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Estadão
Publicado em 7 de março de 2024 às 20:52
O setor de supermercados vai propor que a composição da nova cesta básica nacional, com imposto zero, tenha foco em uma "alimentação saudável e nutricionalmente adequada". Para o segmento, a cesta não pode ser vista como "cesta mínima", mas sim ter uma gama diversificada de produtos.
Na minuta, que será apresentada ao grupo de trabalho responsável pela regulamentação da cesta, a Associação Brasileira de Supermercados (Abras) sugere 17 categorias de alimentos, incluindo carnes, ovos, laticínios, frutas, legumes, vegetais, farinhas e massas alimentícias. Dentro de cada categoria, será sugerida uma gama de itens.
A reforma tributária, promulgada no final do ano passado, criou a chamada cesta básica nacional, 100% isenta de tributos federais. Porém, os itens que irão compor a lista ficaram pendentes para definição na fase de regulamentação - o que tem provocado uma disputa entre setores e entidades empresariais nos bastidores do Congresso Nacional, como mostrou o Estadão. O setor do agronegócio, por exemplo, já apresentou a sua proposta, com mais de 40 itens.
O texto da reforma tributária estabelece que a nova cesta básica nacional "considerará a diversidade regional e cultural da alimentação do país e garantirá a alimentação saudável e nutricionalmente adequada".
João Galassi, presidente da Abras, reforça a necessidade de criar uma cesta diversificada, com itens que contemplem os principais grupos nutricionais. "A cesta básica nacional não é, nem pode jamais vir a ser definida como uma cesta mínima, como mera recomposição energética de um trabalhador, mas como a expressão da satisfação de qualquer cidadão, suficientemente rica e diversificada para um país que se apresenta como celeiro do mundo", afirma.
A associação também destaca a necessidade de atender as diversidades regionais e sugere itens como farinha de mandioca e tapioca, açaí, erva-mate e pamonha.
Em novembro do ano passado, a Abras sugeriu uma cesta básica com 25 itens. Durante a primeira votação na Câmara, a associação havia proposto uma lista maior, com 38 produtos, que contemplava higiene e limpeza - mas essas categorias agora foram incluídas na alíquota reduzida do Imposto sobre Valor Agregado (IVA), com desconto de 60%.
O foco saudável vai ao encontro de um decreto editado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva nesta terça, 6, que instituiu uma cesta básica de alimentos saudáveis no País. Foram definidas dez categorias: feijões (leguminosas), cereais, raízes e tubérculos, legumes e verduras, frutas, castanhas e nozes (oleaginosas); carnes e ovos; leites e queijos; açúcares, sal, óleos e gorduras; e café, chá, mate e especiarias.
O decreto afirma que a adaptação da nova cesta "para ações, políticas e programas de natureza tributária, inclusive a devolução de tributos às pessoas físicas, deverá considerar seu impacto fiscal e distributivo, com vistas a ampliar a progressividade das políticas públicas e a reduzir as desigualdades de renda".
Porém, conforme apurou o Estadão, o decreto não foi bem recebido por interlocutores por ter sido visto como uma forma de atravessar o trabalho da regulamentação, ainda em curso, sobre a definição dos itens da cesta, bem como por dar margem a uma possível taxação de produtos ultraprocessado.
Depois de definida pelo grupo de trabalho, a lista terá de passar pela Comissão de Sistematização - responsável por coordenar os grupos, com representantes de União, Estados e municípios - e, claro, pelo aval político do governo.
A proposta da Abras defende ainda que "alimentos com alguma ressalva nutricional por sofrerem adição de gorduras, sódio, álcool ou outra modificação química" - e que, portanto, não entrarem na cesta básica isenta - devem ser enquadrados na alíquota reduzida, com desconto de 60% sobre o Imposto de Valor Agregado.
Pelo texto da reforma tributária, os "alimentos destinados ao consumo humano" estão sujeitos à alíquota reduzida - os da cesta básica nacional, porém, terão imposto zero. O tema é sensível, porém, porque há um movimento para que os ultraprocessados sejam taxados pelo imposto seletivo, conhecido como "imposto do pecado", que vai incidir sobre os produtos danosos à saúde e ao meio ambiente.
A Abras, porém, argumenta que a diferença entre a alíquota zero e a alíquota reduzida (com desconto de 60%), dado o alto patamar do IVA, já será suficiente para estimular o maior consumo dos produtos da cesta isenta em detrimento de outros, "dispensando-se em absoluto a opção por acrescer, sobre estes últimos, um oneroso imposto seletivo".
"A conclusão nos parece clara: o legislador não precisa lançar mão de nenhum 'imposto seletivo' para taxar de modo ainda mais duro o que já será fortemente tributado com a alíquota de IVA mais elevada do planeta", diz o texto da associação.
Na tramitação da reforma tributária, os senadores alteraram a proposta que veio da Câmara dos Deputados e propuseram duas cestas básicas. Uma com o IVA zerado, mais simplificada, e outra chamada de estendida, que teria um desconto de 60% em relação à alíquota padrão do IVA.
Num ajuste de última hora, no entanto, quando o texto voltou para a Câmara para a votação final, foi mantida apenas a proposta de uma cesta básica nacional, totalmente isenta.
A desoneração da cesta básica foi um dos pontos sensíveis da reforma. Hoje, os produtos da cesta são desonerados 100% do PIS/Cofins, tributos sobre consumo cobrados pelo governo federal. Mas, nos Estados, há alíquotas diversas e as cestas contemplam itens extremamente diversos, como capacete e pão de queijo.
A preocupação do governo com a regulamentação da nova cesta básica nacional, portanto, é evitar excessos e uma lista muito grande de produtos - o que vai exigir ampla negociação política.