota recomendatória da Defensoria Pública da Bahia que ressalta a importante e necessária tomada de medidas para reconhecer e valorizar a história e cultura afro, afro-brasileira e indígena como pilares da formação cultural-identitária do povo brasileiro. Nosso empenho em implementar essas leis é amplo e eficaz, pois nossa missão vai além do ensino acadêmico; buscamos formar cidadãos comprometidos com a construção de um mundo mais inclusivo e solidário.

A mulher apagou a postagem após a repercussão. Procurada, ela ainda não se manifestou.