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Alô Alô Bahia
Publicado em 23 de março de 2025 às 15:50
Da janela de casa, no Centro de Salvador, Joana Zeferino da Paz gostava de admirar o pôr-do-sol. Anos antes, da janela de um apartamento em Copacabana, no Rio de Janeiro, a vista era diferente. De lá, ela observou, gravou e denunciou crimes de narcotráfico, fato que a fez entrar no Programa de Proteção à Testemunha, trocar o nome para Vitória e deixar o estado para viver na Bahia. >
Interpretada por Fernanda Montenegro no filme “Vitória”, produção original Globoplay que estreou nos cinemas de todo o Brasil nesta semana, Joana viveu durante 17 anos na capital baiana, onde morreu em agosto de 2023. As informações são do portal G1. >
Ela faleceu aos 97 anos e o corpo foi enterrado no Cemitério Campo Santo, no bairro da Federação, com os “dois nomes”: Joana Zeferino da Paz “Dona Vitória”. No epitáfio há uma justa homenagem para “a heroína por trás da câmera que ajudou a história de um bairro e marcou o país”.>
Teoricamente, por questões de segurança, até a data da morte ninguém deveria saber a verdadeira identidade de “Dona Vitória”. No entanto, não gostava de ser chamada desse modo e fazia questão de manter vivo o nome de batismo, segundo pessoas que conviveram com ela na Bahia.>
No prédio onde residia em Salvador, alguns vizinhos a chamavam carinhosamente de “Jojô” e ouviam, com a atenção, a história da mulher que conseguiu ajudar a colocar na cadeia mais de 30 pessoas, entre traficantes e policiais. Com registros feitos através de uma câmera VHS, ela flagrou atividades ilícitas na Ladeira dos Tabajaras, favela em Copacabana, na zona sul do Rio de Janeiro.>
Um dos antigos vizinhos dela em Salvador é Paulo Bevilacqua, que conheceu Joana em 2017, quando se mudou para o mesmo prédio onde ela morava há mais de uma década. Ele percebeu que a idosa, na época com 90 anos, vivia sozinha e precisava de ajuda com alguns serviços domésticos.>
A partir de um gesto de solidariedade, surgiu uma amizade que depois virou família. O laço foi tão forte que, quando Paulo se tornou pai, colocou o nome da filha de Joana.>
“Comecei a ajudar comprando as coisinhas dela na rua, carregando compras e desenvolvi muito carinho pela pessoa que ela era. Na realidade, Dona Joana foi a mãe que eu não tive. E ela me chamava de meu filho, chamava de anjo”, contou.>
Paulo descreve Joana como uma mulher alto-astral, lúcida e carinhosa. Apesar da infância marcada por pobreza e abusos na pequena cidade de Quebrângulo, no agreste de Alagoas, ela superou as adversidades e reconstruiu a vida na cidade do Rio de Janeiro, onde se especializou como massoterapeuta e comprou o tão sonhado apartamento em Copacabana.>
A mudança forçada para a Bahia, em 2006, foi consequência da denúncia. Devido aos riscos à própria vida, já que do imóvel onde ela filmou os crimes ocorridos na Ladeira dos Tabajaras era possível identificá-la, Joana entrou para o Programa de Proteção à Testemunha do governo do Rio de Janeiro e foi obrigada a deixar a moradia, onde residiu durante 36 anos.>
A esteticista Danielle Gomes, ex-companheira de Paulo e também amiga de Joana, contou que apesar de gostar de Salvador, Joana falava com tristeza sobre a saída do apartamento na Praça Vereador Rocha Leão.“Ela falava muito do Rio e falava que tinha ficado triste em ter que sair de lá daquela forma, tudo tão rápido”, contou.>
Sobre o filme>
“Vitória”, inspirado no livro “Dona Vitória da Paz”, do jornalista Fábio Gusmão, é ambientada no Rio de Janeiro e acompanha a história de uma mulher que ficou conhecida por registrar, aos 80 anos, ações criminosas em sua comunidade, contribuindo para a prisão de dezenas de traficantes e policiais corruptos. A produção é dirigida por Breno Silveira e Andrucha Waddington.>