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Elaine Sanoli
Publicado em 28 de março de 2025 às 20:31
Capoeiristas, percussionistas, baianas de receptivo e outros artistas se reuniram em defesa da permanência da produtora cultural Simone Carrera na Casa 14, no Pelourinho. A manifestação ocorreu em meio a notificação para desocupação do imóvel, ação do Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia (Ipac), órgão vinculado à Secretaria de Cultura do Estado da Bahia (Secult).>
De acordo a autarquia, a RES Inexplicata, empresa gerida por Carrera, está com a cessão de uso do imóvel vencida desde 2017. A produtora entrou na justiça para conseguir a renovação da autorização.>
"É um casarão com muita importância para nós, artistas da região do Pelourinho, que sempre nos atende quando precisamos. Foi o único projeto que, juntamente com a Sole Produções, nos assistiu durante a pandemia, nos deu cestas básicas, fez eventos", relembrou Elizete Silva, maestrina da banda Meninos da Rocinha do Pelô. >
Carrera atua na Casa 14, localizada na Rua Frei Vicente, há cerca de 10 anos. Mas a RES Inexplicata ocupa o prédio há mais ou menos 20 anos. Segundo o Ipac, o imóvel é concedido à empresa “sem qualquer contrapartida financeira” e desde 2017 o Termo de Outorga Gratuita do local está vencido. O órgão diz que a desocupação "faz parte de um plano de regularização de ocupação de imóveis no Centro Histórico de Salvador", que mirou o casarão porque a empresa possui lucros e rendimentos e "precisa ter outra destinação na região".>
A produtora afirma que, diante do vencimento da cessão, tentou renovar o termo, mas foi impedida por conta do tempo que a empresa já desempenha atividades no espaço. “Ora, existem vários imóveis ocupados por diferentes entes culturais que estão lá há muito mais tempo do que eu e isso não é um impedimento. Se você está no imóvel, você pode muito bem ter o termo de cessão renovado, qual o problema? Isso é uma mera burocracia”, argumenta a produtora.>
Sobre a contrapartida, ela explica que as negociações com o governo do estado reconheciam o impacto cultural e social para a região como uma forma de devolutiva.>
A situação mudou desde 2023. Com a recusa em renovar o termo, Carrera decidiu judicializar a questão, que ainda não foi julgada, e aguarda por um resultado até o momento. O Ipac alega que, neste mesmo ano, houve uma vistoria no prédio, o que ocasionou a decisão de reforma e por isso a empresa RES Inexplicata vem sendo notificada a desocupar o casarão.>
Em fevereiro, mais uma notificação foi emitida e, segundo o órgão da Secult, “tendo em vista a proximidade do carnaval, a Sra. Simone Carrera, Presidente da Fundação, pediu que o Ipac aguardasse até o final do carnaval para executar a medida de desforço em razão dos compromissos previamente assumidos pela entidade”. >
Na última quarta-feira (26), o Ipac voltou a alertar a empresa para que o casarão fosse esvaziado e, nesta sexta, deu 15 dias para remoção dos bens móveis da propriedade. A entidade argumenta que, apesar da notificação de desocupação, a empresa firmou contrato no valor de R$ 350.000,00 com a Fundação Gregório de Mattos (FGM) para realização do Movimento Boca de Brasa, nos dias 27, 28 e 29 de março, em celebração ao aniversário de Salvador. "Ou seja, a Fundação assinou um novo contrato com um ente público e com base nisso deseja permanecer no imóvel que pertence ao Ipac, de forma gratuita e por tempo indeterminado, mesmo possuindo diversas fontes de recurso e tendo, por lei, a responsabilidade de contratar uma sede", diz o órgão.>
Durante os 10 anos em que administra a Casa 14, Simone Carrera afirma manter com recursos próprios o funcionamento do espaço cultural, aberto a artistas de diferentes áreas de forma majoritariamente gratuita. Para manter o prédio em funcionamento, ela afirma investir aproximadamente R$ 50 mil anualmente. “O prédio que ocupo tem três andares, precisa de revisão elétrica, hidráulica, descupinização, manutenção predial, pintura, portas, janelas, é um rio de dinheiro”, diz. “O Governo do Estado não gasta um centavo com aquela casa, eu mantenho tudo do meu bolso. Então, por que essa arbitrariedade?”, questiona.>