Ansiedade e 10 horas de estudo por dia: como é a rotina de alunos de BI que sonham com uma vaga em Medicina

Universidade diminuiu a oferta de vagas mesmo após acordo feito com o MPF

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  • Maysa Polcri

Publicado em 5 de setembro de 2024 às 05:15

Ufba completa 77 anos em 2023
Estudantes denunciam redução de vagas Crédito: Divulgação

Quando percorreu os 680 quilômetros que separam Botuporã, a cidade em que nasceu, e Salvador, Gabriel Costa tinha um objetivo em mente: ingressar no curso de Medicina da Universidade Federal da Bahia (Ufba). Para isso, sabia que iria enfrentar cerca de dez horas diárias de estudos para concluir a graduação no Bacharelado Interdisciplinar em Saúde (BIS). Agora, a redução de vagas para Medicina na universidade coloca em risco os sonhos do jovem de 21 anos e de outros estudantes.

Segundo denúncia apresentada por um grupo de 40 alunos da Ufba, a universidade descumpriu acordo firmado com Ministério Público Federal (MPF) e não ofertou nove vagas de Medicina no campus de Vitória da Conquista para egressos do bacharelado interdisciplinar. A defesa dos estudantes entrou com um pedido de impugnação do processo seletivo. Dezenas de alunos temem o aumento da concorrência após três anos de estudos intensos.

Para morar na capital baiana, Gabriel Costa se afastou da família e começou a trabalhar como fotógrafo autônomo, em 2021. Durante três anos de curso, estudou, em média, dez horas por dia. “Venho de uma família de baixa renda e precisei me desdobrar para conseguir viver em Salvador com o objetivo de entrar em Medicina”, diz o aluno, que recebe auxílio no valor de R$400 da universidade. Ele conta que solicitou auxílio alimentação e moradia, devido a sua condição financeira, mas não conseguiu.

“É tanta burocracia que acabei desistindo. Um discurso de cuidado com os estudantes é vendido pela universidade, mas, na prática, é diferente. Sou de uma turma que ingressou na pandemia e sempre fomos negligenciados por conta disso”, afirma. Os relatos sobre a pressão sofrida pelos alunos durante a graduação no bacharelado interdisciplinar são recorrentes e foram, inclusive, tema de uma reportagem do CORREIO

A cada semestre, a Ufba disponibiliza 41 vagas para alunos do bacharelado interdisciplinar que desejam migrar para Medicina. O critério utilizado para o preenchimento das vagas é o rendimento dos estudantes durante os três anos de curso. “Com a diminuição das vagas ofertadas, a concorrência aumenta e nosso sonho é prejudicado”, diz uma estudante que prefere não se identificar. Segundo ela, a decisão da universidade tem impactado a rotina dos alunos.

“As pessoas estão angustiadas e desesperadas. O número de alunos adoecendo mentalmente é elevado, muitos estão tomando remédios controlados. O mínimo que a universidade deveria garantir é o cumprimento dos nossos direitos”, completa. O estudante Matheus Pires, que também faz parte do grupo de alunos que ingressaram com o pedido de impugnação, relata que a pressão tem se intensificado nos últimos dias.

“Na reta final, começam a haver atritos maiores porque todos os alunos têm o mesmo objetivo e o curso propicia que os alunos estejam uns contra os outros. Com a diminuição da oferta de vagas, o cenário de competição fica mais acirrado”, destaca.

A Universidade Federal da Bahia foi questionada sobre o pedido de impugnação do processo seletivo e disse, através da sua assessoria de imprensa, que as nove vagas não foram ofertadas porque o campus de Vitória da Conquista não oferece vagas no curso de medicina no segundo semestre. No entanto, o grupo de estudantes alega que todas as turmas do BI em Saúde egressas entre os anos de 2015 e 2020 tiveram direito as 41 vagas ofertadas nos campi da universidade. O MPF também foi procurado, mas não se pronunciou.