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Publicado em 8 de março de 2025 às 06:04
O cinema é composto de imagens e sons, mas imagens e sons também estão presentes no campo literário. A imaginação, aliada à arte da escrita, é capaz de criar novos mundos e surpreendentes deslocamentos de perspectivas. Construir narrativas, inventar personagens e situações nos faz protagonistas da nossa história, nos faz refletir sobre a sociedade em que vivemos.>
Por outro lado, mergulhar no mundo da escrita de roteiros nos ajuda a entender e a reagir às onipresentes e sutis narrativas manipuladoras. Criar roteiros é um desejo e uma necessidade daqueles que não se permitem estagnar, são eternos aprendizes em meio à alucinante rapidez de transformações técnicas e políticas típicas do nosso tempo.>
O poeta baiano Damário Dacruz, num de seus poemas, afirma que “a possibilidade de arriscar é que nos faz homens”. Por isso, não nos é permitido recuar de nossas convicções diante de uma nação oca de valores. Ler e escrever sempre foram dispositivos eficazes de mudança, janelas de ação e reflexão fundamentais. Nos faz mais perspicazes e críticos diante da avassaladora tempestade de signos que nos impõem interpretações contínuas e velozes.>
Parafraseando Mário de Andrade, afirmo que roteiros não se escrevem para a leitura de olhos mudos. Roteiros cantam-se, urram-se, choram-se. Nesses últimos anos, estive envolvido em projetos de difusão da técnica de escrita de roteiros para o audiovisual, lidando com públicos de classes sociais, formações culturais e faixas etárias diferentes. Destaca-se, também, a diversidade étnica e de gênero. Essa jornada de formação fez-me sentir vivo e realizado, interagindo com novos interlocutores e integrando redes criativas de grande potência transformadora.>
Tudo começa em 2021, sob a égide da famigerada pandemia de Covid 19, quando um grupo de artistas, jornalistas, cineastas e produtores culturais, da Bahia e do eixo sul-sudeste, que até então desenvolviam iniciativas isoladas, resolveu encarar o desafio de trabalhar coletivamente em ciclos de oficinas prático-teóricas de roteiro audiovisual para além do circuito cultural já estabelecido, seja na capital ou no interior do estado da Bahia.>
Se por um lado, produzir filmes custa caro, depende de equipamentos inacessíveis à maioria das pessoas e de uma gama de profissionais qualificados, escrever roteiros não. Com papel e caneta, conhecimento técnico, alguma inspiração e muita transpiração, é possível engaiolar ideias e publicá-las em forma de livro. Esse é o objetivo encampado pelo Coletivo4 Audiovisual através de oficinas presenciais e online denominadas “Dos filmes que ainda não fizemos”.>
De 2021 até agora, foram finalizados quatro livros todos com histórias inéditas. Enfim, este acervo de roteiros revela muito do imaginário do povo baiano, seus interesses e opiniões. Todos os roteiros tiveram o acompanhamento cuidadoso de profissionais qualificados e apaixonados pela arte de contar histórias através de textos, imagens e sons. O primeiro passo de uma longa jornada foi dado. A Bahia pode comemorar esse feito: são 90 roteiros prontos para virar projeto e ganhar o mundo. >
Entre os dias 12 e 14 de março teremos um encontro formativo e comemorativo com a realização do Lab Bahia na sede da Associação Bahiana de Imprensa. Serão três dias de atividades intensas, proporcionando aos roteiristas-autores mais uma oportunidade de ampliar conhecimentos no campo audiovisual. Serão quatro atividades de formação sob a batuta de profissionais experientes da Bahia, de São Paulo e de Pernambuco. Na pauta temas como Inteligência Artificial, Figurino, Elaboração de Projetos e um exercício de Pitching.>
Após a folia momesca, o ano começou com força. É hora de arregaçar as mangas e trabalhar duro. “Passarinho que se debruça — o voo já está pronto!”, falou Guimarães Rosa.>
Kau Rocha é jornalista e documentarista >