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Por que somos tão improdutivos?

Leia na íntegra texto de Jorge Cajazeira

  • J
  • Jorge Cajazeira

Publicado em 4 de janeiro de 2025 às 02:00

Neymar Júnior Crédito: Shutterstock

A última pesquisa sobre produtividade no Brasil, de acordo com o Portal da Industria, aponta para um crescimento do trabalho efetivo em 0,4% entre 2022 e 2023, sendo o primeiro resultado positivo desde 2019. É pouco pois a produtividade total da indústria brasileira acumulou uma queda de 1,2% entre 2013 e 2023, decorrente de uma redução de 16,5% nas horas trabalhadas e de 17,4% no volume produzido.

Por produtividade, os economistas apontam 3 fatores de produção principais para uma economia funcionar: capital (K); terra (T) e trabalho (L). Países que crescem e se desenvolvem realizam um bom arcabouço para integrar esses 3 fatores. Países como o Brasil, que tem dificuldade de aumentar seu nível de riqueza e diminuir a pobreza, alocam mal esses 3 fatores. Melhor dizendo, é a produtividade total desses fatores que pretensamente indica a eficiência com que a economia combina a totalidade de seus recursos para gerar produtos e serviços.

Para efeitos comparativos a produtividade de um país é calculada dividindo o Produto Interno Bruto (PIB) – simplificadamente, a soma de tudo que foi produzido no país – pelo número de horas trabalhadas.

É vergonhoso que, em 1980, a produtividade de um americano era equivalente a de três brasileiros ou 6,6 sul-coreanos? E que, agora, um americano passou a ser equivalente a quatro brasileiros, mas apenas dois sul-coreanos? Melhor dizendo, o trabalhador brasileiro leva uma hora para fazer o mesmo produto ou serviço que um norte-americano consegue realizar em 15 minutos e um alemão ou coreano em 20 minutos.

No levantamento por setores da economia, a agropecuária é a única que teve um aumento robusto de sua produtividade por hora trabalhada, no período entre 1995 e 2022 (+5,5% ao ano). Na indústria, a queda foi de 0,4% ao ano nesse mesmo intervalo, enquanto o setor de serviços cresceu apenas 0,2% ao ano.

Mas, afinal, por que isso acontece?

Quando se busca explicar as causas da baixa produtividade do Brasil, o atraso na educação aparece sempre no topo da lista. De fato, embora tenha registrado avanços importantes nos últimos 30 anos, especialmente na universalização do acesso à educação básica, o país não conseguiu traduzir essa expansão em qualidade do ensino.

Além da questão óbvia da educação, os outros vilões da baixa produtividade apontam para o sistema tributário caótico no Brasil, de enorme complexidade, e os sérios problemas na infraestrutura, precária e cara, que dificultam muito o aumento da produtividade.

Mas, penso eu, o fator cultural fartamente solidificado no Brasil é pouco analisado como causa da baixa produtividade que coloca o trabalhador brasileiro em um patamar inferior aos sul-africanos, colombianos e mexicanos, e só superior aos decadentes hermanos argentinos e os oprimidos venezuelanos. Senão, vejamos!

No serviço público brasileiro, é raro que a produtividade dos servidores seja recompensada, assim como a baixa produtividade penalizada. A ineficiência é frequentemente tolerada, e em vez de haver consequências para o desempenho insatisfatório, muitos servidores mantêm seus direitos assegurados e frequentemente protegidos judicialmente. Esse cenário contribui para perpetuar uma cultura de baixa produtividade e ineficiência no setor público. Um exemplo disso é o acúmulo de Licenças-Prêmio, um benefício que embora atualmente extinto, continua sendo usufruído por muitos servidores que acumularam o direito ao longo de suas carreiras. Esse benefício permite que servidores públicos federais, estaduais ou municipais tenham direito, a cada cinco anos de trabalho ininterrupto, a três meses de afastamento remunerado ou a converter esse período em tempo adicional para a aposentadoria.

Muitas vezes ficamos boquiabertos e invejosos do crescimento do PIB chinês. Em 2021, o governo da China anunciou oficialmente que a pobreza absoluta fora abolida no país, com 800 milhões de pessoas saindo da miséria durante as quatro décadas anteriores – uma realização que significou quase 3/4 da redução da pobreza mundial desde 1980, e que o Banco Mundial considerou “historicamente sem precedentes”.

Os visíveis avanços no céu de grandes cidades como Pequim, Xangai e Shenzhen, as vias abertas pelo “socialismo de mercado” só foram possíveis porque qualquer chinês entende o significado dos três números: “996”. Eles representam o regime de trabalho das 9 horas da manhã às 9 da noite, de segunda a sábado e que deixou nós baianos, campeões da ineficiência, indignados com a forma que os chineses trabalham para construir a BYD em Camaçari.

A visão brasileira de que é possível trabalhar menos e ganhar mais reflete uma percepção distorcida e distante do verdadeiro conceito de produtividade. Esse pensamento equivocado tem impactos significativos no país. De acordo com uma pesquisa do Datafolha, divulgada pelo jornal "Folha de S.Paulo", 64% dos brasileiros apoiam o fim da escala de trabalho 6x1. A maioria dos entrevistados prefere uma jornada de cinco dias por semana, com até oito horas diárias. Essa busca constante por mais direitos, acompanhada de uma menor preocupação com deveres e resultados, é um traço histórico em nossa cultura. Esse comportamento, a meu ver, contribui diretamente para a baixa produtividade da força de trabalho brasileira.

Já pensou o que um magistrado americano diria ao saber que, no Brasil, os juízes têm direito a 60 dias de férias anuais, além de um recesso de 15 dias no Natal? Mas parece que isso não foi suficiente. O Conselho da Justiça Federal (CJF) publicou uma resolução concedendo benefícios adicionais aos juízes federais de 1ª e 2ª instâncias. Segundo a norma, magistrados que acumularem funções administrativas ou processuais extraordinárias terão direito a um dia de licença para cada três dias de trabalho extra. Assim, a cada três dias com acúmulo de funções, o juiz ganha um dia de folga, podendo optar, alternativamente, por receber o pagamento proporcional.

Além disso, somos sempre inclinados a colocar a culpa pela nossa ineficiência em questões de gênero e discriminatórias o que sempre exclui uma análise quantitativa de produtividade e da geração de valor para a sociedade.

É muito justo, por exemplo, na minha visão que as mulheres reivindiquem salários equiparados aos homens. Porém, ninguém lembra que a produtividade está atrelada à remuneração, né?

Há mais mulheres desempregadas no Brasil, com a lei de licença-maternidade, do que em países onde não existem tais leis. Até que ponto as empresas devem ser responsabilizadas pelas escolhas individuais das pessoas? A licença-maternidade obriga uma empresa a pagar por uma funcionária ausente. A estrutura de uma empresa sente isto na produção e no trabalho dos outros. Por mais que seja um benefício socialmente justo, as empresas tendem a contratar menos mulheres para serem mais produtivas. É a Lei do Mercado. É a Lei da Produtividade.

A visão equivocada que temos sobre produtividade e eficiência no Brasil está refletida entre as questões do Enem 2020 que abordava a relação entre produtividade e salários, trazendo à tona a disparidade de remuneração entre homens e mulheres. Para ilustrar, o exame utilizou dois grandes nomes do esporte brasileiro: Marta e Neymar. Marta, eleita seis vezes como a melhor jogadora do mundo pela FIFA, não chega a ganhar sequer um décimo do salário de Neymar, que nunca conquistou o título de melhor jogador do ano. Por quê?

O Enem não enxerga a importância do VALOR na remuneração. Assim, quando uma instituição paga salários elevados a Neymar, espera obter um retorno financeiro proporcional. E, de fato, isso ocorre. Se Neymar não gerasse lucros significativos, não receberia valores tão altos. Por outro lado, Marta recebe menos porque, no mercado atual, sua capacidade de gerar lucro é muito inferior à de Neymar.

Por exemplo, o clube atual de Neymar, o Al-Hilal Saudi Football Club, vendeu 1 milhão de dólares em camisas em apenas um dia graças à sua contratação. Seu elevado salário não reflete uma "valorização do sexo masculino", mas sim a sua capacidade de gerar receitas. Em última análise, Neymar se paga com os lucros que proporciona. Já Marta, embora seja uma atleta excepcional, enfrenta um mercado menos lucrativo no futebol feminino, o que impacta diretamente sua remuneração.

Um bom crescimento da produtividade é essencial para que países emergentes, como o Brasil, consigam alcançar níveis de renda comparáveis aos dos países mais desenvolvidos. Os ganhos de eficiência geralmente estão relacionados a esforços de empresas e setores que investem em inovações tecnológicas, capital (ativos) e melhorias nos processos produtivos. No entanto, o Brasil enfrenta sérios desafios nesse aspecto.

Sistema tributário complexo, infraestrutura deficiente, desequilíbrios fiscais e desindustrialização são apontados por economistas como alguns dos maiores problemas econômicos do país. Além disso, o Brasil tem demonstrado dificuldades em se adaptar às mudanças estruturais decorrentes das transformações na indústria e em seus processos ao longo das últimas décadas.

A baixa produtividade é raiz da pobreza brasileira. Está nela a explicação para a renda per capita ter crescido mero 0,2% ao ano entre 2010 e 2023 e estar nos condenando à pobreza eterna. Ao invés de buscar benesses e mais benefícios precisamos gerar valor por meio de um trabalho mais produtivo.

O resto é papo-furado.

Jorge Cajazeira é Ph.D. em Administração pela FGV/EAESP e professor da UEFS.