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Estadão
Publicado em 14 de novembro de 2023 às 09:14
Os 32 brasileiros resgatados da Faixa de Gaza chegaram em Brasília, onde foram recebidos pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O pouso, no final da noite desta segunda-feira, 13, encerrou a longa espera pela repatriação do grupo que ficou mais de um mês retido no enclave onde Israel trava uma guerra contra o grupo terrorista Hamas.
Após o desembarque, Lula declarou que esse foi o "coroamento de um trabalho sério do governo". O presidente então passou a palavra para os repatriados, que falaram sobre a tensão vivida ao longo do último mês. Após ouvir os relatos, o presidente acusou Israel de "terrorismo".
"Se o Hamas cometeu um ato de terrorismo, o Estado de Israel está cometendo mais um ato de terrorismo ao não levar em conta que as crianças não estão em guerra, que as mulheres não estão em guerra. Ao não levar em conta que eles não estão matando soldados, eles estão matando junto crianças", disse Lula. "São mais de 5 mil crianças, tem mais de 1.500 crianças desaparecidas que certamente estão no meio dos escombros", acrescentou.
O presidente nunca tinha feito tal comparação. Antes, ele e seu assessor especial, Celso Amorim, usaram a palavra "genocídio" para se referir à ação militar de guerra de Israel, em resposta aos ataques terroristas do Hamas.
O PT, partido de Lula, equiparara os atos do Hamas ao de Israel. O partido dissera que condenava "assassinatos e sequestro de civis, cometidos tanto pelo Hamas quanto pelo Estado de Israel, que realiza, neste exato momento, um genocídio contra a população de Gaza, por meio de um conjunto de crimes de guerra"
Lula afirmou que nunca viu uma violência tão "bruta e desumana" contra inocentes. Revelou que tenta um telefonema com o presidente da China, Xi Jinping. Ele disse que é necessário "cobrar dos outros presidentes um comportamento humanista, de afeto com crianças e mulheres".
Sem citar o premiê israelense, Benjamin Netanyahu, Lula afirmou que "parte dos seres humanos que governam o mundo de humanos não têm mais nada". "Se alguém não tem dó de soltar uma bomba para matar gente no hospital, recém-nascido, criança, sinceramente não sei que ser humano estamos falando", afirmou o presidente.
As manifestações de Lula coincidem com críticas também mais eloquentes dos governos da França e dos Estados Unidos, vistos como aliados de Israel. Tanto Paris quanto Washington manifestaram preocupação pelo excesso de mortes em Gaza, principalmente mulheres e crianças. A fala de Lula ocorre após atritos do governo com o embaixador israelense em Brasília, que se encontrou com o ex-presidente Jair Bolsonaro.
O ministro Mauro Vieira (Itamaraty) afirmou que as embaixadas na região seguem mobilizadas para encontrar brasileiros na região, que possam querer retornar ao Brasil, e que o País ainda considera viável estabelecer uma pausa humanitária para saída de estrangeiros, feridos e reféns.
Drama dos brasileiros em Gaza
O desembarque foi marcado pelo encontro de Mohamned Jaber com a mulher e os filhos, que estavam na Faixa de Gaza. Abraçada ao pai, a pequena Lin contou que se assustou "ao ver as pessoas mortas" e que agora o sentimento é de alívio: "sinto que estou chegando em uma cidade maravilhosa".
A menina de 11 anos estava em Gaza com a mãe Ahmalad e com os irmãos Ahmad e Anas de 11 e 13 anos. "Eles estão com muito medo e não querem voltar para lá", disse Jaber, que há cinco meses não via as crianças pessoalmente e foi recepcioná-los na pista da Base Área de Brasília, onde os abraçou intensamente: "o mais importante e que eles chegaram aqui vivos". Durante os 37 dias em meio à guerra, os filhos ficaram sem água, sem energia e sem comida. Além disso, a comunicação com a família era difícil, relatou Jaber.
Ahmalad, a mulher dele, disse que estar feliz por chegar em segurança no Brasil. "Não tem mais vida em Gaza. Está muito perigoso ficar lá", afirmou a mulher, que fala apenas árabe.
Apesar do alívio em reencontrar a mulher e os filhos, Mohammed Jaber ainda tem quatro irmãos, sem opção de sair do enclave e teme pelo que está por vir. "O futuro de Gaza vai ser muito difícil. Reconstruir Gaza vai demorar. Metade de Gaza está destruída", disse ele.
Além do trauma, os brasileiros resgatados em Gaza também sofreram com restrições de alimento e água em mais de um mês de guerra. Duas crianças chegaram ao Brasil com um quadro de desnutrição e receberam atendimento médico imediato após o desembarque em Brasília, nas ambulâncias que foram mobilizadas para a pista da Base Aérea.
Profissionais de saúde das Forças Armadas que acompanharam o grupo disseram que o estado deles, em geral, é bom e estável. As crianças, no entanto, tiveram problemas como virose e amidalite. Todos precisam de acompanhamento porque passaram por estresse e estavam com alimentação e água restritas.
Quatro dos repatriados tem a capital federal como destino final, 24 vão para São Paulo, sendo que a metade será levada para um abrigo no interior do Estado e a outra metade vai para casa de familiares. Mais dois vão para Florianópolis (SC), um para Novo Hamburgo (RS) e um para Cuiabá (MS).