Receba por email.
Cadastre-se e receba grátis as principais notícias do Correio.
Da Redação
Publicado em 5 de setembro de 2024 às 15:13
Lorena Pinheiro, otorrinolaringologista que disputa uma vaga como professora da Faculdade de Medicina da Universidade Federal da Bahia (Fameb/Ufba), se posicionou após a decisão da Juíza da 1ª Vara Federal da Seção Judiciária da Bahia em manter a liminar que determinou a posse do cargo pela professora Carolina Cincurá. Em nota, a médica afirma já esperar a decisão tomada, mas questiona a visão do concurso sobre a Lei de Cotas.
Em seu posicionamento, Lorena comenta sobre o apoio recebido, registrado inclusive em um manifesto assinado por docentes da Ufba em apoio a ela. “Ainda estou muito abalada com tudo, mas me sentindo fortalecida com toda rede de apoio que venho recebendo de Movimentos Sociais, Movimento Negro, colegas médicos, pacientes, associações docentes e sociedade em geral. Essa luta não é minha individualmente. É uma luta coletiva que visa evitar retrocessos e ataques a uma Política Pública tão importante”, disse ela.
A médica, que conta ter pontuado 9,5 e ficado na primeira posição na prova escrita, única etapa às cegas do concurso, questionou a visão do programa sobre a Lei de Cotas. Para ela, o trecho da decisão judicial que afirma que concursos públicos de magistério superior escolhem candidatos com melhor preparo e inteligência trata a lei como um erro.
“Por mais que um concurso tenha por essência escolher os mais preparados, a afirmação desconsidera a Política de Ações Afirmativas e todo seu propósito de reparação histórica. Faz-nos parecer, dessa forma, que a Lei de Cotas é um equívoco, que premia os menos capacitados, logo os menos inteligentes”, avaliou.
Lorena vê a política de cotas como um instrumento para garantir oportunidades para homens e mulheres negras, ocupando espaços historicamente negados. “É uma luta também contra preconceitos”, finalizou.
Após o posicionamento de Lorena, o Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (Andes) saiu em defesa da professora e da Lei de Cotas. No pronunciamento, o sindicato repudiou a ação judicial, e se disponibilizou para apoiar toda medida necessária para reverter a situação.
O Andes afirmou ser defensor de projetos de educação antirracista e políticas de ações afirmativas. “A defesa das cotas raciais representa a luta por reparação dos mais de 300 anos da escravização do povo negro e das políticas genocidas de segurança pública que vem matando nossa juventude negra e periférica no país”, avaliou.
Para o sindicato, as cotas na Ufba, aplicadas desde dezembro de 2018, são uma conquista do movimento negro frente às desigualdade raciais na sociedade que interrompe a fragmentação dos concursos, permitindo a mudança do perfil racial do corpo docente. “A não nomeação da professora Lorena Pinheiro Figueiredo é um ataque à legislação brasileira, a qual prevê cotas raciais e políticas de reparação e ações afirmativas. É um desrespeito aos movimentos sociais! É um ato de racismo!”, afirma.
Encerrando a nota, o Andes convoca a categoria docente e a sociedade a defender a posse imediata de Lorena. “Defendemos de forma intransigente nossa conquista histórica! Defendemos a legislação fruto das políticas de reparação e ações afirmativas! Pela nomeação e posse imediata da professora Lorena Pinheiro Figueiredo! Racistas não passarão!”, finaliza.
A doutora Lorena Pinheiro participou do concurso para ser professora da Faculdade de Medicina da UFBA por meio da reserva de cotas. Na ocasião, foi aprovada em quarto lugar geral, mas na primeira posição entre candidatos cotistas. Com isso, a Lei de Cotas daria preferência à médica para ocupar a única vaga disponível.
Apesar disso, a primeira colocada na ampla concorrência, Carolina Cincurá, contestou o resultado, e teve a Justiça a seu favor. "Em virtude de a Ufba ter oferecido apenas 01 (uma) vaga para o cargo de professor de médico otorrinolaringologista, a aplicação dos percentuais de 20% e de 5% de reserva para negros e deficientes não pode suprimir a primeira classificação de livre concorrência", justificou a Vara Federal.
Carolina assumiu a vaga, e a UFBA afirmou ter feito uma seleção com lisura e dentro das regras. "Pelo exposto, concluímos que não houve qualquer irregularidade por parte desta UFBA quanto aos trâmites relacionados ao concurso oferecido pela Faculdade de Medicina da Bahia", disse a Universidade.
A posição da instituição faz frente ao Diário Oficial da União, que apontou o número de vagas disponíveis com atuação do Sistema de Cotas. "Vagas: 1, sendo esta preferencialmente ocupada por candidato autodeclarado negro, conforme Lei nº 12.990/2014 e Edital nº 01/2023".
Lorena seria a primeira professora cotista da Fameb, caso assumisse o cargo. Para ela, o feito histórico foi impedido pelos ideais da sociedade. "É raro a presença de doutores negros. É raro a presença de professores médicos negros. As cotas mudaram a cara da universidade. Quando a gente traz esse panorama, da primeira cotista negra virar docente, a gente vê que tem uma estrutura social que impede a gente", comentou.