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Abrolhos disputa indenização bilionária de acidente em Mariana

Acordo com a mineradora Samarco, iniciado em 2016, entre em fase decisiva em 2023

  • Foto do(a) author(a) Carolina Cerqueira
  • Carolina Cerqueira

Publicado em 15 de julho de 2023 às 05:00

Arquipélago de Abrolhos
Arquipélago de Abrolhos Crédito: @eco360.imagery

São 500 km entre a Barragem de Fundão, em Mariana (MG), e a foz do Rio Doce, no Espírito Santo. Outros 250 km separam a saída para o mar e o Parque Nacional Marinho dos Abrolhos, no Sul da Bahia. A distância total de 750 km, no entanto, não foi suficiente para impedir a chegada da lama à Unidade de Conservação (UC) que abriga a maior biodiversidade marinha do Atlântico Sul. O fato está mobilizando o Poder Público em busca de que parte da indenização bilionária a ser paga pela mineradora Samarco seja destinada à Bahia. O acordo, em curso desde 2016, entra em fase decisiva em 2023.

O Parque, chamado de Parna Mar Abrolhos, está localizado na região do Arquipélago de Abrolhos, composto por cinco ilhas: Redonda, Siriba, Guarita, Sueste e Santa Bárbara. O município mais próximo – a 70 km – é Caravelas, Sul da Bahia. Administrado pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), autarquia ligada ao Ministério do Meio Ambiente, o Parque completou 40 anos em abril de 2023.

Estudos conduzidos por diversas universidades brasileiras, como a Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), apoiados pelo ICMBio, detectaram em Abrolhos a presença de rejeitos provenientes do rompimento da Barragem do Fundão. O fato, ocorrido em 2015, provocou um dos maiores desastres ambientais do mundo. Foram liberados 40 milhões de metros cúbicos de rejeitos, que deixaram 19 mortos, e destruíram comunidades inteiras ao longo da bacia do Rio Doce.

A ação civil pública aberta em 2016 pelo Ministério Público Federal (MPF) pede, em valores atualizados, mais de R$ 200 bilhões, a serem pagos pela Samarco, – controlada pela BHP Billiton e pela Vale –, responsável pela exploração da Barragem. Os recursos seriam destinados às vítimas, à União, aos estados de Minas Gerais e Espírito Santo e a 49 municípios.

Segundo o procurador da República Carlos Bruno Ferreira da Silva, que atua na área ambiental e também é procurador regional dos Direitos do Cidadão (PRDC) no MPF em Minas Gerais, o órgão está trabalhando para que uma parte da indenização seja destinada ao estado da Bahia. (Leia mais na entrevista abaixo)

O que se sabe sobre o processo de acordo com a Samarco

Em 2016, um acordo chamado Termo de Transação e Ajustamento (TTAC) foi assinado. Já em 2018, um novo documento, o TAC GOV, determinou que em até dois anos deveria ser iniciada uma repactuação, alegando a ineficiência do primeiro acordo.

A repactuação, no entanto, prevista para 2020, foi iniciada em 2021, sendo conduzida primeiro pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e, em seguida, passando para o Tribunal Regional Federal da 6ª Região (MG), que segue como responsável atual.

O novo acordo chegou próximo à finalização nos últimos meses de 2022, mas, devido a problemas no fluxo de pagamentos, a permanência de dúvidas sobre cláusulas e a transição de Governo Federal, foi adiado. O processo de repactuação foi reconhecido pelo governo do novo presidente, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), iniciado em 1º de janeiro de 2023, cujo Executivo já faz parte das negociações.

Paralelamente ao processo que corre na Justiça brasileira, uma ação civil pública corre na Inglaterra sobre o mesmo caso contra a BHP, listada na bolsa de Londres, e pede uma indenização que ultrapassa os R$ 230 bilhões, de acordo com a imprensa internacional. É comum em tragédias como a de Mariana, envolvendo diversas vítimas, que grandes escritórios de advocacia encabecem processos. A ação britânica, aberta pelo escritório Pogust Goodhead e que surgiu a partir da demora em se finalizar um acordo no Brasil, conseguiu a aderência das vítimas, dos estados e dos municípios.

No entanto, como reconhece o próprio procurador Carlos Bruno Ferreira da Silva, o processo britânico se mostra mais célere do que o brasileiro e a conclusão de um fulminaria a conclusão do outro. Trata-se, portanto, de uma corrida contra o tempo, com desvantagem para a Justiça brasileira.

O que se sabe sobre a chegada da lama à Bahia

Lama em Mariana (MG)
Lama em Mariana (MG) Crédito: José Cruz/Agência Brasil

Como explica o professor do Departamento de Biofísica e Biometria da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), Heitor Evangelista, que participou dos estudos em Abrolhos de 2016 a 2021, as pesquisas identificaram a chegada da lama na região. O material teria um alto teor de ferro, em quantidades acima do normal para a região, além de metais pesados como zinco e cobre.

Evangelista destaca, no entanto, que a área de até 10 km da costa, chamada de arco interno, foi mais afetada do que a área de até 50 km da costa, chamada de arco externo e que compreende o Parque. Além disso, os estudos teriam apontado uma diminuição geral dos rejeitos ao longo dos anos.

“Nas últimas análises, mostramos que houve um aumento, um pico, e depois uma diminuição. Quando se despeja algo no oceano, à medida que o tempo passa, a tendência é esse material ir se diluindo através da ação das correntes marítimas e outros processos”, explica o professor, especialista em geociências.

Mesmo com a baixa quantidade de rejeitos identificadas na região do Parque e de sua diminuição ao longo do tempo, os impactos ambientais não são descartados. De acordo com o ICMBio, estudos que comprovem os prejuízos ainda não foram concluídos. Heitor Evangelista coloca alguns dos complicadores.

“A grande dificuldade de se dimensionar o impacto de um advento é que em muitos casos não se havia um monitoramento prévio para poder se identificar exatamente o que mudou. Além disso, esses corais aqui do Brasil em grande parte são endêmicos, ou seja, só se tem aqui. Então há poucos estudos, se sabe pouco sobre eles, o que também dificulta a identificação de impactos biológicos”, afirma.

'‘Há intenção de que parte da indenização vá para a Bahia’, diz Procurador da República Carlos Bruno Ferreira da Silva, também procurador regional dos Direitos do Cidadão (PRDC) no Ministério Público Federal (MPF) em Minas Gerais

Carlos Bruno Ferreira da Silva
Carlos Bruno Ferreira da Silva Crédito: PGR MG/Divulgação

  • Quais são os argumentos utilizados para que a Bahia também seja indenizada?

Apesar de não haver estudos conclusivos apontando impactos na Bahia, já se consegue comprovar que, por efeito das correntes marítimas, os rejeitos que foram em direção ao mar foram para o norte do Espírito Santo, ou seja, para o Sul da Bahia. Com isso, o fato é que existe um princípio no direito ambiental chamado princípio da prevenção, que prevê que se deve tomar todas as medidas necessárias para garantir a preservação do meio ambiente quando se verifica uma possibilidade real de afetação de uma região. Esse princípio permitiria a destinação de recursos para a Bahia, mesmo não existindo ainda estudos conclusivos sobre impactos na região.

  • A indenização é factível? Quais as chances dela se concretizar?

Há uma intenção muito grande minha e do Procurador-geral da República, Augusto Aras, de avançarmos quanto à indenização da Bahia. Visando a prevenção, o MPF entende que seria muito adequado que uma parte do fundo proveniente da indenização que ficará sob gestão da União fossem aplicados no sul da Bahia. Neste momento, não há portanto previsão de entrada direta do estado baiano na negociação do acordo como parte a ser indenizada, mas estamos trabalhando para definir uma autorização para a União aplicar recursos no sul da Bahia, com foco no Parque Nacional Marinho de Abrolho.

  • Qual valor deve ser repassado à Bahia?

É uma soma de bilhões de reais falada por vários atores, eu mesmo já conversei sobre isso com o PGR e me parece uma cláusula muito defensável. Não está no texto ainda, mas digo que, em nome do MPF, há intenção de autorizar essa aplicação no Sul da Bahia. Não podemos aqui revelar o valor exato porque a negociação se dá na base de confidencialidade, prevista em uma cláusula que assinei.

  • Alguma das partes já recebeu algum valor de indenização?

As empresas alegam já terem gasto algum valor na casa de pouco mais de R$ 20 bilhões ao longo desses oito anos como reparação de danos ambientais. Valores na casa de um pouco mais de R$ 10 bilhões teriam também sido pagos aos atingidos, pessoas físicas. Há ainda alguns programas da Fundação Renova, criada pelas empresas, que envolvem repasse de dinheiro para os estados fazerem políticas públicas, mas isso não caracteriza indenização. Ou seja, até o momento, de valores de indenização, só as vítimas receberam e apenas uma parte. Os estados, os municípios e a União não receberam nenhum valor referente à indenização.

  • Quando a repactuação deve ser concluída?

É um acordo que já está quase pronto, que já tem muitas consolidações de mais de dois anos de negociação dessa repactuação. O novo governo já aderiu ao acordo. Em 5 de abril, o Governo Federal trabalhava com um prazo de 60 a 90 dias, contados daquele dia, para terminar a repactuação. É um acordo, caso não seja finalizado ainda em julho, precisa ser fechado nos próximos 60 dias, no máximo até setembro.

A Casa Civil foi procurada pela reportagem para comentar sobre o caso, mas não quis se pronunciar. Também foram procuradas e não se manifestaram a Casa Civil estadual, comandada pelo secretário Afonso Florence, e a Secretaria de Meio Ambiente do Estado da Bahia (Sema), comandada pelo secretário Eduardo Sodré. A mineradora Samarco, também procurada, respondeu que não iria comentar o caso. A reportagem solicitou ao ICMBio a quantidade média de visitantes mensais e anuais do Parque, assim do valor dos recursos financeiros necessários para a manutenção da Unidade de Conservação, mas não obteve resposta até o seu fechamento desta reportagem na noite de sexta-feira (14).

Parque Nacional Marinho de Abrolhos completa 40 anos e é exemplo de conservação

Criado em 1983 como uma Unidade de Conservação (UC), o Parna Mar Abrolhos protege uma porção significativa do maior banco de corais do Atlântico Sul, além de aproximadamente 1.300 espécies de tartarugas marinhas, aves marinhas e uma infinidade de peixes e invertebrados. A região, inclusive, despertou grande curiosidade de Charles Darwin e outros cientistas e navegantes como Américo Vespúcio.

Segundo o professor do Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo (USP), Miguel Mies, coordenador de pesquisas do Projeto Coral Vivo, que atua na preservação do Arquipélago de Abrolhos, os recifes de corais abrigam uma grande biodiversidade e atraem atividades socioeconômicas relevantes, como turismo e pesca, que, controladas, são positivas para geração de emprego e renda.

Mies defende que parte da indenização proveniente do rompimento da Barragem do Fundão seja destinada ao Parque. “Sabemos que a lama chegou até aqui e temos investigações correndo para saber como os corais vão se comportar ao longo do tempo. Embora eu entenda que outras regiões tenham sido mais impactadas pelo rompimento da Barragem do que Abrolhos, obviamente seria importante que houvesse uma destinação de recursos à região visando pesquisas e ações de prevenção, já que trata-se de uma região que comprovadamente recebeu contaminantes”, finaliza o professor.

Recife de corais
Recife de corais Crédito: Athila Bertoncini/Projeto Coral Vivo

Curiosidades

  • Protege o principal berçário das baleias jubarte no Atlântico Sul, que migram para o Banco dos Abrolhos para se reproduzirem e terem seus filhotes

  • É a única região do planeta onde é possível encontrar o coral-cérebro (Mussismilia braziliensis), espécie hermafrodita cuja colônia forma um dos ecossistemas mais ricos do planeta

  • Abriga diversas espécies de tartarugas marinhas ameaçadas como as tartarugas cabeçuda, verde e de pente. Além dessas, pode-se encontrar a tartaruga-de-couro, a de mais raridade entre as espécies na região

  • As cinco ilhas são o habitat de diversas espécies de aves marinhas, residentes e migratórias, como grazina do bico vermelho, atobás brancos e marrons, fragatas e beneditos

  • Espécies de peixes e invertebrados com grande valor ecológico e socioeconômico são encontrados em abundância no interior do Parque, como badejos, budiões e lagostas

Atrativos

  • Mergulho livre (apneia) e mergulho autônomo (snorkeling) em águas rasas ou profundas nas ilhas Siriba e Santa Bárbara

  • Visitação de baleias jubarte. O Parque Nacional Marinho dos Abrolhos é um dos pontos mais privilegiados do mundo para a observação desses animais

  • Observação de aves. As ilhas abrigam importantes ninhais de aves marinhas, distribuídos de diferentes maneiras

  • Trilha Guiada na Ilha Siriba. A trilha de 1.600 m permite contato próximo com um ninhal de Atobás-brancos e a Grazina do bico vermelho

  • Ida ao Centro de Visitantes do Parque Nacional de Abrolhos. Na Praia do Kitongo, em Caravelas, o visitante pode conhecer o Parque em uma visita monitorada que inclui uma experiência com óculos de Realidade Virtual 360, que simulam caminhadas, mergulhos e sobrevoos na região

Quando visitar

  • Entre dezembro e abril as águas são mais quentes e oferecem maior visibilidade, sendo o melhor período para mergulhos. De junho a novembro, o principal atrativo é a observação das baleias jubarte, sendo o pico de aparições entre julho e outubro. Durante todo o ano é possível observar diversas espécies de aves marinhas no Parque.

Como chegar

A cidade mais próxima ao Parque Nacional Marinho dos Abrolhos é Caravelas, no extremo Sul da Bahia, onde fica a sede do parque e o Centro de Visitantes (CV). Partindo de Salvador, não há ônibus direto para a cidade. O trajeto indicado é ir de ônibus até Teixeira de Freitas e, de lá, ir de ônibus até Caravelas. O primeiro trecho dura cerca de 15h30 e custa a partir de R$ 200. O segundo trecho dura cerca de 2h30 e custa a partir de R$ 23. Em Caravelas, operadoras de turismo são autorizadas a promover a visitação ao Parque. São elas:

Valores para acesso

Uma taxa de visitação é cobrada para acessar o Arquipélago de Abrolhos. Os valores são os seguintes:

  • Desconto para brasileiros (50%): R$ 52,00
  • Desconto para visitantes de países integrantes do Mercosul (25%): R$ 78,00
  • Desconto para visitantes dos municípios que compõem a Costa das Baleias, que são Teixeira de Freitas, Mucuri, Nova Viçosa, Caravelas, Alcobaça, Prado e Itamaraju  (90%): R$ 10,00
  • *Crianças de até 12 anos e pessoas a partir de 60 anos que tenham residência no Brasil não pagam
  • *Para visitação ao Centro de Visitantes em Caravelas-BA, não há cobrança de ingressos.