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Elis Freire
Publicado em 22 de março de 2025 às 07:00
Até onde é normal não conseguir se enxergar sem uma outra pessoa? O ser humano sempre precisou manter relações para se sentir bem e depende dos outros para se nutrir de afeto, carinho e atenção. Porém, psicólogos têm alertado para um tipo de vínculo que gera muito sofrimento, podendo culminar em uma dependência emocional e em ciclos de manipulação: o apego tóxico. Muito citado nas redes sociais ao falar sobre relacionamento amorosos, existem explicações por trás desse apego incondicional, que podem remontar a feridas emocionais de infância. >
A psicóloga Luana Machado, especialista em Terapia Cognitiva Comportamental, deixa claro de início que nem todo apego é negativo. “É claro que a gente reconhece que há um apego que não é saudável, mas é importante reconhecer que o apego é natural. Às vezes, as pessoas têm medo da dependência emocional e vão para outro extremo: não ter nenhum vínculo. Precisamos dos outros pra ter apoio, segurança emocional. O apego de uma maneira saudável, sem anular as próprias necessidades, é importante”, ressalta a especialista.>
O apego é uma necessidade básica, segundo diversas abordagens da Psicologia e da Psicanálise. De acordo com Elias Fernandes, doutorando em Psicologia e conselheiro do XVII plenário do Conselho Regional de Psicologia da Bahia, o apego tóxico pode estar ligado justamente ao não suprimento dessa necessidade durante a infância. >
“Todos nós desde a infância precisamos do apego, principalmente nas nossas relações familiares. Quando essa necessidade não é suprida na infância, ou até mesmo houve violência ou negligência, pode ser que a gente sinta mais para frente uma falta maior disso. Assim, na idade adulta tem se a necessidade de uma figura que pode se tornar uma pessoa abusiva”, explica o psicólogo. >
“O apego tóxico ou disfuncional é aquele que é exagerado, em que a gente busca suprir em uma relação uma necessidade que não foi suprida na infância. Aí a gente tem uma relação de dependência, de violência e as pessoas suportam essas violências para manter esse apego, sendo que a pessoa que está ali constantemente sendo violentada”, caracteriza Elias.>
Tanto para Luana quanto para Elias, existem alguns sinais que podem ser observados para saber se você nutre uma apego tóxico por alguém, seja em uma relação amorosa, seja com um amigo, pet, ou ente querido. São alguns eles:>
1. Dificuldade de tomar decisões sem aprovação do outro>
2. Sensação de que a minha felicidade depende dessa relação>
3. Tolerância extrema a abusos>
4. Angústia quando a pessoa está longe>
5. Ciúmes exacerbado>
6. Perda de individualidade>
7. Perda da personalidade>
8. Medo irracional do abandono>
Como explica a psicóloga, o apego tóxico pode se tornar uma dependência emocional, muito mais complexa de ser superada. Comparando um estado febril a uma febre, Luana alerta que esse tipo de vínculo, considerado disfuncional, pode gerar uma anulação total da individualidade da pessoa. >
“O apego se torna um pouco maior quando a minha individualidade depende do outro, eu acho que minha vida não tem sentido, seria um apego ainda mais disfuncional gerando uma dependência. Na dependência emocional a pessoa se anula mesmo” afirma a profissional.>
“Esse apego pode ser problemático porque muitas vezes o apego ´tóxico começa aos poucos, vai crescendo e pessoa se anula dentro da relação e acaba vivendo em torno dessa outra pessoa e suportando coisas que não deveria suportar” completa Elias.>
Os profissionais destacam ainda que muitas vezes esse vínculo ocorre entre uma pessoa mais permissiva e outra com possíveis traços narcisistas, borderline ou manipulador. O apego, porém, nem sempre está relacionado com características da outra pessoa em que se relaciona. >
“Às vezes a fome e a vontade de comer se unem. Pessoas que têm perfil manipulador, borderline ou traço narcisista às vezes se envolvem com pessoas mais permissivas, dependentes emocionais, passivas, criando um molde relacional adoecido. As pessoas com apego tóxico tendem a aceitar a dinâmica de manipulação do outro e essas pessoas com transtorno costumam reafirmar o desvalor dela. Esse ciclo vai se realimentando com submissão e invalidação”, alerta Luana. >
Algumas estratégias são importantes no processo de livrar-se de um vínculo que não é saudável. Os dois profissionais ressaltam a importância de se buscar ajuda psicológica e terapia, já que cada caso possui suas particularidades e complexidades.>
Os psicológicos também destacam a importância do autoconhecimento e da busca por sua identidade própria. >
“Comece pelo caminho de olhar para si, de buscar autoconhecimento para se manter longe do apego tóxico. Falar é fácil mas na prática é difícil pq as vezes o adulto carrega uma adolescente muito ferida. A pessoa aprendeu que para receber amor tem que me anular e ela não consegue se enxergar além da relação”, pondera Luana.>
Algumas dicas foram apontadas para que a pessoa consiga se desfazer desse tão sofrido nó emocional. “Cuidar da sua individualidade, quais são seus projetos, seus hobby,cuidar das inseguranças, fazer terapia. Aprender a colocar limites também é importante”, aponta a especialista.>
“A principal questão que pode ser feita é procurar terapia para romper esses vínculos e poder seguir a sua vida. Não são questões simples, mas a busca pela identidade e autoconhecimento também podem ajudar que a pessoa tenha uma vida saudável”, destaca Elias.>