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Nilson Marinho
Publicado em 24 de março de 2025 às 05:32
Em 2015, a participação feminina no franchising — modelo de negócio em que uma franqueadora concede ao franqueado o direito de usar sua marca, como McDonald’s e Wizard, por exemplo — era de 46%. >
Passados quase 10 anos, a presença de mulheres superou a dos homens e, hoje, representa 57%, de acordo com a última pesquisa da Associação Brasileira de Franchising (ABF), divulgada em dezembro do ano passado. A participação feminina em posições de liderança também aumentou. Em 2015, apenas 19% delas ocupavam cargos como C-levels, gerência, supervisoras e membros de conselho, agora, elas são 29%.>
Lorena de Souza Mendonça, de 33 anos, é natural de Salvador. Ela atuou durante oito anos na empresa da família, um negócio do ramo de eventos, até que a Covid-19 chegou e mudou tudo — especialmente sua vida profissional. Com as restrições impostas para conter o avanço do vírus, os eventos foram suspensos, e restou a Lorena buscar um novo modelo de negócio.>
A escolha foi investir na franquia Arte em Papel, marca baiana conhecida por produtos de papelaria afetiva e presentes personalizados. A empresa, fundada por duas mulheres, as irmãs Maria Cláudia e Maria Cristina, começou a expandir seu modelo de negócios por meio de franquias em 2021. Aos franqueados, foram oferecidas oportunidades de franquia com investimento inicial de R$ 40 mil e retorno estimado entre 18 a 24 meses.>
"Em 2020, com a pandemia da Covid-19, o segmento de eventos teve um prejuízo enorme e, como a empresa era familiar, todo o rendimento vinha da mesma fonte. Diante da situação que enfrentamos durante a pandemia, resolvemos investir em outro segmento e, a partir daí, decidimos procurar por uma franquia que combinasse com a gente”, conta Lorena.>
A família amadureceu a ideia e escolheu Santo Antônio de Jesus, no Recôncavo Baiano, para abrir a franquia. A decisão foi motivada, em primeiro lugar, pelas raízes familiares na cidade e, em segundo, pela identificação de uma lacuna no mercado local para um negócio com esse perfil. A loja foi inaugurada em dezembro de 2021 e conta atualmente com quatro colaboradores — incluindo Lorena e seu esposo, que tocam o negócio de perto.>
“O mercado está aquecido, com muitas oportunidades interessantes de franquias. O mais importante, além do capital, é se identificar com o segmento escolhido, já que você vai participar ativamente de todo o processo. Os desafios são os mesmos para todos que trabalham com vendas. O comércio oscila bastante, é preciso matar um leão por dia. Temos que nos reinventar e prestar um serviço de qualidade. É fundamental saber administrar tanto os dias bons quanto os não tão bons e manter o lado financeiro do negócio em equilíbrio", orienta Lorena.>
Ainda de acordo com a pesquisa da ABF, atualmente, 51% dos colaboradores das operações franqueadas são mulheres. Já 32,2% das operações, próprias ou franqueadas, são dirigidas ou operadas por elas. Carla Oliveira é sócia da franquia Arte em Papel. Ela afirma que 90% da sua equipe é composta por profissionais do sexo feminino.>
“Esse aumento do interesse feminino em empreender se reflete muito positivamente para a Arte em Papel. Somos uma marca que conversa muito bem com o público feminino, tanto por ter já esse DNA quanto pelo perfil da loja. Acredito que é essencial para mulheres que desejam seguir esse caminho conhecimento, respeito pelas pessoas, valores bem definidos e a vontade de melhorar. A liderança se constrói a partir da confiança e respeito dos dois lados. É necessário saber o que se está fazendo, ter ideias claras e conversas honestas com sua equipe. Todos estamos no mesmo barco e todos são importantes nessa missão”, opina Carla.>
Para o economista e especialista em franchising, Diogo Dumet, a maior presença da força feminina no setor de franquias é reflexo de fatores culturais, sociais e comportamentais que vêm se consolidando há décadas. Segundo ele, o perfil mais organizado, seguro e comprometido das mulheres contribui para que o franchising se torne uma escolha natural para quem busca empreender com menor risco.>
“Como, em regra, a mulher é mais organizada e mais segura do que o homem, quando ela decide empreender, costuma optar pelo sistema de franquias. Por quê? Porque oferece mais segurança, menos risco, mais organização e conta com uma empresa dando suporte por trás. A própria pesquisa da ABF mostra isso. Não é só uma opinião minha — os dados estatísticos comprovam que esses são os principais fatores”, pontua.>
Dumet também faz um alerta para quem deseja ingressar nesse universo: empreender exige preparo, planejamento, análise de ponto comercial, projeção de resultados, cálculo de ponto de equilíbrio e definição de quanto precisa faturar para alcançar o que espera “Então, não empreenda por paixão. Não é porque você gosta de um produto que ele vai dar certo como negócio. As paletas mexicanas estão aí para provar isso. O produto era bom, mas nem por isso o negócio se sustentou. Procure um especialista para te ajudar a fazer essas contas. Se for comprar uma franquia, ele pode te orientar sobre qual é a melhor opção”, orienta o especialista.>
À frente de uma empresa que atua com formatação e expansão de franquias em nível nacional. Dumet diz que muitas dessas marcas são lideradas exclusivamente por mulheres — e várias são casos de sucesso. “É impressionante como a mulher tende a ser mais organizada, mais determinada, mais pontual. As empresas que têm mulheres na liderança — ou exclusivamente lideradas por elas — tendem a ter uma gestão e uma expansão mais eficientes”, finaliza.>
De acordo com a gestora do programa Sebrae Delas na Bahia, Rosângela Gonçalves, esse crescimento tem sido constante e expressivo nos últimos anos, acompanhando a evolução da participação das mulheres em diversos segmentos da economia. Ela aponta que as mulheres tendem a se concentrar em setores ligados ao consumo feminino, como beleza, estética, bem-estar, alimentação fora do lar, moda, acessórios e serviços relacionados à educação, cuidados domésticos e infantis.>
“Muitas mulheres optam pelo modelo de franquia justamente pela mitigação de riscos. Empreender, por si só, envolve muitos riscos. Mas no sistema de franquias, esses riscos já estão mapeados e são mais controlados. A franquia oferece uma estrutura consolidada, com suporte da franqueadora, treinamentos contínuos, estratégias de marketing definidas… tudo isso ajuda a reduzir riscos e aumentar as chances de sucesso.>
Construir um negócio do zero é desafiador. Por isso, muitas pessoas preferem empreender com soluções já estruturadas, com investimento definido e modelo testado. É um ambiente mais previsível e controlado — o que atrai muitos empreendedores, especialmente mulheres”, pontua.>
Apesar dos avanços, a jornada empreendedora feminina ainda esbarra em barreiras importantes. A gestora ressalta que muitas mulheres acumulam responsabilidades domésticas, o que limita o tempo e a energia dedicados ao negócio. Além disso, questões como estereótipos de gênero e dificuldade de acesso ao crédito ainda são entraves.>
“Ainda existe desconfiança quanto à capacidade de gestão das mulheres, o que dificulta seu acesso a oportunidades. É importante dizer que existem linhas de crédito diferenciadas para mulheres, e elas devem procurar as instituições financeiras para saber quais estão disponíveis. Porém, não há hoje uma linha de crédito específica voltada para mulheres que desejam atuar no franchising”, lembra Rosângela.>
“Ainda assim, acredito muito que a franquia é um modelo que oferece maior segurança para quem quer começar a empreender, principalmente porque reduz riscos. A franqueadora oferece suporte em marketing, gestão, operação, logística… todos os aspectos fundamentais da gestão já contam com apoio. Para mulheres que enfrentam jornadas extenuantes e sobrecargas de responsabilidades, esse modelo estruturado pode ser ideal para equilibrar os desafios de empreender com os outros papéis sociais que muitas vezes ainda lhes são atribuídos”, completa.>
O projeto Retadas é uma realização do jornal Correio com patrocínio da Tronox e apoio institucional do SEBRAE e da FIEB.>