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Maysa Polcri
Publicado em 11 de março de 2024 às 08:42
Clientes da SulAmérica há mais de 30 anos estão recorrendo à Justiça baiana para evitar a exclusão como dependentes do convênio médico. Desde o ano passado, titulares do plano de saúde têm recebido notificações que exigem a comprovação de dependência financeira. O problema é que não há determinação desse tipo expressa nos contratos firmados na década de 90, por isso, as decisões do Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA) têm sido favoráveis aos usuários do plano.
Advogados que representam usuários do convênio contam que as notificações começaram a ser enviadas no ano passado, depois que a SulAmérica Seguros foi comprada pela Rede D’Or. A estratégia utilizada pelo plano, segundo os especialistas, é excluir os dependentes e forçá-los a contratar outras modalidades de convênio mais caras.
A Rede D’Or e a SulAmérica foram procuradas, através de suas respectivas assessorias de imprensa, mas não se posicionaram sobre o assunto até a finalização desta reportagem. A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), vinculada ao Ministério da Saúde e que regula o mercado de planos privados de saúde, também foi questionada sobre o procedimento da SulAmérica, mas não se manifestou.
Cora Maria Brender de Santana, 68, foi uma das clientes do plano surpreendida com o comunicado enviado pela SulAmérica em outubro do ano passado. No documento, ao qual a reportagem teve acesso, a empresa afirma que “é necessário que seja comprovada a dependência financeira dos beneficiários vinculados ao seu plano de saúde para garantir a cobertura assistencial dele”.
Caso o vínculo não seja comprovado através da declaração de Imposto de Renda, a empresa afirma que os dependentes perderão a assistência do plano em 90 dias. Em mais de duas décadas de contrato, essa foi a primeira vez que Cora foi informada sobre a necessidade de comprovação da dependência financeira dos filhos, que têm 24 e 28 anos.
“No nosso entendimento, o plano manteve essas pessoas até quando era conveniente para eles e, a partir do momento em que eles começaram a dar ‘prejuízo’, se tornou interessante, para a empresa, excluí-los”, analisa o advogado Michel Torres, que representa cerca de 20 clientes com o mesmo problema. A situação tem gerado angústia entre os segurados, muitos dos quais incluíram seus filhos como dependentes desde o nascimento, como é o caso de Cora Maria.
Em fevereiro deste ano, a juíza Fabiana Cerqueira Ataide, da 10º Vara do Sistema dos Juizados Especiais do Consumidor de Salvador, proferiu uma decisão favorável a outra cliente da SulAmérica. A juíza considerou o cancelamento “ilegítimo” ao levar em consideração que o titular do plano incluiu dependentes “sem qualquer condicionante”.
A reportagem perguntou ao TJ-BA quantas ações foram movidas contra a SulAmérica por causa da tentativa de exclusão de dependentes entre 2023 e este ano, mas não houve retorno até então.
“Na prática, a SulAmérica passou a exigir que pessoas entre 30 e 50 anos, em média, comprovassem que são dependentes no Imposto de Renda dos pais. Um dos argumentos para que isso não possa ocorrer é que os contratos foram firmados entre 1989 e 1991 e até agora nunca tinha sido feito nada no sentido de exclusão”, explica André Mendonça, advogado especializado em Direito à Saúde.
Somente no escritório em que André Mendonça atua, em Salvador, mais de 50 pessoas entraram na Justiça para evitar a exclusão de dependentes. A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) determina que para ser dependente de plano de saúde é preciso ter algum dos seguintes vínculos do titular: até o terceiro grau de parentesco consanguíneo, até o segundo grau de parentesco por afinidade, cônjuge ou companheiro.
A estratégia para tentar expulsar dependentes de planos de saúde firmados na década de 90 não é exclusividade da SulAmérica, segundo especialistas, e é mais um elemento da crise das operadoras de saúde. No ano passado, um levantamento da Associação Nacional de Hospitais Privados (Anahp) apontou que os convênios devem cerca de R$2,3 bilhões para 48 hospitais do país.
“A SulAmérica chamou muita atenção porque notificou milhares de pessoas ao mesmo tempo, mas todas as operadoras mais antigas repetem o movimento [...] Se eles excluem os dependentes, os planos acabam muito mais rápido, já que os titulares são, via de regra, pessoas entre 50 e 70 anos”, pontua o advogado André Mendonça.