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Flavia Azevedo
Publicado em 14 de abril de 2025 às 16:54
Você já sabe que moradores do bairro de Engomadeira (Salvador) e policiais militares têm diferentes versões sobre o assassinato de Ana Luiza Silva dos Santos, de 19 anos, que foi baleada ao lado de casa, na tarde de domingo (13). Vizinhos e família garantem que os PMs chegaram atirando e alvejaram a garota. Já os PMs afirmam que foram recebidos com tiros de bandidos e apenas reagiram. Resta esperar a perícia - que nem sempre é conclusiva - e assistir à batalha da palavra do povo contra a da polícia. Isso porque não há imagens gravadas do ocorrido. Lamento muito pela garota, abraço familiares e amigos. Sobre a verdade dos fatos, não sei se conheceremos um dia. >
O que eu sei é que o assassinato de inocentes é um trágico e recorrente resultado da guerra acontece na Bahia. Sei também que, se eu fosse uma policial, teria pavor de ser apontada como culpada por essas mortes, acusada de incompetente e assassina. Sim, acusações falsas podem ocorrer, principalmente no cenário caótico em que vivemos. Só que já temos tecnologia suficiente para desfazer qualquer mal-entendido. As câmeras de vídeo - próprias para instalação nos uniformes da polícia - existem, precisamente, para registrar ocorridos. Então, se é verdade que policiais agem dentro da lei – como dizem - por que eles mesmos não fazem questão de usar câmeras nos uniformes, todos os dias? >
Veja bem, eu não estava lá. Porém, cada um de nós tem o direito de interpretar fatos e pensar por si. No exercício desse direito, acho estranhíssimo que, com a disponibilidade dessa tecnologia, os profissionais que vão para confrontos com bandidos tão perigosos não façam questão absoluta de mostrar o quanto são heróis, nessa difícil rotina. Até pra valorizar a profissão esses vídeos serviriam. Imagine um documentário com essas imagens, a população entendendo os riscos e desafios vencidos pela Polícia Militar da Bahia? Isso não nos aproximaria? Não seria a oportunidade de nos fazer respeitar essa farda mais a cada dia? >
(As imagens preservam a identidade dos profissionais, se for esse o receio. Elas são gravadas do ponto de vista deles mesmos.)>
Mais um ponto: qualquer pessoa inocente anseia por provas da própria inocência. No caso do assassinato de Luiza, por exemplo, não adiantaria ninguém dizer que “os policiais chegaram atirando”, se o equipamento tivesse registrado que eles “foram recebidos com tiros”. Podia vir a comunidade inteira falar na televisão, mas as imagens do confronto estariam ali provando que quem matou a menina foi o bandido. Ou, no mínimo, que os tiros da polícia foram disparados diante de uma ameaça concreta e não por exibicionismo. Rapidamente, então, estaríamos todos entendendo a polícia e não acusando ou cheios de desconfianças mil. Percebe como o recurso protege quem anda na linha?>
A equipe envolvida na ação que resultou no assassinato de Luiza faz parte da 23ª Companhia Independente da Polícia Militar (CIPM) que, assim como a 9ª (Pirajá) e a 37ª (Liberdade), foram prioridade para implantação das câmeras, justamente pelo número de registros violentos nas áreas onde atuam. No entanto, uma fonte da PM afirma que há um grupo específico que não usa: “a equipe da ação que acabou com a jovem morta é o que chamamos de PETO (Pelotão de Emprego Tático Operacional da Polícia Militar da Bahia), que atua em situações mais críticas e não faz uso do equipamento”. A pessoa explica e eu fico mais confusa ainda.>
Se as situações são mais “críticas”, os policiais estão mais expostos. Então, pela segurança de todos, as ações não deveriam ser mais monitoradas, justamente por isso? A recusa de ter o trabalho registrado não seria sinal de que algo está errado? A tia de Luiza, Ana Ildes Pereira dos Anjos, 58, moradora do local, garante que sim. “Eles não tinham câmeras na farda porque são homicidas, vêm aqui para matar. Na maioria das vezes, a polícia chega atirando. Já é a segunda pessoa da minha família que eles tiram a vida. Anos atrás mataram meu irmão aqui sentado na mesma rua”, afirma ela. Acho que, pra contestar a fala dessa tia, a Polícia Militar da Bahia teria que explicar seus critérios. Bem direitinho. O espaço, aqui, está aberto pra isso. >