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Gabriel Moura
Publicado em 30 de março de 2024 às 05:01
Dentre outras ocupações, Manoel Pinto de Aguiar foi secretário de Finanças de Salvador, chefe da Diretoria-Econômica da usina Itaipu Binacional e professor da Faculdade de Ciências Econômicas da Ufba. Apesar do currículo, nem ele seria capaz de calcular a quantidade de coitos, orgias, cornos e fetiches consumados nos estabelecimentos posicionados ao longo da avenida que batiza.
São cinco motéis pelos quatro quilômetros de extensão. A casa de swing “In Off” e o 'espaço de entretenimento adulto', o tal do puteiro, conhecido como “Rancho”, localizados em ruas adjacentes, completam o cardápio sexual da via, construída nos anos 70 para ser artéria principal do bairro de Patamares, projetado para abrigar parte da high society soteropolitana.
Dum lado da Pinto, o vasto terreno da Igreja Católica onde foi construída a Ucsal. Mantendo o academicismo, doutro formou-se o PHD: Playboy, Hollywood e Decameron. Somados ao coirmão KamaSutra, o quarteto foi responsável por dar ao endereço o vulgo de “Rua dos Motéis”.
Os quatro foram construídos simultaneamente no início dos anos 80 por três empresários – Playboy e Hollywood com o mesmo dono. A escolha pelo local foi guiada pelo Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano da Época, o PDDU, revela Samanta Vidal, diretora de operações do KamaSutra.
“Naquela época, era proibido construir motéis, locais que eram vistos como 'imorais', no centro da cidade. A Pinto de Aguiar, por ser mais afastada, recebia autorização mais facilmente”, esclarece.
Distância que não incomodou a clientela. O historiador Rafael Dantas explica que, na época, o local era distante do centro e palco de poucas habitações, cenário ideal para quem não deseja ser visto. “A Paralela foi inaugurada em 74 e a Pinto de Aguiar surgiu como ligação para a Orla. Neste período, o local era pouco povoado. Só recentemente que observamos a construção de empreendimentos por aquele local.”
Posteriormente, surgiu o ‘quinto beatle’: Pegasus Motel, localizado mais próximo à Orla. Já ‘Rancho’ e ‘In Off’, empreendimentos voltados a um público mais “discreto”, ergueram-se nas pacatas ruas Sítio do Pombal e Manoel Antônio Galvão.
Alguém menos versado no universo sexual pode confundir a dupla, mas a função social de cada é bem diferente. O prostíbulo é voltado a quem procura a companhia de garotas de programa; já a casa de swing tem como público alvo casais e solteiros que buscam conhecer outras pessoas para, caso sintam vontade, envolverem-se sexualmente.
“Prostituição é veementemente proibida na ‘In Off’”, frisa Karina dos Santos, dona da “Melhor de Salvador”, como o local é conhecido. “É comum até garotas me procurarem em busca de trabalho. Como tenho contato com os donos do Rancho, encaminho todas para lá”, revela a empresária.
Frequentadores assíduos da boate, o casal Gemeoslibra aponta a localização como um dos diferenciais. "Estamos lá quase toda semana há anos e nunca presenciamos um incidente violento. É uma rua discreta, algo fundamental no meio liberal, mas também de fácil acesso pela proximidade com a Pinto de Aguiar", conta.
Assim como beijo na boca, motel para namorar pelado apenas com amantes é coisa do passado. É o que indica a pesquisa divulgada em 2022 pelo Guia de Motéis e pela Associação Brasileira de Motéis (ABMotéis). O estudo aponta que 71% dos do público assíduo (quem frequenta semanalmente) é formado por casais em relacionamentos sérios. Já entre os ocasionais (até quatro vezes por ano), o número escala para 85%.
Sabendo disso, os PHDs buscam se diferenciar, apesar de praticarem preços parecidos. O Dom – antigo Playboy/Playmotel, que teve de trocar de nome após disputa judicial com a revista masculina – aposta em visual de “hotel”, com as impolutas camas retangulares. Enquanto o 'Holly' é "raiz", com quartos vermelhos, espelho no teto e camas redondas.
Já Kama investe em quartos temáticos para atender, principalmente, os casais que buscam uma experiência diferente.
“As pessoas no geral não tem mais ‘vergonha’ de ir para motel. Hoje, a maioria faz reserva com nome completo, CPF, cartão de crédito… Esse é o perfil principal do nosso público. Deixamos os nomes fantasia como ‘Padaria do João’ no extrato do cartão de crédito mais como uma questão de tradição, por exemplo”, conta Samanta Vidal.