Receba por email.
Cadastre-se e receba grátis as principais notícias do Correio.
Publicado em 12 de janeiro de 2025 às 02:00
Na madrugada de domingo para segunda as minhas redes sociais ficaram monotemáticas: só dava Fernanda Torres e a premiação com o Globo de Ouro. Confesso que assisti parte da cerimônia, mas o tédio das tentativas de fazer humor dos artistas apresentadores me fizeram mergulhar num cochilo colossal e perdi o momento vip do anúncio e das reações das concorrentes, inclusive de Fernandinha.
Ao despertar senti um misto de euforia com vingança, orgulho e estranhamento: será que ela ganhou mesmo? Ganhou e foi a primeira e única recordista olimpica, fenômeno inesperado do país que sofre de um insuperável complexo de vira lata, expressão brilhantemente cunhada por Nelson Rodrigues para definir a nossa baixa auto-estima.
Recuperado do baque, a insônia bateu e amanheci o dia pensando no tempo e na importância dele para a construção de trajetorias. Numa época em que somos estimulados a viver o momento, como se não houvesse o ontem nem o amanhã, o reconhecimento do trabalho de uma atriz que foi se desenhando, ao longo de decadas de carreira sólida, merece todos os aplausos.
Nanda começou adolescente, numa família de artistas lutadores, e logo se destacou, não só pelo talento, mas tambem pela forma inteligente e profissional para escolher papéis, emitir opiniões e se posicionar como atriz ética e coerente. Em tempos de nepo babies, ela sempre foi a filha de Fernandona, mas logo criou uma identidade própria e especial. E sua marca, crítica, irnôica e, principalmente, humana, sempre esteve presente em Vani, em Sueli e, agora, na impecável Eunice Paiva, construída com uma palheta impressionante de sentimentos e emoções, que foram conquistados através dele, o tempo.
Intrigante esse momento em que tudo aparece e se dissolve na mesma velocidade, em que o hit de hoje só dura 24 horas e artistas vivem malabarismos para conseguir se manter relevantes no mundo fugaz das celebridades e redes sociais.
Fernandinha é analógica, consistente, veio para fazer história, vai ficar, permancer. Ultrapassará os memes, a histeria do momento, e seja ou não indicada para o Oscar, vai continuar interpretando personagens inesquecíveis, escrevendo artigos e histórias interessantes, falando coisas importantes e servindo de farol para velhas e novas gerações de artistas.
Ela é eterna, e isso não precisa de prêmios. Viva nosso cinema, viva as Fernandas, esse é o país em que acredito!