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Jorge Cajazeira
Publicado em 9 de fevereiro de 2025 às 08:24
Passei as minhas férias nos Estados Unidos. Vou anualmente visitar meu amigo-irmão Beto Santamaria, ou “de Santa Maria”, como a gringalhada o chama. Este ano, visitei as Montanhas Rochosas, no Colorado. Um frio da zorra, mas, ainda assim, Aspen e Vail estavam cheios de brasileiros. Estava lá na posse de Donald Trump e vi diversas pessoas com bandeiras americanas e camisetas com a frase da campanha do republicano à presidência: "Make America Great Again". O slogan pode ser abreviado para MAGA e, em português, significa "Fazer a América Grande Novamente". >
Durante a corrida eleitoral de 2016, o ex-presidente Bill Clinton, marido da então candidata à Presidência, Hillary Clinton, sugeriu que o slogan de Trump possuía bases racistas e, até certo ponto, era elitista. Mas nada disso adiantou muito. Nem chamar Trump de racista, nem o apoio de celebridades mundiais como Jennifer Aniston, Brad Pitt e Leonardo DiCaprio à candidata democrata Kamala Harris.>
Trump ganhou de goleada. O presidente retornou à Casa Branca com uma série de conquistas que consolidam sua influência política. Em janeiro, ele reassumiu o cargo após garantir o melhor desempenho do Partido Republicano nas eleições em duas décadas, conquistando maiorias no Senado, na Câmara, nos governos estaduais e consolidando sua influência na Suprema Corte.>
Esse avanço reflete a mudança no apoio de segmentos-chave do eleitorado, como os hispânicos, que representam 15% dos eleitores e continuam crescendo. Trump conquistou o maior percentual desse grupo para um republicano desde 1976, segundo pesquisas de boca de urna.>
A campanha, marcada por um discurso duro contra a imigração, explorou divisões dentro da comunidade latina, diferenciando aqueles que se identificam como americanos dos imigrantes recém-chegados. Esse posicionamento ajudou Trump a reverter a tendência entre os homens latinos, que, após lhe darem uma derrota por 23 pontos em 2020, agora lhe garantiram uma vantagem de 12 pontos percentuais.>
O apelo à masculinidade também contribuiu para uma redução da desvantagem entre homens negros, resultando em um crescimento de cinco pontos percentuais entre os eleitores negros no geral. No Bronx, em Nova York, por exemplo, seu apoio quase triplicou, saltando de 38 mil para 92 mil votos em comparação com oito anos atrás.>
Mas como isso aconteceu? E quais as indicações que uma vitória tão avassaladora aponta para nós, brasileiros? Primeiro, vamos analisar os erros da esquerda americana no campo social.>
O exagero na política woke levou a uma imposição moral rígida que aliena parte do eleitorado. Por política woke, entende-se um conjunto de ideias e práticas progressistas voltadas para a justiça social, equidade racial, de gênero e outras pautas identitárias. O termo "woke", que originalmente significa "acordado" em inglês, surgiu dentro da comunidade negra nos EUA para indicar um estado de consciência sobre injustiças sociais, especialmente racismo e desigualdade. Com o tempo, o conceito se expandiu para abranger temas como direitos LGBTQ+, feminismo interseccional, políticas climáticas e diversidade corporativa.>
A esquerda, ao adotar radicalmente a pauta woke e tratar divergências como se fossem ignorância ou intolerância, cria um ambiente de censura e cancelamento que reforça a narrativa da direita sobre ataques à liberdade de expressão. Além disso, o foco excessivo em pautas identitárias desvia a atenção de questões econômicas e sociais mais amplas, afastando a classe trabalhadora e grupos que antes eram sua base de apoio.>
Essa abordagem também contribui para uma crescente polarização, reforçando divisões entre diferentes segmentos da sociedade. Ao apresentar a realidade política em termos de "opressores versus oprimidos", a esquerda gerou ressentimento e alimentou o tribalismo político, dando espaço para que a direita populista, cujo nome maior no mundo é Trump, se fortalecesse como defensora da "normalidade".>
Movimentos como "defund the police" (corte de verbas para a polícia) e discursos extremos sobre gênero, por exemplo, são amplamente impopulares e acabam prejudicando a aceitação de causas progressistas mais moderadas.>
Além disso, quando os discursos progressistas são apresentados de forma dogmática, tratando qualquer discordância como um sinal de ignorância ou má-fé, cria-se ressentimento e resistência, especialmente entre moderados e independentes. Com efeito, em alguns ambientes universitários e acadêmicos, adota-se uma postura de censura contra visões divergentes. Isso inclui o fenômeno do cancelamento, no qual indivíduos perdem oportunidades de emprego ou são socialmente excluídos por declarações do passado ou ideias não convergentes.>
Por fim, incoerências internas e contradições ideológicas minam a credibilidade da esquerda. Conflitos entre feminismo e pautas trans (em especial nas competições esportivas), bem como a defesa seletiva de regimes autoritários, criam um ambiente de desconfiança dentro do próprio movimento.>
No Brasil, para evitar que esses excessos se tornem um obstáculo político e eleitoral, a esquerda precisa equilibrar sua agenda de justiça social com um compromisso genuíno com a liberdade de expressão e um foco pragmático em questões de interesse amplo da população.>
Já no campo econômico e político, há uma convicção equivocada na militância de esquerda americana de que a política e a economia são questões distintas e têm pouca relação entre si. A principal manifestação dessa ideia no discurso de Biden/Kamala é a defesa do “socialismo democrático”. Ou seja, de um lado, condenam-se as restrições à liberdade individual, como na China e na Rússia, e, ao mesmo tempo, aplaudem-se as benesses sociais criadas por um Estado paternalista.>
Milton Friedman, um dos economistas mais influentes do século XX e inspirador da política econômica de Donald Trump, defende em seu livro "Capitalismo e Liberdade" (1962) que o capitalismo de livre mercado é essencial para a liberdade individual e para a prosperidade econômica. Ou melhor, só existe liberdade se for garantida por um mercado livre de interferências excessivas do governo, e isso é uma condição necessária para a liberdade política e social.>
Nos Estados Unidos, não há SUS, nem garantias de emprego e nem as benesses dos funcionários públicos brasileiros. Mas quanta gente faz fila na fronteira do México e se arrisca pelo deserto para chegar ao sonho americano. Não é incoerente que ninguém faz isso para imigrar para o Brasil?>
As ideias do modelo econômico preconizado pelos republicanos ensinam a nós, brasileiros, que a redução da intervenção estatal, o livre mercado e a responsabilidade fiscal são fundamentais para o crescimento econômico e a liberdade individual.>
No Brasil, o governo tem um peso excessivo na economia, com burocracia, altos impostos e estatais ineficientes. Para estimular a prosperidade, o país deveria privatizar setores problemáticos, como os Correios e demais estatais improdutivas, reduzir regulações e manter uma política fiscal responsável para evitar inflação e déficits. Além disso, políticas sociais deveriam ser reformuladas para incentivar o trabalho e a autonomia dos cidadãos, em vez de criar dependência do Estado.>
Menos governo e mais liberdade econômica resultam em maior inovação, geração de empregos e crescimento sustentável. >
Jorge Cajazeira, é Ph.D. pela Fundação Getúlio Vargas (EAESP), consultor empresarial e professor efetivo da Uefs>