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Larissa Almeida
Publicado em 8 de março de 2024 às 06:15
Líder no número de mortes de mulheres no Nordeste, a Bahia registrou 70 casos de feminicídio em 2023. Desse total, 34,29% das vítimas tinham entre 40 e 59 anos. Os dados são do boletim Elas Vivem: Liberdade de Ser e Viver, divulgado nesta quinta-feira (7). O relatório foi realizado pela Rede de Observatórios da Segurança, com base em números de oito estados do Brasil, sendo eles Bahia, Ceará, Maranhão, Pará, Rio de Janeiro, São Paulo, Piauí e Pernambuco.
Para Larissa Neves, pesquisadora da Rede de Observatórios da Segurança e assistente social, a faixa etária alvo dos crimes de feminicídio surpreendeu. “Pela primeira vez essa faixa etária aparece como principal alvo na Bahia, considerando os últimos quatro relatórios. Geralmente, eram mulheres jovens ou até 40 anos de idade que eram as principais vítimas de feminicídio”, afirma.
“Um ponto muito importante é que os casos que envolviam filhos e mães, cônjuges com relações douradoras, homens que se suicidaram após matar as mulheres, eram mulheres acima de 40 anos de idade. Temos um novo desafio para entender o que acontece nessas dinâmicas familiares e relacionais. É um dado para tentarmos entender”, enfatiza a pesquisadora.
Eduardo Carvalho, pesquisador associado do Núcleo de Estados Interdisciplinares sobre a Mulher na Universidade Federal da Bahia (Neim/Ufba) aponta que, ao pensar em violência contra a mulher com as lentes de idade/geração, é possível perceber que mulheres em idade reprodutiva estão mais expostas a crimes de natureza sexual.
“No caso do feminicídio, penso que uma questão que não se pode perder de vista é que os casos que geralmente chegam e são tratados como tal pelo sistema de justiça e, portanto, vão gerar estatísticas, são aqueles que chamamos de feminicídio íntimo, quando é praticado por uma pessoa com quem a vítima tem ou teve uma relação íntima de afeto. Talvez isso nos ajude a compreender por que as mulheres em idade adulta figuram como a maioria”, diz.
Larissa Neves ressalta que, durante a fase de monitoramento dos casos que integram o boletim, foi observado que a maioria das mortes por feminicídios tinham como autores cônjuges e ex-cônjuges, bem como namorados e ex-namorados. A pesquisadora alerta apenas para o fato de que, apesar de configurarem maioria, feminicídios não são cometidos apenas por parceiros íntimos, mas por homens de convívio próximo, como irmão, pai, filho, tio, amigos, vizinhos e colegas, desde que a motivação para o crime tenha sido o ódio de gênero.
Relembre casos
Iranete Borges de Oliveira, 53 anos
A diretora escolar Iranete Borges de Oliveira, de 53 anos, foi baleada na frente de casa, na Avenida Romão Gramacho, no município de América Dourada, enquanto estava no carro. O caso aconteceu no Povoado do Tareco, no dia 20 de fevereiro de 2023. O ex-companheiro, principal suspeito do crime, foi preso dois dias depois, no município de Irecê.
O suspeito se apresentou na delegacia e, apesar de negar a autoria do crime, permaneceu preso por força de um pedido de prisão preventiva expedido pela Justiça. Ele é investigado por feminicídio.
Karla dos Santos Ferreira, 44 anos
No dia 11 de março de 2023, a mulher trans Karla dos Santos Ferreira, de 44 anos, teve o corpo queimado pelo ex-companheiro em um hospital na cidade de Itabuna, no sul da Bahia, no dia 11 de março. Karla acompanhava o pai quando foi surpreendida pelo ataque.
De acordo com a Prefeitura de Itabuna, o pai da mulher estava internado no Hospital de Base Luís Eduardo Magalhães, local onde aconteceu o crime. No lugar, o companheiro a chamou para uma área externa nos fundos da unidade onde, depois de uma conversa, jogou álcool e ateou fogo em seu corpo. Com o corpo em chamas, a vítima correu para dentro do hospital pedindo ajuda. Ela foi logo atendida, mas seu estado de saúde era grave. Karla ficou internada, mas morreu na madrugada do dia 1º de abril.
O homem de 44 anos, autor do crime, foi autuado em flagrante por tentativa de feminicídio após ser apresentado na sede da 6ª Coorpin de Itabuna por uma guarnição da Polícia Militar.
Ana Paula Brito Pimenta, 46 anos
No dia 15 de abril de 2023, Ana Paula Brito Pimenta, de 46 anos, foi vítima de agressões antes de ser morta pelo ex-companheiro, no bairro da Liberdade, em Salvador. A vítima chegou a ser socorrida e ficou internada em uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA) de Salvador, onde teve a morte cerebral confirmada no dia 20 do mesmo mês.
O suspeito foi preso apenas no mês seguinte, no dia 3 de maio. Segundo a delegada Bianca Andrade, titular da Deam, o suspeito foi localizado escondido na casa de familiares na cidade de Dias D'Ávila.
Simone Maria Santos, 51 anos
Na manhã do dia primeiro de maio do ano passado, a enfermeira Simone Maria Santos, de 51 anos, foi morta a pedradas em sua casa, no quarto andar do Edifício Porto do Sol, na Rua Arthur D'Almeida Couto, em Salvador, pelo homem com quem estava casada há 30 anos e tinha dois filhos, já adultos. Descrita pelos colegas como generosa e discreta, Simone trabalhou como técnica de enfermagem por 17 anos, até ter sua vida interrompida precocemente.
De acordo com moradores, que preferiram não se identificar, Simone queria o fim do casamento e esse teria sido o fator que motivou o crime, uma vez que o marido não aceitava o término da relação. Antes de ir a óbito, a vítima ligou para um dos filhos pedindo socorro. O jovem ligou para a polícia, mas não chegou a tempo de socorrer a mãe.
Edilania dos Santos Lima, 41 anos
Em Jacobina, no norte da Bahia, Edilania dos Santos Lima, 41 anos, foi morta a facadas pelo marido, em um bar na Praça Getúlio Vargas, no dia 26 de dezembro de 2023. Segundo informações divulgadas pela Polícia Civil, o casal estava em um bar quando tiveram um desentendimento e o autor esfaqueou Edilania, que não resistiu aos ferimentos.
O suspeito foi preso em flagrante por feminicídio na Delegacia Territorial.
*Com orientação da chefe de reportagem Perla Ribeiro