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Carmen Vasconcelos
Publicado em 3 de dezembro de 2018 às 05:49
- Atualizado há 2 anos
Pessoas que estão fora do mercado formal de emprego por mais de dois anos costumam desistir de procurar trabalho no mercado. A vergonha do desemprego, a autoestima abalada e as dificuldades de reinserção terminam por abalar a saúde emocional, gerando um desânimo. Elas acabam entrando nas estatísticas como desalentadas, que são justamente homens e mulheres com idade para trabalhar que saem do mercado de trabalho por não mais procurarem emprego. Não são nem empregados nem desempregados ou trabalhadores por conta própria.
De acordo com os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o contingente de desalentados, no segundo trimestre de 2018, chegou a 4,8 milhões de pessoas com 14 anos ou mais. Eram 4,6 milhões no trimestre anterior e 4 milhões no 2º trimestre de 2017. O contigente atual de desalentados é o maior da série histórica da Pnad Contínua, que começou a ser realizada em 2012. O cenário é sombrio, mas existe saída. Se abalar com a situação é o pior que pode acontecer com o trabalhador.
De acordo com a vice-presidente da Associação Brasileira de Recursos Humanos, Margot Azevedo, a população é educada apenas para o chamado trabalho de carteira assinada, mas as relações de trabalho mudaram com a crise econômica e com as mudanças das últimas décadas.
“O volume de empregos perdidos não será recuperado, mas é preciso que se diga que muitas pessoas que perderam o vínculo celetista (emprego com carteira) encontraram outras formas de trabalho e renda, seja por via do empreendedorismo, do cooperativismo e até mesmo das startups que deixaram de ser vistas como iniciativas de universitários e estão sendo desenvolvidas até por maiores de 70 anos”, comenta.
Sem vergonhas
Para Margot, o importante é que o indivíduo não encare o momento como um demérito, mas como uma contingência de mercado. “Não há porque se envergonhar. O importante é ter uma meta, seja ela qual for; não se paralisar e se abrir para o novo”, diz, salientando que pensamentos do tipo ‘era gerente e só posso trabalhar novamente como gerente’ precisam ser abandonados. “Tem de continuar no mercado, sendo visto, produzindo, se atualizando e em movimento”, ensina.
Para ela, embora a questão emocional seja a mais delicada, é fundamental que a pessoa faça uma autoanálise e descubra onde estão os erros que o levaram à demissão para consertá-los. “Se há uma ideia de empreendimento, é importante que a pessoa a coloque logo em prática, que erre e conserte rapidamente para que a vida entre numa dinâmica positiva”, diz.
Autoestima
Com uma postura parecida, o psicólogo e diretor técnico da Clínica Holiste Uellington Pereira afirma que é fundamental enfrentar a situação de frente, buscando analisar friamente os fatos. “Ficar por meses ruminando o luto da demissão não mudará o fato de que ela já aconteceu e que, quanto mais tempo o indivíduo ficar parado, mais dificuldade ele terá para ser reinserido no mercado”, completa.
Pereira diz que, embora essas situações impactem de modo muito negativo a autoestima do indivíduo, é preciso vencer a insegurança e o medo do novo. “Peça um feedback sobre as razões dos desligamentos para ter uma noção do que precisa ser modificado e para evitar que a pessoa se perca em fantasias”, completa.
Ele sugere que se coloque num papel os pontos positivos e negativos e, a partir daí, passe a investir na mellhora dos aspectos negativos.
Margot ensina que esse não é o momento de se manter desatualizado ou escondido. Para tanto, não precisa investir em nova graduação ou pós-graduação, mas cursos, discussões, palestras e eventos gratuitos são boas alternativas de ganhar novos ânimos.
“Existem muitos cursos gratuitos, eventos e informações que estão circulando. É importante investir nessa atualização e no uso de redes sociais para avisar que está disponível para novas oportunidades”, orienta, ressaltando que alguém com autoestima em alta e foco tem muito mais possibilidade de reinserção no mercado. Ana Karina apostou no emprendedorismo para conseguiour manter uma renda (foto: divulgação)
Reinvenção
Quem passou por uma situação destas recentemente foi Ana Karina Dortas, 43 anos. Com dificulade em se recolocar no mercado de trabalho, ela decidiu empreender, criando uma empresa de venda de embutidos. Confira seu relato:
"Depois de trabalhar 14 anos numa empresa de Programação Visual, fui demitida do cargo de gerente de produções. No início, estava otimista, achei que a demissão poderia ser uma oportunidade de descansar e de me reinventar na carreira. Sou formada em Letras e achava que aquela poderia ser uma oportunidade de mudar de área.
O problema é que o tempo foi passando e eu não conseguia a tão sonhada recolocação. Antes mesmo da demissão ocorrer, eu já fazia brigadeiros gourmets sob encomenda como uma forma de incrementar a renda e, diante do cenário, fui obrigada a reinvestir no negócio e ampliar minha produção.
A dificuldade é que a produção de brigadeiros não garantia o sustento da minha família e, em 2016, meu marido também foi demitido do trabalho. De repente, estávamos os dois em casa, sem grandes perspectivas, e essa sensação foi bem assustadora. Precisamos nos reinventar em tudo. Começamos a produzir e vender antepastos confitados diversos e alguns embutidos artesanais.
A coisa ganhou um novo fôlego e nos motivamos a continuar, tanto que fui obrigada a abrir mão da produção de doces em nome do negócio com salgados. Ele começou a fazer cursos de charcutaria para produzirmos embutidos artesanais com mais qualidade. Depois, ele voltou a ter emprego formal, mas continuamos a investir na nossa produção. Ele passou por nova demissão e agora vivemos exclusivamente do nosso negócio.
Sinto falta da segurança da carteira assinada e nesse cenário de incertezas ainda não conseguimos ampliar o negócio como gostaríamos e tampouco contratar funcionários que possam nos ajudar, mas estamos seguindo em frente com essa proposta de negócio".
Desistir está fora de questão
As recusas, a falta de resposta nas seleções, currículos enviados sem nenhuma perspectiva, o tempo passando e nenhuma vaga ou possibilidade à vista.
O desalento é algo complicadíssimo. De acordo com dados da série histórica da Pnad Contínua, que começou em 2012, no segundo trimestre de 2018, o número de desalentados chegou a 4,8 milhões de pessoas, contingente superior ao do 1º trimestre de 2018 (4,6 milhões) e do 2º trimestre de 2017 (4,0 milhões de pessoas).
A Bahia apresentou uma das maiores taxas do país, 39,7%.
Luta diária
De acordo com o coach de carreiras Wladimir Martins, é fundamental não desistir de lutar. “Ser negativo não faz bem para o cérebro, então, sempre quando estiver diante de uma possibilidade de recolocação, demonstre interesse e energia”, diz. “Cabeça erguida sempre, não deixe se levar por conversas alheias que podem gerar ainda mais desmotivação. Procure sempre olhar para o futuro com um olhar de plenitude e abundância”, complementa.
Para ele, o período em que se fica parado é o momento de aprender, de investir em si mesmo. “É fundamental desconsiderar as crenças paralisantes de que tudo está difícil e que o mercado está ruim. Utilize as negativas (dos recrutadores) como um trampolim e lembre-se da sabedoria popular, que diz que perder uma batalha sim, mas a guerra, jamais”.
Para que as tentativas sejam mais assertivas, ele sugere que se analise as vagas com calma para saber se o perfil profissional é o mais indicado para a vaga em questão. Durante a entrevista, é imperativo falar a verdade, com o máximo de transparência, sem inventar situações ou experiências inexistentes.
O comportamento na entrevista precisa ser positivo e simpático, mostrando otimismo diante da possibilidade.
Dicas para vencer o desalento
Encare a situação Respire fundo e encare os fatos. As demissões acontecem e surgirão outras oportunidades de trabalho.
Veja o que melhorar Reflita sobre o que o levou à demissão. Vale pedir o feedback da empresa para ter noção do que deve ser modificado.
Descanse um pouco para seguir em frente Não se deixe paralisar pelo choque da perda e crie metas de futuro. Se permita descansar um pouco para se recuperar do trauma, mas não se deixe abater.
Faça uma Autoavaliação Avalie o desempenho profissional, buscando pontuar os aspectos positivos e negativos. Coloque num papel onde estão suas forças e fraquezas
Se Empodere Trabalhe as limitações para mudar a situação. participar de cursos pode ser uma boa oportunidade de resgatar a autoestima
Fuja do Comodismo Não se deixe vencer pelo comodismo. Seguro desemprego não dura para sempre e nada garante que haverá outra fonte de renda quando ele acaba
Tenha Controle emocional Siga adiante e não se autoboicote! Procure se atualizar por meio de cursos, palestras e eventos. Use suas redes para comunicar sua disponibilidade! Você pode!