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Jairo Costa Jr.
Publicado em 25 de dezembro de 2021 às 07:00
- Atualizado há 2 anos
A resistência do governo Jair Bolsonaro em vacinar crianças de 5 a 11 anos contra a covid-19, mesmo após a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovar o uso do imunizante da Pfizer para esta faixa etária, ficou ainda mais clara na manhã de sexta-feira (24). Três horas após o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, anunciar a abertura da consulta pública sobre o tema nas redes sociais, o primeiro formulário online para que os cidadãos pudessem opinar deixou de receber respostas.
Todos aqueles que preenchiam o questionário por completo se depararam com a seguinte mensagem: “O número máximo de pessoas já respondeu a este formulário”. Diante da repercussão negativa sobre as restrições numéricas, o ministério botou no ar um segundo formulário, gerenciado através de uma plataforma criada pela Microsoft para consultas públicas, com limite máximo de 50 mil acessos por documento.
Até o fechamento desta edição, o ministério ainda não havia comunicado publicamente os motivos que o levaram a optar por uma ferramenta com quantidade tão reduzida, considerando a relevância do tema. Também não respondeu por que deixou de utilizar a plataforma virtual criada pelo próprio governo para a realização de consulta públicas, a Participa + Brasil.
No momento, existem 22 delas ativas na plataforma do Palácio do Planalto sobre os mais variados assuntos, de questões ligadas a comércio exterior ao uso de equipamentos de proteção individual. Para apimentar a confusão, a edição do Jornal Nacional, da TV Globo, noticiou na quarta-feira que, um dia antes, o Ministério da Saúde havia realizado uma reunião sobre a consulta apenas com pessoas contrárias à vacinação de crianças contra a doença.
Turma do contra
A reportagem, baseada em informações divulgadas pelo site Metrópoles, revelou a presença de 15 integrantes do governo no encontro. Entre os quais, a secretária de Gestão do Trabalho, Mayra Pinheiro, que esteve em Manaus, em janeiro, no auge da crise da falta de oxigênio, para promover o TrateCov, aplicativo que receitava cloroquina, um dos medicamentos do chamado kit precoce, até para crianças.
A reunião atraiu a revolta da comunidade científica. A mais dura crítica veio do presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações, Renato Kfouri. “Causa estranheza o Ministério da Saúde receber médicos ou consultores que são contrários à vacinação, que propagam notícias falsas e, por vezes, até recomendam tratamentos não confirmados ou não efetivos contra a covid-19”, disparou Kfouri.
No mesmo diapasão, a vice-presidente da entidade, Isabela Ballalai, elevou o tom contra a medida adotada pelo governo para discutir a imunização do grupo dos 5 aos 11 anos. “É difícil entender o motivo de uma consulta pública em relação à vacinação de crianças, já que nenhuma vacina em toda a nossa história passou por isso antes de ser adotada pelo Programa Nacional de Imunizações. Não é a primeira vez que a gente vê uma ação como essa. Quando iniciamos a vacinação de adolescentes, o próprio Ministério da Saúde, em determinado momento, se colocou contra e depois voltou atrás, passando a vacinar também esse grupo”, destacou.
Posição questionada
Ainda na quarta-feira, o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE), a deputada federal Tabata Amaral (PSB-SP) e o secretário de Educação do Rio de Janeiro, Renan Carneiro, apresentaram notícia-crime no Supremo Tribunal Federal contra o presidente Jair Bolsonaro e o ministro da Saúde por prevaricação. No pedido, o trio alegou que o governo atua de forma intencional para atrasar a inclusão das crianças no programa de vacinação.
Cerca de 24 horas depois, Marcelo Queiroga alimentou novamente a polêmica ao declarar que a vacina para crianças não era emergência. “Os óbitos de crianças estão absolutamente dentro de um patamar que não implica decisões emergenciais. Ou seja, isso favorece que o ministério possa tomar uma decisão baseada na evidência científica de qualidade, na questão da segurança, eficácia e efetividade”, afirmou o ministro.
Como os números mostram, não é bem assim que a banda do coronavírus toca. Embora essa faixa etária apresente casos mais leves da doença, em comparação com adultos, isso não significa que elas não adoeçam ou morram.
Dados do boletim epidemiológico do ministério da Saúde mostram que o Brasil registrou, desde o início da pandemia até o fim do mês passado, 1.492 óbitos de crianças e adolescentes em decorrência da covid. É número mais que suficiente para acabar com qualquer confusão e resistência.
Fiocruz indica que 80% dos pais querem vacinar filhos
Resultados preliminares de uma pesquisa da Fundação Osvaldo Cruz (Fiocruz), divulgados na sexta-feira pela CNN Brasil, apontam que mais de 80% dos pais querem vacinar os filhos contra a covid.
O estudo da Fiocruz se baseia em cerca de 15 mil formulários colhidos em consulta aberta na internet, com objetivo de medir o interesse na imunização infantil.
De acordo com a CNN, entre os que se mostram reticentes à vacina para esse grupo, o maior índice, 16%, foi observado entre os pais de crianças de 0 a 4 anos, faixa que ainda não tem a vacina aprovada.
No recorte dos pais com filhos entre 5 e 11 anos, a taxa de hesitação é de 12%. O índice vai a 14% entre os responsáveis por adolescentes acima dos 12 anos, que já têm imunização autorizada.
Enquanto a vacina para crianças avança gradualmente no mundo, sobretudo nas nações desenvolvidas, o Brasil anda na contramão. Hoje, há pelo menos 22 países que adotam a medida.
Na lista, estão Estados Unidos, Alemanha, Dinamarca, Espanha, Grécia, Hungria, Itália, Portugal, França, Áustria, Canadá, Chile, China, Argentina, Israel e Cuba.