Conheça a seleção 'no sigilo' que ajuda na diversidade e inclusão de empresas

Durante a entrevista, os candidatos às vagas surgem para os avaliadores como avatares de vozes distorcidas

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  • Nilson Marinho

Publicado em 11 de dezembro de 2023 às 05:00

É uma seleção de emprego, mas não uma seleção convencional, como costuma ser a maioria. Nessa, em especial, os avaliadores e os candidatos conversam de forma online, mas os recrutadores desconhecem as características físicas, o tom de voz e o verdadeiro nome da pessoa que aplicou para a vaga. Diante deles, a imagem do candidato se transforma em um avatar com voz robótica e com nomes de cidades e países aleatórios. As únicas coisas que devem ser levadas em consideração pelo setor de Recursos Humanos são as competências profissionais.

Esse tipo de avaliação inovadora é oferecida pela startup Jobcam, que possui uma plataforma de "seleção anônima". A empresa diz já ter ajudado nas seleções de mais de 100 grandes negócios que a procuraram para tornar os seus quadros de colaboradores mais diversos e inclusivos. Nessa lista estão a OLX, Bradesco e o hospital Sírio-Libanês.

Além do processo em que os candidatos são representados por avatares, a Jobcam propõe outras duas modalidades de avaliação: a entrevista pré-gravada anônima e o currículo anônimo. Na primeira modalidade, não é necessária a interação entre o recrutador e o profissional, pois a entrevista gravada é enviada ao gestor de forma não identificável, com a voz alterada. No formato do currículo anônimo, as informações pessoais dos candidatos são ocultadas, incluindo endereço, nome, instituição de ensino, focando exclusivamente na experiência e habilidades dos candidatos.

"Os vieses inconscientes são grandes problemas nos processos seletivos de qualquer empresa, seja ela grande, pequena, não inclusiva ou que levante a bandeira da diversidade. São preconceitos e avaliações que estão em nós, recrutadores, e que ocorrem de maneira não intencional e automática durante as entrevistas e que, frequentemente, impactam as decisões. Eles podem estar associados a características pessoais, idade, raça, orientação sexual e por aí vai", explica o consultor e especialista em Diversidade e Inclusão Fábio Pessoa.

"Sabemos que, no dia a dia, o ideal seria que apenas as competências profissionais fossem levadas em consideração na hora da escolha do profissional, mas não é assim que ocorre, são pessoas, avaliando pessoas, e estamos longe, mas em direção ao caminho para acabar com isso. Essa tecnologia seria primordial para ajudar nesse processo, mas nem toda empresa pode estar aberta para isso", opina o especialista.

Conforme uma pesquisa conduzida pelo InfoJobs, quase metade (48,7%) das pessoas com idades entre 17 e 60 anos, autodeclaradas como pertencentes a grupos sujeitos a discriminação, afirmam ter enfrentado algum tipo de preconceito durante entrevistas de emprego.

Ao questionar os participantes sobre as formas de discriminação que enfrentaram em processos seletivos, 31,7% mencionaram a discriminação étnica ou racial. Além disso, 19,3% relataram preconceito social, 14,1% discriminam pessoas por LGBTQIA+fobia, 12,3% por motivos religiosos, 8,2% devido a alguma deficiência, 5,4% por questões de gênero, e 9% optaram por não responder.

"A promoção da diversidade visa não deixar nenhum talento de lado. Uma pessoa com deficiência, por exemplo, pode ser o principal programador de uma empresa de tecnologia. Claro que uma das maneiras de reverter o quadro atual é aumentando o número de vagas destinadas a esta minoria. Contudo, abrir processos seletivos inclusivos não é a única medida necessária. A empresa e os funcionários precisam estar aptos a receber toda essa diversidade", diz Leizer Pereira, CEO da Empodera, plataforma de aceleração de negócios inclusivos.

Cammila Yochabell, CEO e fundadora da Jobecam Crédito: Divulgação

Segundo Cammila Yochabell, CEO e fundadora da Jobecam, a maioria das corporações que procura a "seleção anônima" é empresa de grande porte, mas as médias e pequenas têm demonstrado interesse em uma plataforma de publicação de vagas lançada pela startup focada para diversidade. "[...] o nosso módulo de publicação de vagas atende a mais de 50 empresas, e com um banco de quase 300 mil talentos de grupos subrepresentados diversos que se beneficiam gratuitamente e de forma justa dos processos seletivos", comenta.

5 dicas para tornar sua empresa mais inclusiva, por Leizer Pereira:

  • Readequação dos requisitos da vaga:

Há vagas com pré-requisitos estabelecidos que nem sempre são cruciais para o desempenho da função. Por exemplo, muitas empresas exigem inglês como critério de seleção. Mas, quantas vezes esse conhecimento é realmente essencial para o cargo? Este é apenas um exemplo de como certos requisitos podem

  • Sensibilização da equipe:

Todos nós, seres humanos, possuímos vieses inconscientes que, frequentemente, nos direcionam a padrões familiares. Isso pode nos levar a buscar o que consideramos "ideal" dentro de nossa zona de conforto, resultando na repetição de comportamentos e na escolha de perfis semelhantes na hora de contratar. Dessa forma, é essencial educar e sensibilizar as equipes sobre a relevância dos grupos historicamente marginalizados, como mulheres, negros, LGBTQIAPN+, indígenas, pessoas com deficiência e profissionais acima de 50 anos. Compreender a riqueza e o valor dessas inclusões é crucial. Além de adaptar mentalidades, as empresas devem refletir sobre suas estruturas e intensificar o compromisso com a diversidade. O desafio vai além de mudar mentalidades; é sobre tocar corações, se colocar no lugar do outro e repensar crenças arraigadas. O que se busca são ações genuinamente antidiscriminatórias.

  • Alinhe sua marca à causa:

Em meio à crescente ênfase no ESG (Ambiental, Social e Governança), é fundamental que as empresas adotem uma abordagem holística. Não basta promover processos seletivos específicos para profissionais negros se, ao longo do ano, não houver iniciativas consistentes que respaldem essa causa interna e externamente. Sem esse compromisso contínuo, o novo profissional pode sentir-se deslocado em um ambiente que, à primeira vista, transmite uma sensação de exclusão e hostilidade.

  • Integre plenamente os profissionais à equipe:

É vital proporcionar um ambiente onde cada indivíduo possa expressar sua autenticidade. Os colaboradores devem sentir-se empoderados para contribuir, ter uma voz ativa e estabelecer relações de confiança dentro da organização. Além de se verem como integrantes do espaço e cargo, é essencial que eles percebam a diversidade ao redor, com representantes de diferentes backgrounds atuando na empresa. Em processos seletivos focados em profissionais negros, é fundamental não apenas destacar as iniciativas da empresa em prol da diversidade, mas também incluir membros negros na equipe de recrutamento.

  • Compromisso contínuo com a diversidade:

É fundamental que a inclusão não pare no processo de contratação. Uma vez que os profissionais são integrados, a empresa deve garantir que haja programas de formação contínua, workshops e seminários que destaquem a importância da diversidade e inclusão. Isso ajuda os funcionários a se manterem atualizados sobre as melhores práticas e a entenderem as nuances dos desafios enfrentados por diferentes grupos. Além disso, criar grupos de afinidade ou redes de apoio para diferentes comunidades (por exemplo, uma rede de mulheres na tecnologia ou um grupo de apoio LGBTQIAPN+) pode fornecer um espaço seguro para discussão, colaboração e mentoria. Isso não só fortalece a cultura inclusiva da empresa, mas também demonstra um compromisso contínuo com a diversidade além da fase de recrutamento.