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Elaine Sanoli
Publicado em 20 de dezembro de 2024 às 05:20
Após repercussão da série de matérias publicadas pelo CORREIO sobre uma denúncia de manipulação em resultados de provas práticas do Departamento Estadual de Trânsito (Detran), novas acusações surgiram. Em entrevista e comentários nas redes sociais, condutores relataram ter passado por situações similares às relatadas nas reportagens, além do pagamento irregular para obter a licença para dirigir.
Os relatos narram acontecimentos ao longo de anos, que sugerem que as acusações não são recentes. São histórias como a da analista de faturamento fiscal soteropolitana, que não quis ser identificada. Ao CORREIO, ela contou que precisou passar pelo exame prático três vezes. "Na segunda vez, eles disseram que eu não tinha dado passagem ao pedestre, e não tinha pedestre nenhum nas faixas em que eu passei no roteiro de rua. E também [disseram] que eu não tinha solicitado para que um instrutor colocasse o cinto de segurança, e eu solicite, sim", relembrou.
Segundo a profissional, ela só foi aprovada após ameaçar acionar a instituição na justiça caso fosse reprovada sem uma justificativa concreta. "Quando o instrutor entrou, eu pedi para colocar o cinto de segurança e fui o roteiro todo falando com ele que eu estava de viagem marcada, com passagem comprada, que eu precisava tirar minha habilitação, mas que o Detran atrasa muito o processo. Não tem câmera dentro dos carros, ainda mais em 2008, a tecnologia não estava tão avançada, o relato que eles dão quando a gente é reprovado é muito torpe", disse.
Apesar de não ter recebido pedido de suborno para a aprovação, a jovem contou que conhece outras pessoas que passaram pela situação. "Com meu primo já pediram dinheiro já, a gente comentou uma vez há dez anos atrás", afirmou.
Outra situação foi denunciada pelo profissional da área de tecnologia da informação, de 29 anos, que não quis se identificar, pois ainda está em processo para adquirir a sua Carteira Nacional de Habilitação (CNH). O jovem contou que realizou a prova de carro em duas ocasiões e nas duas, o homem conhecido como "Sargento", além de ser grosseiro teria provocado a sua reprovação de forma arbitrária. Ele relatou ter realizado a primeira etapa, a baliza, e, por falta de sinalização parou o carro e retirou o cinto. "Ele me pediu para chegar o carro um pouco mais pra frente, com isso coloquei o cinto novamente e coloquei o carro só um pouquinho mais para frente, e ele falou que estava bom. Depois disse que iria colocar uma falta grave para mim, mas deixaria eu fazer o exame de rua. Fiz o exame de rua depois, com outro examinador, e nessa hora já estava bem nervoso, e tive uma infração média também, que somada a outra, me reprovou", contou.
O examinador conhecido como "Sargento Gilson", citado nas reportagens do CORREIO, foi afastado temporariamente, após denúncias sobre as provas realizadas na última terça-feira (17). O órgão informou que iniciou uma apuração sobre o caso e que o servidor acusado de inventar infrações dos alunos ficará afastado das funções até o esclarecimento dos fatos.
Outros internautas contaram suas experiências similares nos comentários da publicação. "Passei pela mesma coisa com uma avaliadora, o carro estava correto, ela só disse que não estava, todos que estavam em volta, junto ao instrutor da auto escola questionaram e ela só disse que não estava e saiu. Abri ouvidoria e não adiantou nada", relatou um deles.
Apesar dos casos relatados em Salvador, condutores apontam que as práticas são comuns em diferentes cidades. Em Camaçari, na Região Metropolitana de Salvador (RMS), por exemplo, uma estudante, de 22 anos, que também não será identificada, revela ter aceitado a oferta no valor de R$ 1 mil para adquirir a sua CNH nas categorias A e B. "Eu encontrei com ele [responsável pela aprovação], que me deu os documentos para me assinar, a lista de presença e no dia seguinte já estava o meu nome no sistema como aprovada, sem eu nem ter ido fazer a prova", contou. "Eu tomei a decisão de pagar, porque eu tinha perdido na de moto e eu já pilotava moto há mais de dois anos, eu já tinha experiência, eu fiquei desesperada", justificou.
O CORREIO solicitou dados ao Ministério Público da Bahia (MP-BA) sobre o número de denúncias contra manipulação em resultados de provas práticas do Detran, em Salvador, ao menos, nos últimos 10 anos, mas não houve retorno até a publicação desta matéria.