Moradores fazem o próprio Carnaval em pelo menos dez bairros de Salvador

Bloquinhos mantém a tradição das fanfarras, marchinhas e minitrios

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  • Gil Santos

Publicado em 25 de janeiro de 2024 às 05:00

Os carnavais de bairro surgiram como uma opção para que não queria brincar nos circuitos tradicionais
Os carnavais de bairro surgiram como uma opção para que não queria brincar nos circuitos tradicionais Crédito: Almiro Lopes/Arquivo Correio

Faltava uma semana para o início do Carnaval quando moradores do Santo Antônio Além do Carmo marcaram um Baba de Saia. No final da partida, jogadores e torcedores saíram atrás de um carrinho de café, cantando e dançando os clássicos de Momo até a praça, onde o grupo se aglomerou no entorno do coreto. O ano era 2010, mas a tradição continua até hoje. Os carnavais de bairro estão com força em Salvador. Pelo menos dez bloquinhos confirmaram desfile em 2024. Confira.

O bloco que surgiu do Baba de Saia recebeu o nome de XV Mistérios, em homenagem a uma igreja do bairro. O fundador Evandro Muniz contou que o objetivo é resgatar a cultura que existia no Carnaval antes da festa ser transformada em uma grande indústria do entretenimento.

"São marchinhas e bandas de fanfarra. No primeiro ano, éramos cerca de 150 pessoas, mas, com o passar do tempo, a festa foi crescendo. A maioria [dos foliões] ainda é de moradores locais e de bairros adjacentes, mas tem pessoas de outros bairros", conta.

Em geral, os bloquinhos de Carnaval surgiram nos bairros por iniciativa de moradores insatisfeitos com os circuitos tradicionais, por diversos motivos, como falta de espaço para brincar na pipoca, pelo receio da violência ou por questões pessoais.

A Ressaca das Cabritas, por exemplo, surgiu depois que um morador do Alto do Cabrito não pode pular Carnaval porque estava de plantão. No fim de semana seguinte, quando estava de folga do trabalho, ele reuniu os amigos, abriram a mala do carro, ligaram o som e saíram andando pelas ruas. A tradição começou em 2003 e é realizada até hoje. Porém, a estrutura agora tem trio elétrico e até camarote.

Enquanto isso, no Barbalho, um grupo de amigos cansados do aperto da pipoca nos circuitos tradicionais criou o próprio bloco de Carnaval, em 2016. O MSC, uma sigla para Movimento Sem Corda, saía das imediações do Quartel até o Santo Antônio Além do Carmo, mas o fundador Carlos Fernando explica que, este ano, a festa será apenas pelas ruas do Santo Antônio, porque haverá uma feira na porta do quartel na data do desfile, em 9 de fevereiro.

"Alguns amigos e eu estávamos cansados de não ter um espaço à vontade para brincar na pipoca do Carnaval e estávamos sentindo falta das músicas tradicionais da folia. Foi assim que surgiu a ideia do Bloco MSC. Fizemos uma experiência, em maio de 2016, e como deu certo começamos a sair todo Carnaval a partir de 2017", diz Carlos Fernando.

O desfile é realizado pelas ruas, portanto, é gratuito, mas existe opção de open bar (confira abaixo). Já os moradores da Vila Laura foram motivados pela solidariedade. O fundador Leandro Pereira conta que ele e alguns amigos tinham por hábito ajudar instituições carentes e, em 2017, tiveram a ideia de criar um bloquinho para arrecadar donativos. A festa é de camisa que pode ser trocada por duas latas de leite.

"Nos quatro primeiros anos, nós ajudamos uma instituição do próprio bairro, mas, no ano passado e neste ano, vamos fazer as doações para o Hospital Martagão Gesteira. Em 2023, arrecadamos 700 latas de leite. A meta deste ano é alcançar mil latas e, pelo ritmo em que estão as trocas, nós vamos bater alcançar o objetivo", afirmou Leandro.

Oportunidades

Moradores contaram que a realização da folia nos bairros evita despesas e perda de tempo com deslocamento, movimenta a economia local, é mais seguro e volta a atenção do poder público para resolver questões estruturais das comunidades. Foi pensando nisso que o músico Chico Gomes, morador do 2 de Julho, resolveu fundar um bloquinho.

"O Chupeta Doce foi uma iniciativa dos moradores. É um nome que tem uma picardia e, ao mesmo tempo, tem uma ingenuidade. Eu tenho um microtrio e a gente viu que o Santo Antônio foi se tornando um destino para os baianos e turistas, que isso atraiu empreendimentos, como restaurantes e hotéis, novos eventos e que o poder público começou a investir. Notamos uma mudança significativa em cinco anos", explicou.O primeiro desfile foi em 2023, quando cerca de 2 mil pessoas percorreram as ruas do bairro. A expectativa é superar essa meta este ano.

 Já o Movimento Cultural Palhaços do Rio Vermelho, fundado em 2010, está preparando uma apresentação com 15 alas e 120 percursionistas. No ano passado, eles arrastaram 10 mil foliões. A fundadora Lúcia Menezes contou que o grupo surgiu de uma brincadeira.

"A primeira vez que saímos foi em 1984, um grupo de 25 pessoas, entre familiares e amigos, na Avenida Sete de Setembro, mas a festa foi crescendo e chegou um momento em que tinha 100 pessoas na minha casa. Para se ter uma ideia, enchemos uma banheira de mil litros com cervejas e preparamos 20 kg de sarapatel. Foi quando eu disse 'é hora de parar', porque era muita gente", conta.

Em 2010, a vontade de sair fantasiado voltou e teve tanta adesão que o grupo fretou um ônibus para levar os foliões até a barra. A partir de 2011, os moradores do Rio Vermelho decidiram manter a festa no bairro de uma vez por todas. É o que está acontecendo também no Costa Azul. Por lá, o Bloco Aperta Mais que Dá reuniu 500 pessoas na edição do ano passado e a expectativa da organização é um movimento ainda maior em 2024.

Confira os próximos bloquinhos de rua de Salvador:

Chupeta Doce, no Dois de Julho (26 de janeiro) - A festa será realizada no bairro do Dois de Julho, na sexta-feira (26). A concentração será às 18h, nas imediações do bar Mocambinho, segue pelas ruas do bairro a partir das 19h. A festa será comandada por Chico Gomes e a Marana, além de contar com a participação especial de André Macedo e Sávio Assis. O Palhaço Peteleco também está confirmado. A festa é gratuita.

Palhaços do Rio Vermelho (27 de janeiro) – Já o tradicional no bairro do Rio Vermelho, o Movimento Cultural Palhaços do Rio Vermelho terá 15 alas, com representantes de Salvador e do interior da Bahia, e 120 percursionistas. A concentração será às 17h, nas imediações das quadras da Rua da Paciência, e a saída às 19h, em direção à Rua Fonte do Boi. O evento é gratuito, mas quem quiser pode colaborar comprando camisas vendidas no Boteco do França e no Shopping do Rio Vermelho, por R$ 70.

Sagalera da Vila Laura (27 de janeiro) - O evento será realizado no bairro da Vila Laura, no sábado (27). A concentração será às 16h, na Rua Inhuma. O abadá poder ser trocado por duas latas de leite que serão doadas para o Hospital Martagão Gesteira. A troca é feita no supermercado Rede Mix. A folia será comandada pela banda Sagalera, com repertórios de marchinhas tradicionais.

Imbuí Folia, no bairro do Imbuí (27 e 28 de janeiro) - Serão sete blocos e os horários de concentração alternam. No sábado tem o Somos Pipoca (16h30), Marblokinho (17h), Imbuí folia (18h) e Deu liga (19h). Já no domingo, tem o Levada do imbuí (16h30), Sambinha do Imbuí (17h) e Lucas Babidi (18h).

Bloco Aperta que Dá, no Costa Azul (28 de janeiro) - O evento será realizado no bairro do Costa Azul, no domingo (28). A concentração será na Rua Dr. Augusto Lopes Pontes, nas imediações do posto Shell Budião, a partir das 10h45. O valor individual da camisa está de R$ 135 e a casadinha sai por R$ 250, com direito a caneca e open bar de cerveja, água e refrigerante. O trajeto da festa é de 3,5 km, percorrendo as ruas do bairro e encerrando no Parque Costa Azul. O tempo estimado é de 3h, com minitrio e banda de fanfarra.

Bloco XV mistérios, Santo Antônio Além do Carmo (2 de fevereiro) - A festa será realizada pelas ruas do bairro partindo da Travessa Bahia, também conhecida como Beco do Grafite, a partir das 20h. Haverá minitrio e fantasias. O repertório incluí marchinhas tradicionais do Rio de Janeiro e da Bahia, além da Axé Music.

Bloco da Resenha, na Pituba (3 de fevereiro) - O evento percorre as ruas do bairro. A concentração será na Rua Pará, às 14h. As vendas estão no terceiro lote, os ingressos custam R$ 120 e podem ser comprados através do link disponível nas redes sociais do evento. A última edição deixou as ruas do bairro lotadas.

Banho de Mar à Fantasia, Ladeira da Preguiça/ Centro (4 de fevereiro) – O evento é realizado na Ladeira da Preguiça, no Centro Histórico, e reúne diversos movimentos culturais. A regra é ir fantasiado. A concentração será a partir das 9h e mais detalhes ainda serão divulgados.

Bloco MSC, no Santo Antônio Além do Carmo (9 de fevereiro) - A festa será realizada pelas ruas do bairro, com concentração às 15h30, no Largo do Santo Antônio. É gratuita, mas quem preferir pode comprar os ingressos para open bar de cerveja e água, por R$ 90 individual e R$ 175 a casadinha. Mais informações no @movimentosemcorda. A recomendação da organização é se fantasiar e cair na folia.

Ressaca das Cabritas, Alto do Cabrito (3 de março) - O evento é realizado depois que a folia de Momo termina e reúne multidões nas ruas do Alto do Cabrito. A camisa está no primeiro lote e custa R$ 70. A concentração será na 2ª Travessa Ana Piedade. O horário ainda será divulgado. A festa tem minitrios elétricos e camarotes.

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