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Nilson Marinho
Publicado em 21 de agosto de 2023 às 05:10
Antes de continuar a leitura, sugiro que você responda esta pergunta: qual é a modelo que você mais admira? Certamente, a resposta será Gisele Bündchen, e isso não só porque ela é brasileira assim como você, mas pelo motivo da gaúcha, ao longo de duas décadas de carreira, construir uma marca sólida, que a fez ultrapassar as barreiras da indústria da moda e ser lembrada até os dias de hoje mesmo depois de ter deixado as passarelas.
A supermodelo é um bom exemplo de como uma marca (branding) pessoal pode levar uma pessoa a ter uma imagem sólida, influente e memorável em meio a uma área competitiva. No mundo dos negócios - ou simplesmente na vida - há muitas pessoas que querem ser reconhecidas por aquilo que têm de melhor a oferecer, seja para alcançar seus objetivos, se tornar uma autoridade em um assunto, ser lembrado pelas causas que defendem ou para ascender profissionalmente.
De acordo com a estrategista de Branding e Conteúdo Camila Serrat, criar associações positivas aumenta as chances do indivíduo de permanecer na memória das pessoas e a ser considerado por elas para as oportunidades que possam surgir. Tornar-se memorável, diz a especialista, é preparar o terreno para que seja possível colher frutos no futuro.
“Você constrói uma memória positiva e, em seguida, tem condições de reforçá-la a cada nova oportunidade de contato, destacando o que deseja deixar claro na mente das pessoas. Quanto mais associações positivas você cria na mente de alguém, mais chance você tem de ser lembrado e considerado para os movimentos que deseja dar na sua vida, seja no campo profissional e pessoal. Lembre-se: são as pessoas que abrem ou fecham as portas para a gente o tempo todo”, comenta.
Compreender a sua própria identidade como uma marca é um passo crucial para determinar como você se comunica, segundo a estrategista. Decidir não se envolver nesse processo significa permitir que os outros o façam por você. “É como aquele almoço de família em que sempre tem uma mãe, pai, avós, tios e primos comentando a respeito do filho, neto, sobrinho, primo sob sua perspectiva. A versão sempre tem uma parcela de verdade, outra de exagero, e uma possível má interpretação dos fatos. As pessoas compartilham o que percebem a seu respeito, a questão é que posicionamento você pretende assumir nessa narrativa”, ilustra.
A especialista explica que seu trabalho consiste em entender como o cliente se percebe para, em seguida, confrontar essa visão com a forma como outras pessoas o enxergam no mercado de trabalho e na vida. Identificada as fragilidades vem a última etapa:
“[...] a de planejamento da marca pessoal a partir de um Manual de Marca que consolide propósito, valores, atributos de marca, dissonâncias cognitivas a serem corrigidas, pautas que fazem parte do universo de fala, tom de voz, e o manifesto de marca — uma narrativa que indica qual transformação a marca gera ou pretende gerar no mundo. Quando a pessoa ganha clareza sobre os pontos fortes da sua trajetória e das suas competências e habilidades naturais, assim como da forma como é percebida externamente, a comunicação a partir daí fica mais leve, fluida, e muito menos sujeita a seguir inspirações desalinhadas. A pessoa finalmente passa a reconhecer o valor da sua própria voz”, finaliza.
Fabrício Oliver, CEO da marca baiana Glac, queria que as pessoas o enxergassem de uma nova forma. O publicitário já não era mais aquele que apenas aspirava em fundar uma empresa de calçados, tinha, agora, uma sob seu controle. Mudou-se para a cidade de São Paulo, onde as oportunidades para sua área são mais abrangentes, deu uma repaginada no guarda-roupa e deixou o feed do Instagram mais interessante com fotos de visita a restaurantes e viagens internacionais. Além disso, passou a frequentar eventos e desfiles onde circulam estilistas e outros empreendedores da moda que, como ele, querem impulsionar seus negócios.
O que a princípio deveria funcionar apenas com uma construção de marca pessoal, passou a ser um estilo de vida que, hoje, não abre mão. Com a persona que construiu online atraiu novos seguidores e com os contatos que fez durante os bastidores dos eventos fechou parcerias.
“Não é preciso apenas estar nos lugares, digo isso no online e offline, é necessário também ser visto, ter algo que seja interessante para mostrar, falar e compartilhar com os outros. Uma pessoa pode ser extremamente interessante e ter milhões de habilidades, mas se ela não souber se comunicar, e há muitas maneiras de fazer isso, certamente será mais uma entre todas as outras”, comentou Oliver.
Heitor Ferrari Marback, doutor em Difusão do Conhecimento, mestre em Administração, especialista em Marketing e professor da Unijorge, afirma que para começar a pensar na construção de uma marca pessoal é preciso perguntar a si mesmo qual é o objetivo final e qual é o prazo para alcançá-lo. Para ele, contar com a assistência de especialistas em comunicação para elaborar um plano estratégico é uma decisão vantajosa.
“Fazer um planejamento de comunicação com auxílio profissional é uma excelente escolha. Para profissionais que não são da área de gestão e negócios é mais complexo, já que nas suas formações não existe instrumentalização voltada especificamente para esse fim. É preciso entender que a marca é o patrimônio mais valioso que uma empresa pode ter. E isso vale também para a marca pessoal. As redes sociais geraram uma verdadeira corrida por posicionamento profissional. Elas são acessíveis a todos, mas nem todas as utilizam de forma correta, visando potencializar a construção de suas imagens”, orienta Marback.
Provocar boas impressões por si só ajuda a abrir muitas portas, mas quando o branding pessoal é atrelado a uma consolidada rede de contatos, o conhecido networking, outra série de vantagens significativas pode surgir, como colaborações profissionais, troca de conhecimento ou oportunidades de carreira. O que os especialistas dizem é que essas relações precisam ser mais genuínas possíveis.
"Boas relações podem abrir muitas portas, falo por experiência própria em ambos os lados. Já abriram portas para mim pelo que construí com as pessoas no passado, bem como eu abri portas para pessoas que atuaram lá atrás comigo em uma função e hoje exercem outra, e eu precisava justamente de alguém com esta nova competência. Para mim foi fácil, era alguém em quem já confiava, embora não sabia concretamente sua capacidade neste novo job. Mas confiava que sua atitude poderia se sobrepor rapidamente a um eventual gap de competência", conta Pedro Signorelli, especialista em Gestão, com ênfase em Objectives and Key Results (OKR).
Esses laços podem ser feitos por meio de redes sociais, como LinkedIn, em congressos, eventos sociais ou em encontros corriqueiros que reúnam pessoas em comum em um contexto informal. Essa última conexão, que pode não ser intencional, é chamada de “networking involuntário”.
“Movimento que não é feito com a intenção de conhecer pessoas para fazer negócios, com objetivos profissionais pré-determinados para uma nova relação. Nele, o relacionamento entre duas pessoas acontece de forma natural, sem expectativas de ambos os lados, simplesmente pelo prazer em estabelecer vínculo com as pessoas que conhecemos ou tendo um interesse genuíno em conhecer o outro e trocar experiências”, explica André Duek, empreendedor que investe nos Estados Unidos e autor do livro Potência Empreendedora.
“O networking involuntário é aquele em que você não pensa e não sente que está fazendo contatos. Na maioria das vezes, não haverá geração de negócios e nem deve existir essa expectativa. Quando a relação começa dessa forma, há boas chances de se estabelecer confiança e colaboração entre as partes em diferentes esferas da vida. As coisas acontecem e fluem com naturalidade, sem a pressão existente de fazer negócios”, completa Duek.
Já o “networking qualificado” é o ato de construir e nutrir conexões estratégicas com pessoas que possuem importância e relevância em um cenário particular e que podem ajudar com oportunidades, parcerias e mentorias. O Grupo Somos, por exemplo, é uma comunidade de empresárias e empresários de alta performance à frente de suas operações que se conectam para fazer negócios. Os encontros entre eles acontecem mensalmente para incentivar troca de informações e estreitar relacionamentos interpessoais. São 160 membros que, desde 2019, fecharam 220 operações.
“Networking qualificado é estar com pessoas que já conquistaram aquilo que você quer conquistar. Para isso é preciso ter uma curadoria, uma gestão, não é só um grupo de networking. Tem todo um relacionamento envolvido e propósitos muito bem definidos. Eu digo sempre que networking efetivo não é necessariamente o que eu vou consumir de você. Mas é preciso entender da sua proposta de valor, da sua operação para que eu consiga te referenciar de forma qualificada. Quem senta pra vender não vende nada, networking não é venda, networking é relacionamento, é confiança”, opina Cintia Almeida é curadora e fundadora do grupo Somos.