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Publicado em 2 de novembro de 2024 às 07:32
Ok, o talento não é determinante para o sucesso profissional de alguém. Mas não há como negar a importância deste elemento, especialmente quando estamos falando da área artística. E existem casos que não deixam dúvida de que há gente predestinada, que parece ter mesmo vindo ao mundo com uma missão. Veja o caso do baiano Álvaro Assmar (1958-2017), por exemplo, mestre da guitarra e maior representante do blues revelado por aqui.
A história a seguir está na recém-lançada biografia Álvaro Assmar - Uma Vida Blues (lançamento independente/ R$ 100/ 344 págs), escrita pelo jornalista e crítico de cinema João Paulo Barreto. Aos oito anos, o então futuro música estava na festinha infantil da vizinha e viu uma guitarra elétrica por ali, sobrando. Com aquela idade, Álvaro praticamente brincava num violão. Mas viu a guitarra e ficou encantado. Os irmãos da vizinha, quase adultos, estavam tocando e o garoto não resistiu: pediu para usar o instrumento que via pela primeira vez.
Os vizinhos riram e, fazendo graça, deram um chega-pra-lá no menino. Inconformado, o pequeno Álvaro esperou um vacilo dos adultos e rapidamente se apossou da guitarra, que dava sopa ali. No livro, o músico diz que tomou aquilo como uma “ofensa mortal” e decidiu mostrar que não estava pra brincadeira. Sem sequer ter força suficiente pra segurar o instrumento, sentou-se na cama e aproveitou o tempo curto que teria para soltar o característico riff de guitarra de Day Tripper, dos Beatles. Embasbacados com o que ouviam, os vizinhos saíram correndo para ver quem era o hábil guitarrista. Nilton, o dono da guitarra, em vez de dar uma bronca, só conseguia repetir: “Ele sabe tocar! Ele sabe tocar!”
João Paulo diz que o livro surgiu naturalmente, depois de uma entrevista que fez com Álvaro, em 2016, para um texto que seria publicado no site Scream & Yell. A conversa levou uma hora e meia e o jornalista saiu convicto de que havia muita coisa para ouvir do guitarrista. “Apresentei a ele a ideia do livro, para sair quando Álvaro completasse 60 anos, em 2018. Daí, tivemos várias conversas, umas 40 horas”, lembra João. E Álvaro se abriu mais que o autor esperava: falou da relação com drogas; das dificuldades econômicas que passou na época do Plano Collor; dos problemas que tinha na Bahia para manter seu estilo numa época em que o axé reinava absoluto… e tudo isso está nas mais de 300 páginas da biografia. João Paulo também vai fundo na vida familiar de Álvaro e conta a história dos antepassados dele, imigrantes libaneses.
O autor também reuniu depoimentos de músicos que tocaram com Álvaro, como Carlini e André Christovam. Há ainda gente mais distante do universo do blues, como Carlinhos Brown e Margareth Menezes, além do crítico de música Régis Tadeu, que ficou impressionado com as habilidades do baiano num show que assistiu em São Paulo.
Régis, hoje conhecido por uma certa “rabugice” nos vídeos que faz no YouTube, é exigente, mas disse o seguinte a João, segundo o próprio jornalista: “Ele deu uma opinião muito forte. Foi ao show de Johnny Winter [um dos mestres do blues], que estava doente, e viu o show de abertura, com Carlini, Álvaro e André Christovam. Disse que a abertura foi melhor que o show principal!”.
Álvaro Assmar - Uma Vida Blues naturalmente vai interessar mais a quem já conhece o músico e deseja saber mais de sua vida. Mas, como toda boa biografia, o texto vai além da vida do biografado e fala sobre assuntos transversais. Neste caso, um dos assuntos mais interessantes é o rádio, com que Álvaro teve profunda ligação por ter sido apresentador de programas de blues.
Há momentos, é verdade, em que o texto se aprofunda demais em alguns temas, que poderiam ser mais breves, em um trabalho de edição mais rigoroso. Mas isso não chega a comprometer a leitura. E destaque-se o ótimo projeto gráfico, o papel de qualidade e a farta coleção de fotos que está livro.
SERVIÇO
Álvaro Assmar - Uma Vida Blues (lançamento independente/ R$ 100/ 344 págs). À venda pelo instagram de Eric Assmar (@ericassmar)
Podcast investiga desaparecimento de piloto de avião
Estreou nesta semana o podcast O Piloto, que já tem dois episódios disponíveis nas plataformas de áudio. A produção integra o Projeto Humanos, criado pelo jornalista, escritor e professor Ivan Mizanzuk. Desta vez, ele se debruça sobre a história de Ilo Rodrigues, ex-chefe da delegacia do Ministério da Agricultura em Foz do Iguaçu. Piloto nas horas vagas, ele desapareceu em dezembro de 1986, ano em que havia comprado um avião próprio. Na ocasião, tudo indica que ele iria para Curitiba passar o final do ano com o filho, mas o avião nunca chegou à capital. Até hoje, a família guarda uma caixa cheia de documentos e informações com variadas suspeitas sobre o caso. Mas o que aconteceu de fato com Ilo? Qual é a razão para ele nunca ter sido encontrado? Essas e outras questões são analisadas ao longo da série em áudio, que vai em busca de respostas para tantas lacunas acumuladas em quase 40 anos. No total, serão oito episódios. Mizanzuk é o responsável pelo podcast sobre o caso do desaparecimento do menino Evandro, que desapareceu em 1992 e até hoje não se tem notícia de seu paradeiro. A obsessão do jornalista pelo caso gerou uma excelente série documental, disponível no Globoplay.