Padê e xirê: tradições do candomblé abrem os caminhos do Gandhy

Atos religiosos são realizados na abertura da folia carnavalesca para pedir proteção ao afoxé e aos foliões que desfilam nas ruas

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  • Larissa Almeida

Publicado em 26 de janeiro de 2024 às 07:00

O padê para Exu é feito desde a fundação do Afoxé, pedindo caminhos abertos e paz na avenida
O padê para Exu é feito desde a fundação do Afoxé, pedindo caminhos abertos e paz na avenida Crédito: Marco Aurélio Martins/Arquivo Correio

Na preparação para o Carnaval, o Afoxé Filhos de Gandhy costuma realizar ensaios e praticar novos arranjos em eventos, que ocorrem ao longo do ano, com o intuito de deixar tudo pronto para os dias em que desfila com seu Tapete Branco. Mas, para os associados, de nada vale toda a preparação técnica, se não houver, antes, seus tradicionais rituais candomblecistas para garantir a abertura de caminhos e proteção durante a festa momesca. Não observar as tradições, inclusive, coloca em risco o próprio desfile.

A forte relação com a religião de matriz africana tem origem na formação da agremiação. Para honrar Exu, o orixá que comanda as ruas e abre caminhos, o Afoxé não sai da sua sede, na Rua Gregório de Matos, no Centro Histórico, sem antes fazer o padê no Largo do Pelourinho. “A origem do Gandhy está vinculada com a ancestralidade africana e com a religiosidade do candomblé. Então, fazemos o padê, pedindo calma a Exu”, afirma Gilsoney de Oliveira, presidente do Afoxé Filhos de Gandhy.

O ritual do padê conta com a preparação de uma farofa para o orixá, bem como a entoação de cânticos em  homenagem. Os religiosos levam a quartinha – representação do orixá na Terra – e a farofa, e acendem uma vela. “Fazemos o despacho no Largo do Terreiro de Jesus. Pedimos permissão para esse orixá, que comanda as ruas, permita a nossa saída e mantenha nossa paz”, diz Gilsoney.

Depois do pedido feito a Exu, os associados seguem rumo ao primeiro desfile. Na saída da Praça Castro Alves, o segundo ritual, que é repetido em todos os dias de apresentação, é realizado pela primeira vez: o xirê. “É a comunicação que nós fazemos com os orixás. É muito importante e vale a pena acompanhar, sentir e se emocionar”, garante Antônio Carlos Carvalho dos Santos, babalorixá do Afoxé Filhos de Gandhy.

Conhecido como Pai Toinho, o sacerdote candomblecista faz questão de acompanhar os dois rituais durante os dias de Carnaval, sob alegação de que se trata de obrigações espirituais com o bloco. Por parte dos demais associados, a responsabilidade religiosa consiste no canto para todos os orixás. Tradicionalmente, inclusive, as três músicas do repertório são dedicadas a eles, enquanto uma grande roda – semelhante a roda de samba – se forma entre aqueles que extrapolam o canto e manifestam a fé e o pedido de paz ,através da dança, sob o ritmo do agogô.

O maestro da banda Alef Patrick, de 30, faz parte dos Filhos de Gandhy há 18 anos. Ele, que entrou tocando percussão, conta que o longo tempo dedicado ao afoxé não diminui a emoção e tão pouco a sensação de apogeu toda vez que o Carnaval se aproxima. Ainda diz que os cantos aos orixás, um dos pontos altos dos desfiles, já tem uma ordem definida. “Cantamos para todos os orixás no ritmo do afoxé. Vamos dos cantos de Ogun, Obá, Logun Edé e encerramos com Oxalá”, finaliza.

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*Com orientação da chefe de reportagem Perla Ribeiro