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Bahia tem um caso de intolerância religiosa a cada dois dias

Denúncias podem ser feitas através do Disque 100, do Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania

  • Foto do(a) author(a) Maysa Polcri
  • Maysa Polcri

Publicado em 15 de julho de 2024 às 06:00

Protesto realizado em shopping após caso de intolerância religiosa em Salvador
Protesto realizado em shopping após caso de intolerância religiosa em Salvador Crédito: Reprodução/Redes sociais

No metrô, dentro do shopping e até no ambiente de trabalho. Os episódios de intolerância religiosa não têm dia nem horário para acontecer e deixam marcas profundas nas vítimas de preconceito. A Bahia, estado que tem a maior proporção de pessoas autodeclaradas pretas no país, registra uma denúncia de intolerância religiosa a cada dois dias.

Foram 90 denúncias de violação contra liberdade religiosa e de crença registradas no estado no primeiro semestre deste ano. Ou seja, 15 por mês, em média. As informações estão no Painel de Dados da Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos, do Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania (MDHC). No mesmo período, a Bahia registrou 145 violações pelo mesmo motivo. A diferença se dá porque uma única denúncia pode conter mais de um tipo de violação.

Em maio deste ano, Mãe Iara de Oxum, 57, denunciou ter sido vítima de intolerância religiosa em um salão de beleza, dentro de um shopping em São Cristóvão, em Salvador. Ela, que é idealizadora da Caminhada da Pedra de Xangô, disse que uma funcionária do estabelecimento se recusou a atendê-la porque a vítima usava roupas brancas e é do candomblé.

“[...] ela disse que: ‘eu que não atendo esse povo’. Por que eu estou de branco? Sexta-feira? E eu não vou me calar. Intolerância religiosa nunca mais”, falou Mãe Iara de Oxum, em um vídeo publicado logo após o ocorrido. A advogada Maíra Vida, presidente da Comissão de Combate à Intolerância Religiosa da Ordem dos Advogados do Brasil na Bahia (OAB-BA), explica no que consiste o crime. 

"Intolerância religiosa é qualquer conduta dirigida a limitar ou impedir o pleno gozo da liberdade religiosa, que é um direito fundamental. O Código Penal, no art. 140, prevê reclusão, de um a três anos, e multa para quem ofender a honra de alguém por motivo de religião. É a chamada injúria preconceituosa por motivo de religião", explica a advogada. 

Maíra Vida reforça que praticantes de qualquer religião podem ser vítimas do crime. "As práticas de intolerância religiosa podem se dirigir a qualquer grupo religioso e afrontam a filosofia religiosa que fundamenta a convicção do segmento", completa. As vítimas mais recorrentes, no entanto, são pessoas negras. 

Das 90 denúncias registradas neste ano na Bahia, 64 tiveram pessoas negras como vítimas - o que corresponde a 71% das ocorrências. O painel de dados, que reúne denúncias feitas através do Disque 100, revela que os 40 pessoas pardas e 24 pretas foram vítimas de intolerância religiosa no estado. Foram 20 brancas e uma indígena. O estado tem a maior proporção de pessoas pretas no país. Segundo o Censo 2022, 22,4% da população se autodeclara dessa forma. 

Quando praticado contra pessoas adeptas às religiões de matriz africana, a intolerância pode ser caracterizada como racismo religioso, como explica a presidente da Comissão de Combate à Intolerância Religiosa da OAB-BA. " No art. 20 da Lei federal n. 7716/89, o racismo religioso é punido com reclusão de um a três anos e multa, sendo a diferença fundamental, na atualidade, se tratar de crime imprescritível e inafiançável", diz Maíra Vida. 

Para Leonel Monteiro, presidente da Associação Brasileira de Preservação da Cultura Afro Ameríndia (AFA), o preconceito afeta pessoas de diferentes etnias, mas o racismo estrutural intensifica os ataques contra negros e pardos, principalmente. 

“A intolerância religiosa atinge a todos, independente de raça e nível social. Porém, nós vivemos em uma sociedade em que o racismo é muito brutal e existem um grande número de casos acontecendo em todo o Brasil e na Bahia”, diz. Leonel Monteiro analisa que as redes sociais amplificam as denúncias, como aconteceu com Mãe Iara de Oxum, mas também favorecem falas criminosas.

“Parece que as redes sociais são uma terra sem lei, onde o ódio religioso é potencializado de uma forma ruim. Em poucos segundos, uma postagem tem milhares de acessos e contribui para a disseminação de mentiras”, completa.

Em maio, a influenciadora Michele Dias Abreu foi denunciada pelo Ministério Público de Minas Gerais (MP/MG) por intolerância religiosa. Ela justificou que as enchentes no Rio Grande do Sul aconteceram pelo estado ser “um dos com maior número de terreiros de macumba”. Foram registradas 182 mortes no estado gaúcho em decorrência da tragédia. As falas viralizaram nas redes sociais.

Salvador

Entre as cidades da Bahia, Salvador é o município com mais denúncias desse tipo. Foram 44 casos entre janeiro e junho deste ano - quase metade dos 90 registros no estado. Em janeiro, uma mulher denunciou um caso de intolerância religiosa que teria ocorrido na estação Pituaçu do metrô de Salvador. Ela relatou que foi constrangida por um homem porque utilizava um colar de contas, símbolo do candomblé.

"Não podemos mais conviver o ódio religioso, que é um mal persistente na nossa sociedade", diz Eurico Alcântara, coordenador de Ações Transversais da Secretaria Municipal da Reparação (Semur), de Salvador. Para coibir o crime, a pasta realiza uma série de ações. "A prefeitura juntou-se com todas as secretarias para tratar de um programa de combate ao racismo institucional. Lançamos ainda o programa Casa Odara, que prevê a regularização fundiária dos terreiros da capital", ressalta. 

Neste ano, em Salvador, o Centro de Referência de Combate ao Racismo e à Intolerância Religiosa Nelson Mandela (CRNM) recebeu 70 denúncias - 10 a mais do que no mesmo período do ano passado. 

Dos registros deste ano, 46 foram casos de racismo, 18 de intolerância religiosa e seis ocorrências correlatas. O órgão é vinculado à Secretaria de Promoção da Igualdade Racial e dos Povos e Comunidades Tradicionais (Sepromi). Ângela Guimarães, titular da pasta, chama atenção para uma possível subnotificação dos casos.

“Ainda falta conhecimento sobre os direitos e os canais de denúncia disponíveis. A naturalização do racismo e da intolerância religiosa e a crença na impunidade contribuem para que muitas ocorrências não sejam reportadas", afirma. 

Como denunciar a intolerância religiosa: 

Canais do Disque 100

  • Ligação gratuita, basta discar 100;
  • WhatsApp (61) 99611-0100;
  • Telegram (digitar "direitoshumanosbrasil" na busca do aplicativo);
  • Site da Ouvidoria (https://www.gov.br/mdh/pt-br/ondh/);
  • Videochamada em Libras (https://atendelibras.mdh.gov.br/acesso).

Defensoria Pública da Bahia (DPE/BA) 

  • Disque 129 
  • Endereço: Avenida Ulisses Guimarães, nº 3.386, Edf. Multicab Empresarial – Sussuarana
  • Telefone: (71) 3117-9160 - segunda a sexta-feira, das 8h às 17h.

Ministério Público da Bahia (MP-BA) 

  • Site do Ministério Público da Bahia
  • Pelo mapa do racismo: aplicativo do MP para esses tipos de denúncias
  • Promotorias: direto nas promotorias de Justiça de cada município - no caso de Salvador, é a 1ª Promotoria de Justiça de Direitos Humanos da capital

Secretaria de Promoção da Igualdade Racial (Sepromi)

  • Telefone (71) 3117-7448 - segunda a sexta-feira, das 9h às 12h, e também das 14h às 18h.
  • Todos os casos registrados são  direcionados ao Centro de Referência de Combate ao Racismo e à Intolerância Religiosa Nelson Mandela, responsável por oferecer apoio psicológico, social e jurídico às vítimas de racismo e intolerância religiosa.