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Gabriel Moura
Publicado em 28 de abril de 2024 às 11:00
O que já era senso comum em Salvador nacionalizou após Davi explanar sua antiga profissão em rede nacional durante o BBB 24: o comércio na Lapa não é apenas sobre o “que”, mas também o “como”. A água é no balde, as camisas no varal, o café no carrinho e o design de sobrancelhas no meio da rua. >
Este último tomou conta do Beco do Mocambinho, localizado entre o Relógio de São Pedro e a Praça da Piedade, defronte do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia, onde ergueram os estandes profissionais como David Lenon e Júnior Alves, responsáveis por emperiquitar as freguesas do ‘Beco da Beleza’.>
“Aqui só vem mulher praticamente”, inicia David, emendando que homens também são bem-vindos. “Pode-se fazer na lâmina ou na linha. Algumas até deixam ‘natural’, mas a maioria prefere passar uma tinta especial para cobrir falhas e dar contorno, a popular ‘henna’”.>
A quantidade de stands disponíveis varia a depender do dia, com o movimento maior nas quintas e sextas-feiras. Aproximadamente 10 autônomos fazem do salão de beleza a céu aberto sua fonte de renda. Em comum, além da profissão, o preço: R$ 10 na lâmina; R$ 15 na linha e R$ 20 na henna.>
“Venho aqui por causa do atendimento, qualidade do serviço e, principalmente, preço”, comemora a corretora Márcia Souza, 45, que que pagava R$ 30 mais caro para deixar sua sobrancelha ‘na régua’ em um salão próximo a sua residência na Barra.>
O espaço funciona por lá desde antes da pandemia e é uma aglomeração de trabalhadores que antes atuavam em outros cantos do Centro. “Antes meu ponto era próximo ao Relógio de São Pedro, onde eu vivia correndo do ‘rapa’”, lembra Lenon.>
Já o beco, diferente de outros adjacentes à Avenida Sete, não tinha comércio. “Isso aqui tava abandonado’”, revela o autônomo, um dos primeiros a ocupar o espaço. O nome da via não foi um dos motivos da escolha do endereço, mas não deixa de ser profético que a reunião ocorra no Mocambinho, expressão antiga que significa “local construído para receber negros fugidos”.>
Após a chegada dos espelhos e cadeiras, outros estabelecimentos abriram as portas por lá. Hoje, funcionam chaveiro, loja de mochilas infantis, banca de óculos, consultório odontológico e até um salão de beleza tradicional, com porta e teto, inaugurado há dois anos para bafar parte do público cativo da rua.>
Era 15 horas de relógio de uma quarta-feira e quatro mulheres formavam uma fila para ter as sobrancelhas tratadas pelas mãos de Júnior Alves. Horário comercial que não afastava nem as atarefadas, como Andrea da Silva*.>
“Oh moça, não tire foto minha não, por favor”, suplicou a jovem vendedora à fotógrafa Marina Silva. Em seguida, a explicação: “Estou em horário de trabalho. Atrasei meia hora o almoço para passar aqui.”>
Após dois centavos de insistência do repórter, ela confidenciou que trabalha em um comércio próximo e aplica o ‘golpe’ toda semana, tempo de duração da henna em sua sobrancelha. “Até hoje, nunca fui pega”, comemorou, seguindo com mais um pedido de ocultação do nome real na matéria para garantir a invencibilidade.>
Trabalhadoras, clientes de lojas próximas e batedoras de perna em geral formam a maior parte do público de Júnior, que chega a receber 80 mulheres em sua cadeira em um dia mais movimentado. “No Natal, atendi 100 clientes. Trabalhei até à 1h30 da madrugada, mas valeu a pena”, lembra.>
Já em um dia comum, a movimentação ronda os 40. Os primeiros designers começam os serviços às 7h e o funcionamento vai até o último cliente ser atendido – o que geralmente ocorre às 19h.>