Botulismo matou duas pessoas na Bahia neste ano; saiba o que é a doença e como prevenir

Estado registra surto de casos, com seis notificações

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  • Larissa Almeida

Publicado em 25 de setembro de 2024 às 14:05

Mortadela de frango Crédito: Shutterstock

A Bahia registrou duas mortes por botulismo em 2024, de acordo com informações da Secretaria de Saúde do Estado (Sesab). A doença, que é rara, possui alta letalidade e não é contagiosa, é causada por uma toxina produzida pela bactéria Clostridium botulinum, que se desenvolve em locais sem oxigenação. Segundo a pasta, até setembro deste ano foram notificados seis casos da enfermidade – dois a mais do que em 2023. A quantidade já é suficiente para a classificação de surto, já que houve aumento repentino de notificações. A prova disso é que, no estado, de 2014 a 2023, foram registrados apenas 16 casos suspeitos.

Entre as seis notificações, três são relativas a pacientes que seguem internados no Instituto Couto Maia (ICOM), em Salvador. A Sesab comunicou que a investigação epidemiológica constatou que quatro dos cinco pacientes com diagnóstico de botulismo confirmado ingeriram mortadela de frango no dia anterior ao início dos sintomas.

Segundo a infectologista Giovanna Orrico, que atua no ICOM, a forma mais fácil de contaminação por botulismo é através da alimentação, mas há três outras maneiras de adquirir a doença. “A presença da toxina no alimento, seja na preparação, armazenamento ou distribuição, é a forma mais comum de contaminação, mas existe também a forma acidental-traumática, que acontece através de lesão no corpo. No caso, a pessoa tem uma lesão e pode ter contato com a toxina”, descreve.

“Existe também o botulismo infantil, quando crianças se contaminam com o mel de abelha. Elas geralmente ingerem a bactéria e só depois, no trato intestinal, se dá a formação da toxina. Na literatura, ainda há casos de botulismo após injeção de toxina botulínica [botox], mas que acontece só com doses elevadas da toxina ou em caso de problema em um lote”, acrescenta a infectologista.

Considerada uma bactéria ambiental, a Clostridium botulinum produz esporos, que são formas dormentes da bactéria. A partir do contato com um ambiente propício, o fator que a mantinha dormente passa a ficar ativo e produzir toxina. É daí que, guardadas as proporções, a infectologista Clarissa Cerqueira, ao detalhar o efeito da toxina no corpo humano, traça o paralelo com uma hipotética ingestão de botox.

“A toxina botulínica é a que usamos para paralisar a musculatura. Só que essa toxina é tão potente que o corpo absorve e ela vai para as terminações nervosas, e de cima para baixo, vai causando paralisia”, pontua.

Os sinais da doença seguem um padrão: começam da cabeça para o resto do corpo. Em primeiro lugar, os olhos podem ser afetados, causando visão turva ou dupla, assim como queda da pálpebra. Depois, podem surgir sintomas como dificuldade para engolir, boca seca e paralisia da musculatura respiratória, acometendo o pescoço e pulmão.

Alto risco de morte

A paralisia dos músculos respiratórios é justamente o maior fator de gravidade do botulismo, uma vez que o paciente não consegue respirar. “A pessoa está plenamente consciente, alerta, sabendo de tudo e simplesmente não consegue se mexer. É por isso que é uma doença muito grave. O tratamento é de suporte. Uma vez que essa toxina, ela se liga às terminações nervosas, ela não sai com facilidade. Então, a gente tem que, da forma mais breve possível, dar a antitoxina para poder grudar as toxinas que ainda não se ligaram na terminação nervosa”, ressalta Clarissa Cerqueira.

Segundo a infectologista Giovanna Orrico, não existe um tratamento efetivo e o risco de morte é muito alto porque não há como inativar a toxina quando ela chega na placa neuromuscular. “É um defeito do neurônio. Então, quando a toxina se liga, ela inativa a passagem da corrente elétrica e impede a passagem do estímulo nervoso. Por isso, o tratamento tem que ser tudo muito rápido”, pontua.

Se não houver celeridade no diagnóstico e tratamento, e mesmo assim o paciente sobreviver, há risco iminente de sequelas, como a paralisia flácida, isto é, a falta de contração de músculos do rosto e até mesmo a paralisação de membros.

Diagnóstico e prevenção

Como o botulismo tem apresentação clínica bem definida, o diagnóstico é passível de ser presumido. Para saber se tem ou não a condição, o paciente pode ser submetido a testes que identificam a toxina. Nesse caso, são testes feitos por amostras clínicas, como exame de sangue, fezes, análise de feridas ou lavagem gástrica.

Entre os cuidados preventivos, está a recomendação de evitar o consumo de enlatados estufados ou com aspecto de velho, não consumir alimentos com visual diferente do comum e evitar comprar alimentos em mercados clandestinos. A infectologista Giovanna Orrico também orienta a população quanto aos cuidados necessários especiais com os embutidos.

“Às vezes, esses embutidos têm um risco maior, porque acontece de a contaminação não ocorrer na conservação, mas na produção. Então, ao consumir, o ideal é ferver o alimento por dez minutos, acima de 80 °C. Nessas condições, já elimina a toxina”, garante.

Tratamento

Atualmente, o tratamento para o botulismo é feito com base no soro anti-botulínico e na identificação precoce da condição. “Essa é uma maneira de inativar as toxinas, mas não tem 100% de eficácia. Às vezes, o paciente faz de tudo, mas tem sequelas, porque se trata de uma carga de toxinas muito elevada”, avisa Giovanna Orrico.

Nos casos mais graves, o tratamento do botulismo é sobretudo de suporte. Portanto, uma assistência médica de qualidade é muito importante para auxiliar nos casos em que a paralisia muscular afeta a musculatura respiratória. “Se tiver com insuficiência respiratória, nós ventilamos o paciente e faz a aplicação de antitoxina”, finaliza a infectologista Clarissa Cerqueira.