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Da Redação
Publicado em 10 de março de 2020 às 22:54
- Atualizado há 2 anos
Se a cura da aids, em algum momento, pareceu algo inalcançável, essa perspectiva está cada vez menos distante. Isso porque um paciente portador do HIV que foi submetido a um transplante de células-tronco está curado, tornando-se o segundo no mundo a se recuperar da síndrome. O anúncio foi feito nesta terça-feira (10) pelos médicos do venezuelano Adam Castillejo, 40 anos, que ficou conhecido como "paciente de Londres".
A boa notícia vem quase 10 anos após o primeiro caso confirmado de um paciente com HIV que conseguiu se livrar do vírus. O paciente não apresenta os sinais do vírus há 30 meses, segundo os resultados publicados na revista The Lancet HIV.
Em março do ano passado, o professor Ravindra Gupta, da Universidade de Cambridge, anunciou que o homem diagnosticado soropositivo em 2003 estava em remissão, não mostrando sinais do vírus havia um ano e meio. O médico pediu cautela, porém, e insistiu no termo remissão – e não cura –, pedindo mais tempo. No entanto, um ano depois, sua equipe deu esse passo para confirmar o novo status.
"Sugerimos que nossos resultados representam uma cura do HIV", escrevem os médicos, depois de testarem amostras de sangue, tecido e esperma.
Transplante de medula Assim como o "paciente de Berlim", o americano Timothy Ray Brown considerado curado em 2011, esse "paciente de Londres" foi submetido a um transplante de medula óssea para tratar um câncer sanguíneo e, assim, recebeu células-tronco de doadores portadores de uma mutação genética rara que impede o HIV de se estabelecer, o CCR5.
O fato de a cura do paciente de Berlim ter permanecido única por mais de 10 anos sugeriu a alguns que era apenas um golpe de sorte. "Nossas descobertas mostram que o sucesso do transplante de células-tronco como tratamento para o HIV, relatado pela primeira vez há nove anos para o paciente de Berlim, pode ser replicado", afirmam os pesquisadores, segundo a agência AFP. Eles agora esperam obter outros casos de sucesso.
Quem é ele Embora os médicos não pudessem, por questão ética, revelar o nome do paciente, ele mesmo decidiu revelar sua identidade esta semana, em uma entrevista ao jornal The New York Times. "Quero ser um embaixador da esperança", afirmou Adam Castillejo, que cresceu em Caracas, na Venezuela. Foto: Reprodução/Facebook “Lembro-me de quando a pessoa me contou e o pânico começou”, relembrou ele, sobre o dia em que ficou sabendo que estava com a síndrome, em 2003.
Na época, o diagnóstico era uma espécie de sentença de morte, e ele tinha apenas 23 anos. “Foi uma experiência muito aterrorizante e traumática”.
Após receber a notícia, Adam transformou a paixão pela culinária em emprego como chef. Com isso, adotou um estilo de vida mais saudável. Comia bem e se exercitava frequentemente, andando de bicicleta, correndo e nadando.
Porém, em 2011, veio o segundo golpe. Após uma série de exames, descobriu que tinha um linfoma avançado.“Nunca esquecerei minha reação, pois mais uma vez meu mundo mudou para sempre. Mais uma vez, outra sentença de morte”, contou ele ao NYT.Os anos de quimioterapia seguiram, e o HIV complicava ainda mais o tratamento. Sempre que os oncologistas ajustavam seu tratamento para o câncer, os medicamentos para o HIV precisavam ser recalibrados.
Há poucas informações para tratar pacientes com as duas doenças, o que dificultava ainda mais os tratamentos.
O fim de 2014 foi particularmente difícil para Adam e sua família. Duas semanas antes do Natal, ele sumiu e todos imaginaram o pior. Quatro dias depois, foi encontrado fora da cidade sem lembranças de como chegou no lugar e o que fez, tempo em que afirma ter “desligado”.
Pensou em eutanásia Na mesma época, pensou em procurar uma empresa suíça de eutanásia para pessoas com doenças terminais.
Em 2015, seus médicos afirmaram que ele não viveria até o Natal. O transplante de medula foi inicialmente descartado pela falta de experiência de seus médicos para isso, principalmente em um paciente com HIV.
Junto com um amigo, descobriu um hospital em Londres (por isso "paciente de Londres") com especialistas em transplantes de medula para o tratamento de câncer, inclusive em pessoas com HIV.
Após falhar no uso de suas próprias células-tronco, o especialista afirmou que sua origem latina poderia complicar a busca por um doador.
Para a surpresa de todos, Adam rapidamente encontrou vários candidatos, inclusive um alemão, possivelmente por conta do seu pai, meio holandês, com uma mutação crucial, chamada "Delta 32", que dificulta a infecção pelo HIV.
O paciente se recorda do momento em que recebeu a ligação. Durante o outono de 2015, enquanto ia a um check-up com seu clínico geral no convés superior do tradicional ônibus vermelho de dois andares. Em um momento a notícia é de que ele não chegaria ao Natal e, no instante seguinte, ele poderia ser curado tanto do câncer quanto do HIV.“Depois dessa ligação, eu tinha um grande sorriso no rosto”, relembra.A possibilidade da cura do HIV imediatamente garantiu uma importância intensa. O Dr. Edwards, que cuidava de Adam desde 2012, afirmou que seria um privilégio passar de nenhuma terapia para uma cura completa.
“Então você precisa melhorar. Sem pressão”, lembrou ter dito ao paciente.
O médico procurou um antigo colega, Dr. Grupta, que estava totalmente cético, já que a abordagem funcionou apenas uma vez antes, com Brown (o primeiro curado do HIV).
O tratamento iniciou com uma carga de medicamentos anti-retrovirais para suprimir o vírus a níveis indetectáveis. Porém, quando Adam estava se preparando para receber o transplante, mais um revés. O vírus do HIV se mostrou resistente aos medicamentos.
Porém, foi este fato que deu ao Dr. Gupta a confirmação de que o transplante poderia eliminar o vírus. Após alguns meses de espera, Adam recebeu o transplante em 13 de maio de 2016.
No ano seguinte, ele passou meses no hospital, chegou a perder quase 70 kg, contraiu várias infecções e passou por diversas outras operações.
“Um dos médicos veio até mim e disse: você deve ser muito especial, porque eu tenho mais de 40 médicos e clínicos discutindo sua medicação”, contou ao NYT.
Logo depois de sair do hospital, o único exercício autorizado a fazer foi caminhar. Um ano depois, quando ficou mais forte, lentamente começou a abandonar os medicamentos para o HIV.
Em outubro de 2017, tomou o último conjunto de medicamentos anto-retrovirais. Dezessete meses depois, em março de 2019, o Dr. Grupta anunciou a notícia da cura. Depois disso, Castillejo fez diversos cursos para ajudar os médicos a entender as doenças. Até agora, seu corpo só apresentou os chamados “fósseis”, uma memória biológica de longo prazo.
“Pode ser muito importante que as pessoas tenham esse sinal de esperança. Ao mesmo tempo, é muito pesado para alguém carregar”, afirmou o diretor do Grupo de Ação para Tratamento, Jeffrys. Os amigos de Adam possuem a mesma preocupação. Porém, ele acredita que está pronto, e planeja manter sua vida privada.
Adam afirma que continuará a ser testado regularmente para monitorar um possível reaparecimento do vírus.
Quase 38 milhões de pessoas vivem com HIV em todo mundo, mas apenas 62% recebem terapia tripla. Quase 800 mil pessoas morreram em 2018 por doenças relacionadas à aids.
O surgimento de formas de HIV resistentes a medicamentos também é uma preocupação crescente. Com informações da AFP e The New York Times.