Júlia Lemmertz, a Helena de Em Família, fala sobre protagonista de trama com atrizes que viveram papel

Júlia Lemmertz, a Helena de Em Família, fala sobre protagonista de trama com atrizes que viveram papel

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  • Da Redação

Publicado em 2 de fevereiro de 2014 às 13:32

- Atualizado há um ano

Christiane Torloni é a primeira a chegar à suite do Copacabana Palace para o encontro entre as Helenas de Manoel Carlos promovido pela Revista da TV. A atriz, pontual, carrega a roupa que usará na foto num cabide, cumprimenta a equipe e se dirige ao banheiro. Lá, começa a se maquiar sozinha enquanto fala da emblemática personagem do autor, que encerra a saga da heroína imperfeita - iniciada em 1981, com Lilian Lemmertz, em Baila comigo - na novela Em Família, que estreia amanhã, às 21h, na Rede Globo/TV Bahia, com Julia Lemmertz, filha de Lilian, como a protagonista da vez.

"Fiz a filha da primeira Helena, vivida pela Lilian, uma experiência fortíssima", recorda Christiane: "As Helenas são anti-heroínas, um pouco da escola da Ivani Ribeiro, ela não é perfeita, romântica, boazinha. Elas pecam, o que dá uma característica de humanidade muito diferente de outros personagens", define. Christiane Torlone, Vera Fisher, Taís Araújo, Maitê Proença e Júlia Lemmertz: unidas por uma personagemChristiane, que também interpretou a sua Helena em Mulheres Apaixonadas (2003), revela a maneira peculiar do autor de se relacionar com seus atores. Conta ter sido presenteada por ele com livros de artes, flores e cartões escritos à caneta de pena.

"Você se sente a musa de alguém, isso é muito poético, né? Nos nossos dias, musa parece uma coisa tão boba, careta, banal e ele faz com que você se sinta especial. Me senti assim por perceber que ele já estava pensando em mim há tantos anos. Isso tem uma magia. E, sim, acho romântico. É como se fosse uma noiva, que ainda não está pronta para esse compromisso e você espera crescer, entendeu? Porque é um compromisso. Ser uma Helena é um prêmio! Fazer é um desafio", afirma Christiane.

A conversa é interrompida por Vera Fisher. A atriz surge de roupão na porta do banheiro para dar "oi". Tem ao seu lado um maquiador que a acompanha há mais de 20 anos. A conversa vira um encontro de comadres.

" Está magrinha, Chris, com as pernas finas", elogia Vera.

"Eu não, esses putos desses quilos vêm" responde Christiane, com humor.

Elogios à parte, Vera retorna ao tema da entrevista. E define Laços de Família" (2000) como uma novela "barra pesada", a mais bonita e de maior repercussão da sua carreira.

"Fiz a minha com mais vida, determinação e desespero. Adorei a viagem ao Japão (para gravar as cenas iniciais da trama), a gente trabalhava de manhã até à noite. Combinei com Gianecchini (Reynaldo) de fazer umas cenas bem picantes porque eles eram muito apaixonados. E o povo comentava: "Olha a língua". Se tem paixão, tem que ser para valer. Mas foi uma novela que também sofri muito. Porque segurar uma filha com câncer, né? Abrir mão do seu namorado para ela, é um sofrimento. Chorava muito nas cenas do hospital. Sou reconhecida até hoje por causa da novela. Em Miami, uma pessoa gritou na rua: "Helena", conta Vera.

Ela considera sua Helena a mais forte escrita por Maneco, como o autor é chamado entre amigos. Para justificar, a atriz cita o fato de a personagem ter tido que engravidar do primo (José Mayer) para ajudar a salvar a filha Camila (Carolina Dieckmann), que sofria de leucemia. Lembra ainda que após perder o marido, ela montou uma clínica sozinha e ainda sustentava os filhos.

"Helena teve três homens: os personagens do Gianecchini, do Zé Mayer e do Tony Ramos. Ela transava com os três e o povo aceitava porque tudo tinha um porquê. A novela tinha cenas grandes, boas de se fazer. Hoje em dia é tudo esquete", critica a atriz.

Quando Júlia Lemmertz chega ao quarto do hotel, a euforia entre as Helenas, incluindo Maitê Proença e Taís Araújo, é geral. "Você vai viajar para onde?", quer saber Vera. "Só para Jacarepaguá mesmo (onde estão os estúdios do Projac)", brinca a atriz, que não foi para Viena, na Áustria, onde foram gravadas cenas iniciais da trama da Globo com parte do elenco. Já com uma carga de gravações de mais de dez cenas por dia, Júlia Lemmertz afirma que a trama tem um significado especial para ela. Além de marcar sua estreia numa novela do autor, o folhetim é uma homenagem do autor à sua mãe, a primeira Helena do escritor.

"Eu e Maneco nos namoramos há algum tempo, existia desejo, vontade de trabalhar juntos, mas os tempos não se encaixavam. Agora, chegou o momento que ele queria realmente encerrar um ciclo. A ideia de fazer a última Helena, com uma ligação com a primeira, tinha todo sentido. Minha mãe e eu de alguma forma unidas ali, fazendo um link. É um trabalho cheio de significados, tão profundos. O Maneco fala que está escrevendo um texto muito pessoal para mim, tendo uma conexão profunda com a minha mãe. Foi o trabalho que ela mais gostou de fazer. Acho que é um ciclo, mas a gente nunca sabe, vai que ele resolve fazer uma outra última Helena", diz Júlia, que revela ter encontrado todos os capítulos de Baila Comigo, intactos na casa de Lilian Lemmertz, após sua morte, em 1986.

Segundo a atriz, sua Helena, que será vivida nas duas primeiras fases por Julia Dalavia e Bruna Marquezine, respectivamente, vai ser a soma de todas as personagens. "Ela é uma mulher de verdade, assim como as outras. Não é uma heroína que só tem atitudes certas. Ela se atrapalha, é injusta às vezes. É temperamental, guerreira, mas de vez em quando mete os pés pelas mãos em prol de defender um sentimento ou ideia, e acaba machucando outra pessoa. É uma pessoa com contrastes e contradições. Maneco tem uma sensibilidade, uma propriedade para falar de mulher e de questões que às vezes intimamente só você sabe. Por isso que os grandes diálogos femininos é ele que escreve. Ele gosta de escrever para mulher, entende a alma feminina".

Na nova novela, os já explorados conflitos familiares entre mãe e filha estarão presentes. Foi assim em História de Amor (1995) - com a relação conturbada entre Joyce (Carla Marins) e Helena (Regina Duarte) -, em Por Amor, com as brigas entre a personagens de Regina e Gabriela Duarte (Maria Eduarda). E ainda em Página da Vida, com a amargurada Marta (Lília Cabral), que atormentava a filha Nanda (Fernanda Vasconcellos).

"As desavenças vão ocorrer porque essa Helena esconde da filha um passado muito turbulento. Ela sofreu muito e ainda sofre calada por conta disso. E quando vê, o destino a bota cara a cara com o grande amor da sua vida. De repente, a filha, muito semelhante à Helena na juventude, conhece esse homem e se apaixona por ele", adianta Júlia.

Mais introspectiva, Taís Araújo, que carregou a responsabilidade de ser a primeira protagonista negra do horário nobre da Rede Globo, diz que Julinha, como a atriz é chamada na intimidade, irá carregar uma pedreira. Junto com as quebras de tabu com Viver a Vida (2009), Taís Araújo sofreu muitas críticas pela composição da personagem. E não foram poucas, segundo ela.

O trauma só foi superado com sessões de análise. Apesar de todo "sofrimento", a atriz afirma que aprendeu a lidar com isso e que faria tudo de novo.

" Fui espinafrada diariamente. Foi o meu personagem mais transformador, até pelas críticas. É impossível passar ileso por uma Helena, seja pelas críticas ou pelos diálogos maravilhosos do Maneco. A personagem transformou o meu olhar em relação à profissão", diz.

"Na época, pensei: essa minha maneira de atuar, que vinha desde a adolescência, não está mais funcionando. Vou ter que me renovar até ao escolher os personagens. Hoje quero fazer outros papéis, ser outro tipo de artista, produzir peças. Nas críticas, fui desrespeitada, tudo o que eu já tinha feito, minha história na TV ao longo de quase 20 anos de trabalho, foi ignorado", lembra.