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Flavia Azevedo
Publicado em 1 de fevereiro de 2025 às 08:00
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Se padrinho é quem batiza - e batizar também significa “dar o nome” - a música baiana deve pedir bênção a Hagamenon Brito. Foi ele que, em 1987, criou a expressão Axé Music. Aqui, o jornalista explica por que foi “pejorativo” ao inventar o termo e fala sobre cada fase da cena, inclusive sobre aquela em que homens brancos e misóginos tinham todo o poder. Ele também lembra que Axé Music não é “música de axé”, afirma que Netinho foi o primeiro artista a se assumir com orgulho como “cantor de axé”, diz que Márcia Freire “sofreu muito em mãos de empresários” e lamenta que – entre polêmicas e disputas por engajamento - a comemoração dos 40 anos tenha virado “um sanatório geral”.>
Flavia Azevedo - A minha primeira pergunta é a que muitas pessoas se fazem: afinal, é “a” Axé Music ou “o” Axé Music”? >
Hagamenon Brito - É “a” Axé Music, como acontece sempre que há o sufixo inglês music. É só a gente pensar que é um rótulo musical como a disco music, a dance music, a reggae music e a soul music. O artigo combina com “music” e não com o adjetivo. Quando a gente fala “o axé” é no masculino, mas se você falar a expressão completa é no feminino. Não são os 40 anos “de” Axé Music, nem 40 anos “do” Axé Music. São 40 anos da Axé Music.>
F - Você já disse que criou o termo Axé Music de forma “pejorativa”. Eu queria que você explicasse o sentido disso, porque eu acho que as pessoas tinham humor em relação a esse “pejorativo” e agora falam quase como uma “denúncia”. Então, o que é o “pejorativo” com o qual foi criado o termo?>
HB - Eu acho que as pessoas já foram mais inteligentes e sagazes, né? Quando eu criei o termo Axé Music tinha uma ironia, era uma brincadeira. Axé era como a minha geração - roqueira influenciada pelo punk e pós-punk - se referia àquela estética e não àquela música. Hoje em dia falam que se referia à música e aos músicos. Mentira! A gente se referia à estética, que a gente considerava brega. Até hoje eu considero. Quando eu via os vídeos antigos de Luiz Caldas de pés descalços, com as roupas parecendo um hippie e com penas de pavão no brinco, achava brega. Eu achava Sarajane dançando, daquele jeito exótico, brega. Já falei isso pra ela, a gente dá risada.>
F - Naquele momento, era o auge do rock no Brasil?>
HB - O rock nunca foi tão popular no Brasil quanto foi de 1983 - quando surgem a Blitz e a Gang 90 - até 1995. O que a gente mais consumia, o que a gente dançava, o que tocava e vendia, era rock. Então, para um jovem crítico querendo mostrar serviço, aquilo era impossível. Achava brega mesmo, porque a gente era uma geração, digamos, tola, e isso é uma autoironia, porque eu sou autoirônico também. A gente queria estar em Londres, Salvador tinha sol demais, a gente se vestia todo de preto. De repente, aquela pessoa toda colorida em cima de um trio elétrico, cantando daquele jeito. Aí os roqueiros da época falavam “isso é coisa de axé”. E “de axé” porque tem uma música de Gilberto Gil, do disco “A gente precisa ver o luar”, de 1981, que se chama “Axé babá”. E a gente se incomodava, falava “isso é coisa de axé, de axé babá”. O que eu fiz? Eu peguei o termo “axé” e uni ao “music” para ironizar, brincando com o termo e com a pretensão daqueles artistas que queriam fazer sucesso até internacionalmente. Mas não com o peso que as pessoas falam hoje. Eu fui o primeiro a falar que foi criado dessa forma, pejorativamente, em uma entrevista a um grande crítico chamado Carlos Calado, da Folha de S. Paulo, naquele tempo.>
F - Na década de 1980, você sabia o que significa a palavra “axé” para as pessoas das religiões de matriz africana?>
HB - Eu sabia que era uma palavra Iorubá. Isso eu já sabia, mas não tinha um conhecimento profundo nem essa palavra tinha o peso cultural e religioso que tem hoje. Digo, na opinião pública porque para as pessoas das religiões de matriz africana essa palavra sempre foi muito séria. Eu sei que “axé” é uma coisa sagrada e respeito muito isso. Mas muita gente entende o termo Axé Music equivocadamente. Axé Music não significa música de axé. Se eu estivesse tratando a música dos terreiros de forma pejorativa, eu estaria, sim, debochando de uma coisa séria. Mas música de axé não é Axé Music, é outra coisa. Axé Music não é uma música sagrada, é uma música pop profana, de pegação, de cerveja, de Carnaval.>
F - A Axé Music - além de pop, profana etc - é também multiétnica? >
HB - Sim! Como é que a gente vai falar de Axé Music sem entender Dodô e Osmar na década de 50? O trio elétrico? Como sem entender tudo que veio antes? Dodô e Osmar não produziram algo afro-brasileiro. É uma música nascida eletrizada e com origem no frevo pernambucano. Naquele tempo nem tinha bloco afro. Então, o que eu acho que há hoje é um oportunismo, um revisionismo equivocado. Eu não estou ironizando o axé, a música de terreiro, pelo contrário, eu respeito muito. A minha formação é batista, mas eu tenho simpatia grande pelo Candomblé. Já jogaram búzios para mim, eu tenho amigos no (terreiro do) Gantois e amo saber que eu sou de Oxalá, de Iemanjá e de Oxum.>
F - Qual é o lugar do samba-reggae, essa música que vem dos blocos afro, na Axé Music? >
HB - O samba-reggae é a célula rítmica mais importante que a Axé Music produziu e está nesse caldeirão, mas ele não é o gênero mais importante na construção da história da Axé Music. Ele é um dos componentes. Do ponto de vista de representatividade afro baiana, sim, ele é o mais importante. O samba-reggae foi fundamental ali no início da Axé Music, gerou artistas muito importantes. Eu não posso esquecer, por exemplo, de uma coisa que passou e as pessoas pouco falam, que é a banda Reflexu´s, que fazia um samba-reggae mais estilizado e foi a primeira banda da Axé Music a vender 700 mil cópias de um álbum, pela EMI, no final dos anos 1980.>
F - Axé Music é um gênero, uma cena ou um movimento?>
HB - Originalmente, eu me referia a uma cena musical porque era um grande guarda-chuva que abarcava vários gêneros e vários ritmos. Assim como o rock tem várias tendências e estilos. Você diz “isso é metal, isso é punk, isso é balada, isso é folk”, mas tá tudo dentro da mesma coisa. Eu entendo Axé Music mais como cena e com o tempo eu acho que se transformou em movimento. Eu gosto quando falam hoje “o movimento da Axé Music”. Movimento parece uma coisa que foi pensada e planejada, que tem um texto que apresenta aquilo, como foi o Mangue Beat que tinha um texto de apresentação. A Tropicália praticamente tinha um texto de apresentação e era uma coisa que abarcava artes cênicas, artes plásticas. A Axé Music não teve isso, mas há uma estética que se consolidou com o tempo.>
Hagamenon Brito
JornalistaF - Leo Santana, Xanddy, Caetano Veloso, Gilberto Gil, a esquecida “lambada”. Tudo é ou foi Axé Music?>
HB - Do ponto de vista mercadológico, a gente pode dizer que Leo e Xanddy são, mas é uma liberdade poética. Eles não são. Eles são pagode, samba. Estão ali dentro da Axé Music mais na estrutura, na forma. Lambada não era Axé Music, mas uma hora também entrou no caldeirão. A banda Frutos Tropicais era baiana, e a Bahia toda cantou “eu vou enfiar uva no céu da sua boca” e Gilberto Gil também, e Ivete também, então teve uma hora que tudo fazia parte da Axé Music. Antigamente, Caetano e Gil gravavam singles compactos para tocar no Carnaval. Como é que a gente vai falar de Axé Music sem entender o que aconteceu com a música “Chuva, suor e cerveja”, em 1977?>
F - Por que neste ano comemoramos os 40 anos da Axé Music? Qual é o marco zero da cena?>
HB - O marco zero dessa cena - sobre o qual ninguém tem dúvida e que ninguém contesta - é o hit Fricote, do disco Magia, de Luiz Caldas, lançado em 1985.>
F - O primeiro disco do Chiclete, o Traz os Montes, saiu em 1982. Antes disso, a gente tinha Moraes Moreira. Os Novos Baianos colocaram o PA no trio elétrico e aumentaram o volume. Por que nada disso era Axé Music? >
HB - Porque as coisas têm um momento certo de acontecer e Luiz Caldas era o cara certo no momento certo. Não existia até então uma geração nova e uma musicalidade nova que formatasse isso e que unisse pessoas. Eram coisas esporádicas. O Carnaval de Salvador e essa musicalidade não tinham tanta força ainda. Luiz Caldas é uma confluência de coisas e naquele momento que ele surge é uma geração nova se apresentando. Não custa lembrar também que o termo só foi criado em 1987. Até então, é Luiz Caldas e a geração dele, é um ritmo novo, são as dancinhas acontecendo, mas não tinha a denominação.>
F - Qual a importância de “batizar”, nomear essa cena, ainda que, de início, como uma brincadeira?>
HB - Sem falsa modéstia, quando eu criei o termo Axé Music, eu dei identidade a uma geração. De outro modo, não sei como seria. Seria “músicos baianos” ou “música baiana”? Estariam talvez ofuscados para sempre pelo Tropicalismo, ou por outros artistas. Aliás, Carlinhos de Brown já disse isso e me agradeceu por eu ter criado esse termo, por ter dado identidade. Para o bem ou para o mal, eu dei identidade, e me orgulho disso.>
F - Eu queria te ouvir um pouco sobre o trabalho de Wesley Rangel, na gravadora WR. Também sobre Cristóvão Rodrigues que foi primeiro radialista a tocar Axé Music. O que essas pessoas significaram? >
HB - Ah, meu Deus... o Wesley Rangel - que era um gentleman, um homem gentil, educadíssimo - é pedra fundamental. Os músicos que participavam das gravações, o estúdio, tudo, ele foi fundamental para reunir. Como não falar dele? Como não falar de Alfredo Moura, que era o principal arranjador daquelas gravações? Eu tenho o maior respeito por Alfredo Moura, ele arranjou o disco que eu acho o número um da história da Axé Music, que é Feijão com Arroz, da Daniela Mercury, lançado em 1996. Cristóvão também é muito importante, as pessoas falam pouco dele hoje, mas na rádio Itapuã foi quem deu vazão àquilo tudo, era ele que tocava aquelas músicas. Falam mil coisas, que tinha jabá, que não sei o quê, mas eu acho que isso é irrelevante, não acredito nisso, e mesmo se houve eu acho irrelevante. O Cristóvão Rodrigues é fundamental na difusão inicial da Axé Music. Ainda temos que lembrar do Velho Guerreiro Chacrinha que popularizou a Axé Music, levando aqueles artistas para a TV Globo, nos anos 1980.>
Hagamenon Brito
JornalistaF - Então, no fim dos anos em 1980, temos a indústria implantada e a cena nomeada. Quem foram as primeiras pessoas que trabalharam já com consciência e assumindo a cena Axé Music?>
HB - Hoje em dia falam que ressignificaram o termo que eu criei de forma pejorativa, como se os artistas tivessem levado isso numa boa. Não foi bem assim. Eles passaram a aceitar quando esse termo foi adotado pela indústria. A indústria gostou porque é um termo pop bom e jornais como Folha de S. Paulo, Jornal do Brasil e O Globo passaram a usar também. Então, eu acho que o primeiro artista baiano a sacar isso e a usar a favor de uma forma ousada - e também irônica - se apropriando do termo, foi Netinho na fase da Banda Beijo. O quinto disco da Banda Beijo, que é de 1992, se chama “Axé Music: aconteceu”. Netinho é o primeiro artista da Axé Music a abraçar o termo e falar: “sim, nós somos isso”.>
F - Netinho que já anuncia uma outra fase da cena, que passa a mirar na “elite” de classe média branca, digamos... >
HB - Inclusive, na estética. Ele gostava de tênis da moda, de bermudas grandes, boné para trás de garotão americano. Netinho sacava um monte de música pop na época. Netinho gostava de Sting, gostava de The Police, eu conversava com ele. Isso me atraiu nele nas primeiras entrevistas, nos papos que a gente tinha. Era um artista com um conhecimento de cultura pop acima da média para a época. Ele teve problemas de saúde que atrapalharam a carreira, tomou posições políticas que atrapalham ele até hoje, mas eu acho que não se pode execrá-lo. Ele merece respeito e tem importância na história da Axé Music.>
F - No mínimo, Netinho estourou um dos maiores hits da Axé Music: Milla, de Manno Goes. Que eu estava escutando outro dia e prestando atenção na letra que remete ao imaginário daqueles meninos de classe média alta que faziam intercâmbio, estudavam nos melhores colégios particulares de Salvador. Isso também é raiz? (risos)>
HB - Aí já estamos falando da segunda fase da Axé Music, que é a Axé Music absorvida pela classe média. A letra fala disso. Manno é um artista da Graça de classe média alta, originalmente. Várias outras pessoas que formaram blocos na época são homens ricos. O nascimento da banda Eva foi desse jeito, a gente não pode esquecer dessas coisas que aconteceram para o bem e para o mal. A profissionalização da cena foi muito ligada a empresários brancos trabalhando com a Axé Music e fazendo festas para o público que podia pagar. A “pipoca” foi sendo deixada de lado, e você tinha que ter dinheiro para curtir o Carnaval. Esse talvez, tenha sido o começo da época mais branca da Axé Music. >
F - Então, enquanto se expandia, o negócio Axé Music também excluía?>
HB - Sim, a Axé Music foi se afastando das raízes, foi virando uma música para micaretas pagos pelo Brasil, para a classe média alta dos blocos, para o público mais elitizado. Nessa época, exportamos o know-how das festas carnavalescas que aconteciam durante o ano inteiro.>
F - Também fazem parte da história da Axé Music o racismo e o elitismo de blocos que selecionavam associados de acordo com cor de pele e endereço, barrando pessoas negras e de bairros periféricos? >
HB - Sim, né? Infelizmente, foi assim. Isso eu acho que também faz parte do começo da segunda fase da Axé Music que sai daquela fase meio ingênua ou, digamos, regional e exótica. Acaba a fase de Luiz Caldas, Sarajane, Laurinha e Ricardo Chaves (que pega duas fases), por exemplo, e começa essa fase do mercantilismo. Dos blocos, dos abadás e de uma coisa voltada para classe média que podia pagar. Eram mais os brancos que podiam pagar. Não era o cara da comunidade, não era o cara da rua, não era o cara do Pelourinho, não era o cara dos subúrbios, não era quem estava lá no início, na gênese da Axé Music.>
Hagamenon Brito
JornalistaF - Isso coincide com a “camarotização” do Carnaval?>
HB - Sim, e aí começa uma outra fase que demorou um bom tempo e que continua fazendo parte do cenário. Tudo foi ficando muito elitista e se afastando da coisa genial do começo e quando se afasta das suas raízes, você perde criatividade, você perde originalidade. Então, o samba-reggae foi ficando diluído, transformado num produto pra turista. Você vai vendo o empresariado formando grupos artificiais, quase boy bands. Você vai vendo isso tudo que é o apogeu e um dos elementos que resultaram na crise da Axé Music.>
F - Como eram os empresários dessa época? Como eram as relações com as bandas?>
HB - Eu me lembro, por exemplo, que fui entrevistar a banda Reflexu´s no auge, num hotel ali na rua Chile. Eu fiz uma pergunta para Marinês, a vocalista, e ela respondeu de modo inseguro. Aí, o empresário da banda, que eu não lembro o nome, falou assim: “ah, não leva em conta o que ela está dizendo, não, ela não sabe” . Eu fiquei chocado com isso. Como o empresário tinha esse poder de desmentir a própria vocalista e de modo grosseiro, diante da imprensa? Porque tinha. Aquelas bandas eram dos donos! A Axé Music tinha muito isso. A Cheiro de Amor, durante muito tempo, foi isso. Não sei como é hoje, mas pessoas como Márcia Freire sofreram muito em mãos de empresários.>
F - Márcia se negou, recentemente, a participar de um show comemorativo da banda.>
HB - Ela tem razão, ela sabe o que sofreu. Ela é uma das grandes vocalistas, ou a maior vocalista da história da Cheiro de Amor, ela era uma estrela da Axé Music. Ela foi dispensada de forma absurda, ela foi chamada de velha, ela foi trocada, porque era assim. Era misógino, era absurdo, mercantilista demais, o empresariado da Axé Music.>
F - Sobre a celebração desses 40 anos, a gente esperava todo mundo junto, confraternizando, se abraçando, mas de repente as animosidades roubaram o protagonismo, não? >
HB - Eu acho que virou um sanatório geral, não era para ser nada disso, né? Primeiro começou com uma declaração muito infeliz do ex-secretário de cultura do município de Salvador, que eu não conheço, mas tem uma história, tem uma carreira boa, mas ele foi muito infeliz. Ele me pareceu o branco que quer ser mais preto do que o preto que é do axé. Do axé num sentido do Candomblé. E aí que gerou essa história toda com a Claudinha (Claudia Leitte). Eu quero dizer primeiro o seguinte: eu acho que não se deve mudar letra de forma alguma. Se Chico Buarque compôs uma música que diz “esse cara tem me consumido”, eu acho que qualquer outro homem que for gravar isso deve cantar desse jeito. Se um cantor resolve dizer “ah, essa mulher tem me consumido”, eu vou achar muito estranho.>
F - Mas Claudia mudou a letra...>
HB - Enfim, Claudia mudou, mas eu acho que não é uma coisa grave a ponto de se fazer essa perseguição a Claudia. Eu acho que podia se discutir, mas a postura política que ela traz pesou muito nisso. Eu acho que nesse momento de identitarismo, de representatividade, de likes, de lacração, em que tudo vira polêmica, porque polêmica gera mais likes, a Claudia foi o bode expiatório, a ovelha expiatória loira – e evangélica - que as pessoas pegaram no pé.>
F - Esse bolo chamado Axé Music, ainda é um bolo grande, bem recheado, que dá para todo mundo ou virou um brigadeirinho?>
HB - Do ponto de vista mercadológico é um brigadeirinho. Eu acho que há um equívoco, era uma data que a gente pensava que podia ser comemorativa e de união, justamente para reposicionar a Axé Music, falar da sua importância na história da música brasileira e olhar para o futuro. Mas começaram a desunião, as brigas, as picuinhas... caíram nessa armadilha. A Axé Music tinha que se unir, comemorar e pensar sobre o que fazer.>
F - Qual é o futuro da Axé Music ?>
HB - A gente estar aqui tendo uma conversa como essa, tão rica, sobre essa cena, esse movimento, 40 anos depois da Axé Music surgir, só mostra a importância da Axé Music. Ela é uma cena que veio pra ficar, já está na história da música popular brasileira, produziu grandes artistas, transformou muita coisa em Salvador, economicamente inclusive. É uma música que permitiu a ascensão social de muitos profissionais, de toda uma geração, formou gente, construiu a indústria, deslocou o eixo do Rio/ São Paulo. Produziu grandes estúdios, grandes arranjadores, e a gente até pode falar que produziu a Ministra da Cultura, pois a Margareth (Menezes) é uma grande representante dessa cena, vindo do samba-reggae, do afro pop brasileiro. Então isso mostra grandeza e importância. Ao mesmo tempo, tudo é cíclico. Tudo pode ser grandioso, pode diminuir ou pode virar uma coisa apenas do passado. >
F - Então, a Axé Music pode acabar?>
HB - A Axé Music já não tem grande influência na era do streaming , não dialoga com a juventude. O que os jovens de hoje ouvem é funk, é trap, é sertanejo, e aqui na Bahia é pagodão e BaianaSystem. Para o futuro, a Axé Music tem que renovar, essa é uma coisa que eu falo há muito tempo. Já se passaram 20 anos, as últimas estrelas da Axé Music, digamos, realmente de brilho, foram o Saulo, um pouco, e principalmente a Claudia Leitte. São esses dois. E aqui eu estou falando de grandeza, de star quality, de gerar idolatria. Nós não temos mais artistas novos desse tipo. Então, corre o risco da cena ficar uma coisa do passado, porque a Axé Music envelheceu e não soube se renovar. A gente torce para que renove, para que surjam novos artistas. Isso seria bom pra gente, para a nossa cultura e para a nossa terra. Mas está demorando demais. >
QUEM É - Hagamenon Brito é jornalista, crítico musical e curador artístico baiano graduado em Comunicação Social pela UFBA. Criador da expressão "axé music", em 1987, trabalhou no Correio* entre 1993 e 2019, colaborou com publicações nacionais, produziu e apresentou os programas Black Soul e Sangue Novo, na GFM 90,1. Escreveu o livro de crônicas "E isso é apenas pulp fiction, homeboy" (2015). É flamenguista, pai do gato Leo DiCaprio e avô da bela garota Ami.>