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Heider Sacramento
Publicado em 6 de fevereiro de 2025 às 05:30
Desde que a música “Caranguejo” de Claudia Leitte reinterpreta Iemanjá como Yeshua, o mundo do axé se vê imerso em intensos debates sobre o apagamento das religiões de matriz africana. A polêmica, que ganhou destaque nas redes sociais e na opinião pública, ocorre em um momento simbólico para o gênero, que celebra 40 anos de história em 2025. A cantora Claudia Leitte se tornou o epicentro dessa controvérsia, gerando manifestações tanto favoráveis quanto críticas entre outros artistas do axé. >
O caso desencadeou uma investigação do Ministério Público da Bahia (MP-BA) por racismo religioso, após uma denúncia da yalorixá Jaciara Ribeiro, líder do Ilê Axé Abassa de Ogum. Também foi aberto um inquérito pelo Instituto de Defesa dos Direitos das Religiões Afro-Brasileiras (Idafro). Além disso, uma audiência pública foi convocada para discutir a situação, que rapidamente ganhou proporções significativas e gerou um racha entre artistas do gênero.>
A polêmica teve início quando o ex-secretário de Cultura de Salvador, Pedro Tourinho, fez uma declaração pública sobre artistas que constantemente se inspiram nas raízes africanas, mas não as respeitam. Embora não tenha citado nomes, o comentário foi apoiado por grandes nomes do axé, como Ivete Sangalo, que endossou a opinião de Tourinho, gerando especulações de que a declaração seria uma indireta para Claudia Leitte.>
Dias depois, Ivete esteve no especial de verão do programa Sem Censura, da TV Brasil, e, em meio às discussões sobre a polêmica, fez um pronunciamento importante. Vale ressaltar que, até aquele momento, Claudia Leitte já havia bloqueado Ivete nas redes sociais e, segundo o ex-empresário de Ivete, atualmente responsável pela carreira de Leitte, a relação entre as duas estava bastante conturbada.>
No programa, apresentado por Cissa Guimarães, Ivete reforçou as palavras de Maíra Azevedo, a Tia Má, em defesa das religiões de matriz africana. “A gente precisa falar dos terreiros de candomblé, porque se existe Axé Music, que surgiu para ser depreciado, é por causa do axé, que para a gente significa força vital”, declarou a influenciadora. Ela também destacou a importância dos percussionistas, que trouxeram o ritmo das cerimônias religiosas para os palcos: “Os maiores percussionistas saíam depois de tocar o ‘rum’, o ‘pi’ e o ‘lé’, clamando os nossos deuses na terra”.>
Em seguida, a cantora ressaltou a relevância da autenticidade dentro do Axé Music, afirmando que o gênero não deveria ser tratado de maneira superficial. “Não precisa emoldurar não. Todo mundo sabe, mas se faz de maluco”, comentou, ressaltando que sua trajetória sempre foi marcada pela proximidade com suas raízes. “Eu aprendi que quanto mais genuína eu fosse, isso seria bom para mim. Eu não teria que viver um personagem e nem correr entre vacilos e erros. Vou poder ser e fluir”, declarou Ivete.>
A defesa de Tatau>
A poucos dias do Carnaval, o cantor Tatau resolveu sair em defesa de Claudia Leitte, destacando a importância da cantora para o crescimento e a consolidação do axé no Brasil. “Acho que você foi uma das últimas a contribuir de forma decisiva para os 40 anos do axé. Temos que ter muito cuidado, porque o carnaval está na porta. Tem coisas que são desnecessárias, temos coisas maiores para fazer”, afirmou ele.>
Durante um registro feito pelos fãs no Ensaio do Tatau, onde o cantor recebeu a carioca, Tatau ofereceu palavras de apoio à artista diante das polêmicas. “O carnaval é maior que Tatau, Claudinha, Bell e Ivete. É maior que todos nós. Eu vou passar, todo mundo vai passar, e o carnaval vai continuar aí. Esfrie sua cabeça, que está tudo certo”, finalizou Tatau.>
Iemanjá ou Yeshua?>
Durante os eventos de verão, onde a imprensa marcou presença, uma pergunta ecoava entre os grandes nomes do Axé: qual é a sua opinião sobre a troca do nome Iemanjá por Yeshua? Muitos se pronunciaram, outros preferiram o silêncio. Em meio à celebração dos 40 anos de carreira e da história do Axé Music, Daniela Mercury abordou a polêmica, destacando que falava por si mesma, e defendeu as músicas que celebram os orixás, divindades das religiões de matriz africana.>
“Eu sou apaixonada desde criança pelos orixás, como cultura da minha cidade. Então, eu canto eles mais que todo mundo aqui. Eu procuro músicas com orixás para cantar”, afirmou Daniela.>
Ao contrário da rainha do axé, Carlinhos Brown optou por manter a neutralidade e evitar polêmicas sobre o tema. "Essa ideia de que Jesus não está próximo de nós é equivocada. Claro que Ele está. Seguimos os caminhos de Cristo. Em todo terreiro, você encontra uma imagem do Sagrado Coração de Jesus. Então, não vamos nos envolver com aqueles que tentam destruir isso ou acreditar que nossa dor é única. Nós somos a vitória, nossa dor já foi superada há muito tempo", declarou o cantor.>
O que dizem os compositores da música?>
Em entrevista ao CORREIO, o advogado Paulo Almeida, que representa André Ricardo, conhecido artisticamente como Nino Balla, e Durval Luz, afirmou que os ex-compositores de Claudia Leitte estão firmemente decididos a levar o caso até o fim.>
"No momento em que os direitos autorais deles foram violados, é claro que eles devem ser ressarcidos pelo dano causado à música. Não se trata apenas da questão religiosa, mas também do direito deles. Quando ela fez a alteração, houve plágio, e acreditamos que a indenização será significativa", destacou o advogado.>
Claudia Leitte pode pagar R$ 10 milhões após o processo movido pelos compositores da música e líderes afro-religiosos.>
Outros Casos>
Essa não é a primeira vez que uma polêmica religiosa abala o universo do axé. Claudia Leitte não foi a única artista a alterar a letra de "Caranguejo" devido a questões religiosas. Outros nomes do gênero também já fizeram mudanças semelhantes.>
A cantora Mari Antunes, atual vocalista da banda Babado Novo, durante participação no programa Fuzuê da Rede Bahia, afirmou ao CORREIO que não troca "Iemanjá" por "Yeshua", como fez a antiga vocalista do grupo.>
No entanto, um vídeo que circula nas redes sociais revela uma apresentação de Mari Antunes no SBT Folia de 2022, onde ela, de forma similar a Claudia, substitui "Iemanjá" por "Yeshua". Em determinado momento, a cantora afasta o microfone, disfarçando a alteração na letra, tornando-a menos perceptível ao público.>