‘A tecnologia é para quem quer aprender’, defende diretor de telecomunicações da Intel Brasil

Jayro Navarro Júnior ressalta a importância de um maior estímulo a formação em tecnologia desde a educação básica; Bahia é piloto na implementação de iniciativa global de qualificação de professores na área

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  • Priscila Natividade

Publicado em 12 de novembro de 2023 às 07:00

Jayro Navarro Junior é diretor de telecomunicações da Intel Brasil
Jayro Navarro Junior é diretor de telecomunicações da Intel Brasil Crédito: Joel Silva/ Divulgação

Se por um lado, a necessidade de estar conectado fez aumentar a demanda por mão de obra em tecnologia, na outra ponta faltam profissionais qualificados para atender a expansão dessa conectividade. A saída, no entanto, pode estar em um professor que multiplica conhecimento com outro professor de uma escola técnica, que vai replicar para um terceiro educador de outra localidade e, lá na frente, incentivar jovens profissionais, a se inserirem no mercado de trabalho do futuro.

Fazer o interesse por tecnologia alcançar a educação básica na formação da nova geração de inovadores. Para o diretor de telecomunicações da Intel Brasil, Jayro Navarro Júnior, suprir essa escassez é urgente. “Está faltando base. O que esperamos é que o jovem queira aprender. Ao proliferar a informação e a digitalização por todos os lugares, eu levo informação. Levando informação, a educação chega e o conhecimento para as pessoas também. A ideia é essa”, ressalta.

Navarro Júnior destaca que os projetos existem e o conhecimento está aí a disposição de quem quiser aprender. Além do interesse do segmento há um movimento forte de expansão dessa conectividade, ainda que muita coisa dependa do poder público, da base curricular das escolas, formação de professores e do próprio despertar desse estudante para o perfil profissional tecnológico.

“Falta um pouco de vontade da educação básica em desafiar os alunos a aprenderem tecnologia. Essa preparação precisa acontecer durante a formação e aí a universidade vir para que ele possa buscar níveis mais avançados. Existe uma carência muito grande nisso, o país necessita dessa mão-de-obra. A educação e a tecnologia são para quem quiser. Estamos tentando provar que é possível a educação chegar em áreas que jamais ela viu chegar. E a democratização da informação é fundamental para que a educação aconteça”, afirma Navarro Júnior, que também é responsável pelo desenvolvimento de novas tecnologias junto a grandes empresas do setor.

Na Bahia, a Intel acaba de incluir o Centro Regional dos Técnicos da Bahia (CRT-BA) no programa global Skills for Innovation (Intel SFI), que chegou recentemente ao Brasil, tornando a Bahia um dos estados piloto na adesão a iniciativa. Lançado durante a Futurecom 2023 no último mês, em São Paulo, a iniciativa já certificou 50 profissionais baianos. Segundo informações do CRT-BA, uma nova etapa de inscrições está prevista para março de 2024. “Um dos fatores que auxiliou a escolha da Bahia para o projeto foi o Polo de Camaçari. Lá a concentração de indústrias e a potência de crescimento faz surgir uma grande necessidade de profissionais especializados”, justifica.

Com o objetivo de gerar mais profissionais qualificados em ciências, tecnologia, engenharia e matemática (STEM/ Science, Tecnology, Enginnering and Mathematics), atualmente, o programa está presente em 30 países. Na América Latina, o Intel SFI também está na Argentina, Colômbia e México. Leia mais na entrevista completa.

De que maneira a tecnologia vai impondo uma formação profissional cada vez mais voltada para a digitalização e o avanço da inteligência artificial?

A Unesco já havia apontado em um relatório que, aproximadamente, 75% dos empregos futuros vão exigir competências relacionadas à STEM, o que representa um desafio muito significativo. Existe uma tendência também do mercado de tecnologia de crescer exponencialmente nos próximos anos globalmente, com destaque especial para o Brasil. A tecnologia deve ser entendida como aliada dos processos educacionais. As novas tecnologias de informação e comunicação estão desempenhando um papel chave nos nesses sistemas para unir teoria e prática. Daí a importância de os jovens crescerem educados com bases sólidas e responsáveis em relação a essa utilização. O programa Intel Skills for Innovation vem para incentivar e impulsionar a formação de mais profissionais e assim, capacitar a próxima geração de inovadores.

" As novas tecnologias de informação e comunicação estão desempenhando um papel chave nos nesses sistemas para unir teoria e prática. Daí a importância de os jovens crescerem educados com bases sólidas e responsáveis em relação a essa utilização"

Jayro Navarro Júnior
diretor de telecomunicações da Intel Brasil

O que a pandemia fez avançar nesse processo?

Logo no começo da pandemia, eu recebi a seguinte pergunta: quem foi o principal percussor da tecnologia na sua empresa? O ceo, o diretor, o gerente? Não, foi a pandemia. Ela obrigou muitas empresas e pessoas a se adequarem ao novo normal. A pandemia acelerou processos que talvez demorasse muito mais no Brasil, como o home office, a capacidade de você deixar o empregado trabalhar de onde ele tivesse. Por outro lado, ela também enfatizou esse déficit que existe sobre a falta de profissionais da área de tecnologia no país, algo que já era um fato até mesmo antes de atravessarmos esse momento.

O que a Intel tem hoje em termos de tecnologia desenvolvida para essa área?

O principal papel nosso é desenvolver o hardware e o software para qualquer tipo de modernização. Mas, imagine o seguinte: hoje, estamos criando soluções para colocar nas escolas essa informação que não chegava antigamente. A Intel vai trabalhar tentando fornecer não só o conhecimento como também alguma parte de formação tecnológica. Pense em uma escola pública que está em um morro, onde não alcança fibra e que não passa nada. Essa escola fica no interior de São Paulo e nós vamos levar conexão a um lugar que até então, nada disso chegava. O Laboratório 5G é uma iniciativa reúne 14 empresas de diferentes matizes e expoentes no setor de tecnologia de informação e comunicação cuja convergência está justamente na agenda de redes abertas. O objetivo é o desenvolvimento de um centro de soluções para telecomunicações localizado na cidade de Sorocaba, São Paulo. Fazem parte desta parceria as empresas Ciena, Dell, FIT, Fujitsu, IBM, Intel, Mavenir, Okemo, Ookla, Palo Alto Networks, Red Hat, SIAE, UP2Tech e VIAVI Solutions. Queremos usar essa experiência como referência e lá na frente replicar em outros lugares.

Quais os caminhos para se manter relevante na sua área de atuação e como a Inteligência Artificial pode promover também o acesso e a democratização da conectividade?

A Intel tem uma meta de democratizar a inteligência artificial abrangível para todo mundo até 2030. A inteligência artificial é um modelo que está muito em voga e as pessoas são curiosas. Todo mundo fala ou já ouviu falar no ChatGPT ou outros meios de inteligência artificial de um modo geral. Seja qual for a área de atuação, a primeira pergunta a se fazer é: será que isso funciona mesmo? Eu vou perder o meu emprego? A gente começa a ver que a tecnologia serve para melhorar a vida do humano, mas ela não o substitui. Tecnologia não dá um aperto de mão, um olho no olho. Não existe robô quente, que possa transmitir calor humano. O humano ele é humano justamente por isso. O que faz a diferença é a pergunta, a curiosidade e a inteligência artificial não está pronta apara isso. Logicamente, existe muita coisa que vai facilitar. Vai se diminuir alguns trabalhos? Sim. Mas aí, por outro lado, já existe uma nova profissão chamada engenheiro de prompt que é o cara tem que saber fazer a pergunta certa para essa inteligência artificial. Por mais que a inteligência artificial evolua, ela não consegue ainda criar isso. O ser humano é quem faz a criação. Quanto mais informação você der para o ser humano, mas ele é capaz de se desenvolver.

" Não existe robô quente, que possa transmitir calor humano. O humano ele é humano justamente por isso. O que faz a diferença é a pergunta, a curiosidade e a inteligência artificial não está pronta para isso"

Jayro Navarro Júnior
diretor de telecomunicações da Intel Brasil

Qual o potencial da educação profissional tecnológica hoje? Quais as perspectivas e como a Bahia se encaixa nessas oportunidades?

Nós trabalhamos com várias empresas e vários polos no estado. Tem governos na Bahia que compram indiretamente na Intel, mas desenvolvemos tecnologia para vários órgãos. Além disso, a Bahia é uma das duas localidades piloto que a Intel apostou para trazer a iniciativa global de educação Intel Skills for Innovation (Intel SFI), que oferece capacitação voltada para tecnologia. Vocês estão no foco enquanto polo tecnológico no Brasil, atraem novas empresas como fizeram recentemente com a fábrica de carros elétricos. O projeto junto ao Centro Regional Dos Técnicos da Bahia (CRT-BA) já está mudando da fase 1 para fase 2. Na fase 1 foi criado o primeiro nível de multiplicadores e agora esses multiplicadores vão se tornar multiplicadores de outros professores de escolas técnicas. O plano é que cada multiplicador trabalhe, no mínimo, com cinco pessoas, mas tem multiplicador que já conseguiu trabalhar com 10. Quero que isso chegue a 20, 30 pessoas e multiplique mais ainda levando esse conhecimento, abrindo o leque para as regiões. Você traz alguns professores, ensina a eles e dali multiplica para outros. Um professor de Camaçari foi para Simões Filho e replicou. E aí Simões Filho replica para outro. Você faz com que isso se torne uma onda de informação educadora.

A educação profissional que temos atualmente se habilita para esse futuro? O que ainda é gargalo?

Falta um pouco de estímulo, talvez seja a principal falha. Essa falta de vontade da educação básica em desafiar os alunos a aprender tecnologia. No mercado de trabalho imediato falta hoje 50 mil vagas que não são supridas. Se você começa essa formação nos jovens, ainda na educação básica, ele vai estar preparado para um primeiro emprego técnico, não vai precisar ser formado numa faculdade para começar a trabalhar e aí, na universidade ele vai buscar os níveis mais avançados. Nós estamos trabalhando, inclusive, com o CRT-BA para preparar os jovens. Eles vão para tecnologia, TI, para a parte de eletrotécnica. Existe uma carência muito grande nisso, o Brasil necessita dessa mão-de-obra. Fazer o jovem enxergar e entender que ele precisa se preparar para o mundo tecnológico seja qual for a carreira que ele escolher. Outro gargalo que eu vejo é existe uma grande falta de mulheres na tecnologia. Antes, se assustava as mulheres dizendo que a tecnologia não era para elas. É uma burrice falar uma coisa dessas. Todo mundo é capaz de tudo.

"Existe uma carência muito grande nisso, o Brasil necessita dessa mão-de-obra. Fazer o jovem enxergar e entender que ele precisa se preparar para o mundo tecnológico seja qual for a carreira que ele escolher"

Jayro Navarro Júnior
diretor de telecomunicações da Intel Brasil

E como incluir esses jovens no mercado de trabalho em tecnologia?

O aprendizado é constante. Eu, por exemplo, tenho 54 anos e já estou estudando 6G. Aí você pergunta: ‘poxa, Jayme, o 5G está chegando ainda e você já está estudando o 6G’? Se eu não estudar, alguém vai estudar e eu quero estar preparado para o 6G. Primeira coisa, educação constante. Se você pegar esse jovem de 15 anos e começar a jogar informação dele, despertar esse conceito de educação continuada, aí a roda começa a girar e, sim, eu consigo suprir essa falta de mão de obra que temos atualmente. O desafio é esse, formar e qualificar e ter conectividade para que a gente possa dar acesso a essa educação. Onde a gente quer chegar? Depende da capacidade de desenvolvimento de cada um. Nós temos essa defasagem no Brasil, esse buraco. Mas é preciso tomar impulso. Os projetos estão sendo trabalhados, eles estão aí. Vai depender de o ser humano aceitar e se desenvolver.

Num futuro muito próximo o que essa educação tecnológica reserva?

A palavra-chave é a chamada borda, a conexão nas áreas remotas. Não queremos trabalhar só nos grandes, mas também nos pequenos porque ali, temos a oportunidade de levar a informação, a conectividade para os lugares mais remotos. A gente tem certeza que quer trazer a informação para todo mundo. É isso que vai acontecer? É preciso ver políticas públicas, investimentos. São vários fatores que me levam a falar sobre qual o mundo ideal e qual o mundo real e aí chegar no perfeito. O ideal tem muitas condições, mas é o que eu posso fazer. Já sobre o mundo mais real, as inovações estão acontecendo. O perfeito é o sonho. Mas com a busca pela conectividade e pela informação, eu acho que acelero esse sonho. O ideal é ter a conectividade em todo lugar. A mínima condição básica para se você quiser estudar, conseguir fazer isso, ter capacidade de se desenvolver. É fazer a educação chegar onde não existia.

O futuro é logo ali

Dados mais recentes de um estudo feito pela Associação das Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC) e de Tecnologias Digitais (Brasscom) apontam que o país vai precisar de 797 mil profissionais de tecnologia até 2025. O que preocupa é que o país não chega a formar anualmente nem 10% desse montante de profissionais oriundos de cursos de perfil tecnológico. Ainda segundo a mesma pesquisa, o Brasil forma atualmente 53 mil pessoas por ano em cursos de perfil tecnológico. A remuneração dos profissionais de TIC chega a ser 2,9 vezes maior do que a média de outros setores.

QUEM É

Jayro Navarro Júnior é diretor de Telecomunicações da Intel Brasil e responsável pelo desenvolvimento de novas tecnologias em parceria com grandes empresas do setor. Há mais de oito anos na Intel, Jayro também é um dos responsáveis no desenvolvimento de projetos de telecom da Intel em parceria com operadoras e com todo o ecossistema.

*A repórter viajou até São Paulo a convite da Intel para acompanhar o evento