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Publicado em 24 de março de 2025 às 05:00
O ex-presidente Jair Bolsonaro tem perguntado aos jornalistas quais seriam os crimes pelos quais é acusado. Ao questionar, implicitamente afirma que não haveria qualquer acusação ou, pelo menos, nenhum delito relevante. É uma indagação que precisa ser respondida com clareza, uma vez que a população não é obrigada a conhecer conceitos jurídicos. >
Primeiro cabe distinguir acusação de investigação, processo de inquérito. Investigações são buscas de indícios relevantes da existência de um crime e da sua autoria. A forma mais comum é o inquérito conduzido pela Polícia. Bolsonaro é investigado, ou seja, apontado pela Polícia como possível autor de diversos crimes. >
A Policia Federal colhe elementos aptos a comprovar que ele teria falsificado documentos e se apropriado de bens preciosos do Estado, já tendo vendido alguns e ficado com o dinheiro. Alguns dos elementos de prova colhidos são conhecidos. A Receita Federal flagrou um dos auxiliares do ex-presidente tentando ocultar bens públicos. Testemunhas próximas a ele confirmaram a operação e a entrega em dinheiro vivo para o ex-presidente. Além disso, após a história chegar à imprensa, o seu advogado da época viajou às pressas aos Estados Unidos, para recomprar alguns dos bens públicos vendidos em privado. >
Bolsonaro ainda não foi acusado por aqueles delitos. Os inquéritos não foram encerrados. Mas, ele já é oficialmente acusado, e não apenas investigado, por muitos outros crimes: 1) liderar uma organização criminosa armada, 2) tentar de abolir violentamente o Estado Democrático de Direito, 3) dano qualificado pela violência e grave ameaça e 4) deteriorar patrimônio público tombado. Nesse caso já há um processo judicial.>
PF e o MPF concluíram que Bolsonaro elaborou e pôs em prática um plano para 1) fazer a população não acreditar nas eleições, voltando-se contra o Poder Judiciário, 2) evitar que eleitores contrários a ele votassem, 3) estimular revolta e desordem, 4) prender e matar autoridades, criando caos no país, para, 5) com apoio do exército, ignorar a sua derrota eleitoral e permanecer no poder pela força das armas, ainda que contra a vontade da maioria da população. Tudo em conjunto com militares de alta patente, ministros de Estado e diretores de órgãos policiais, entre outros.>
Há elementos de prova muito importantes. O próprio Comandante do Exército e o Comandante Aeronáutica nomeados por Bolsonaro, confirmaram à polícia as acusações. Contaram que Bolsonaro sabia o tempo inteiro que mentia sobre as urnas eletrônicas e os pressionou insistentemente para que o apoiassem no golpe de Estado que tramava. >
Além de testemunhas tão relevantes, há vídeos de reuniões ministeriais, declarações públicas do ex-presidentes e muitos documentos. Mensagens trocadas por policiais comprovam que houve uso da Polícia Rodoviária Federal para tentar impedir que eleitores contrários a Bolsonaro votassem. Outras comprovam que ele e seus aliados sabiam o tempo inteiro que não havia nada de errado com as urnas eletrônicas e mentiam deliberadamente. Por fim, Planos de Golpe de Estado foram encontrados nos celulares, residências, gabinetes e agendas de militares, membros do governo e do Partido. >
Os documentos revelam que eram planejados os assassinatos do Presidente do Superior Tribunal Eleitoral, do Presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva e do vice-presidente eleito Geraldo Alckmin. Assim, seria criada a convulsão social e o país estaria acéfalo, abrindo caminho para o golpe. O plano tinha o nome de “Punhal Verde Amarelo”, mal disfarçando a inspiração na “Noite dos Longos Punhais”, quando nazistas praticaram atos de extrema violência na Alemanha, criando a sensação de desordem, para ampliar o próprio poder. >
A Polícia Federal demonstrou que havia um agente infiltrado pelo grupo na equipe de segurança de Lula a e que a operação de assassinato do Presidente do Superior Tribunal Eleitoral chegou a ser iniciada. A troca de mensagens revela que os agentes já estavam a postos, armados, em pontos estratégicos, dependendo apenas que o ex-presidente conseguisse convencer o Comandante do Exército a aderir, para consumar o ato homicida contra o ministro.>
Nos telefones celulares dos acusados, mensagens mostram que a operação ficou sob a responsabilidade de militares conhecidos como Kids Pretos. Recebeu o nome de Copa 2022. Sob o disfarce de referência ao torneio de futebol, estava uma alusão à sigla COPESP, o Comando de Operações Especiais do Exército, sediado em Goiânia onde foram treinados os agentes. Mas aludia também à palavra Coup, que significa justamente Golpe de Estado. >
Depois da conclusão da investigação, o próprio ex-presidente já deu declarações públicas em que confessa parte dos fatos narrados na denúncia e nos inquéritos, embora diga que não seriam ilegais. O processo não acabou, logo Bolsonaro não foi ainda condenado. Mas, a essa altura, podemos responder à indagação que ele tem repetido, afirmando que é, sim, acusado de muitos crimes e que os inquéritos nos quais foi indiciado são bastante robustos. >
Agora, se a participação em um plano que envolve o assassinato de autoridades, a disseminação de mentiras, o impedimento de que pessoas votassem e um Golpe de Estado constituem crimes graves, eu prefiro nem discutir.>
Rafson Ximenes, Defensor Público>