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Saiba por que Bolsonaro venceu em cidade onde índios brigam por 600 fazendas

Buerarema é um dos quatro municípios baianos em que o candidato do PSL ganhou nas urnas

  • Foto do(a) author(a) Mario Bitencourt
  • Mario Bitencourt

Publicado em 29 de outubro de 2018 às 11:01

 - Atualizado há 2 anos

. Crédito: Foto: Divulgação

Dentre as quatro cidades baianas onde Jair Bolsonaro venceu nas urnas neste domingo (28) está Buerarema. No primeiro turno, o município do Sul baiano esteve ao lado de outros cinco no estado em que o candidato do PSL também saiu vitorioso. Lá, uma das bandeiras levantadas por Bolsonaro foi decisiva nessa escolha: “Não vai ter um centímetro demarcado pra reserva indígena”, defendeu o então candidato e agora presidente eleito. 

Foi mentalizando essa frase, dita numa palestra no Clube Hebraica, no Rio de Janeiro, em 3 de abril de 2017, que boa parte dos eleitores de Buerarema foi às urnas ontem. Dos 12.209 aptos a votar, 8.501 tiveram votos válidos. Desse montante, 4.698 (55,26%) foram para Bolsonaro e 3.803 (44,74%) para Fernando Haddad.

A frase circula na internet em vídeo em que Bolsonaro faz declarações também contra a demarcação de territórios quilombolas – descendentes de escravos. Ela foi usada tanto para atacar o candidato do PSL, acusando-o de racismo e discriminação, quando para enaltecer suas posições contra a distribuição de mais terras para índios e quilombolas, o que agradou a agricultores, como os de Buerarema. Buerarema: Bolsonaro teve 55,26% dos votos válidos (Foto: Divulgação) Na cidade de 18.391 habitantes reina em muitas pessoas a esperança de, com Bolsonaro eleito, terem suas propriedades de volta, depois de uma onda de ocupações indígenas, ocorridas entre 2012 e 2014, numa área conhecida como Serra do Padeiro.

Com as terras ocupadas pelos índios, Buerarema assistiu a queda do comércio local, que era movimentado, sobretudo, por pequenos produtores de cacau, mandioca, banana e abacaxi, principais culturas desenvolvidas na região.

Com as propriedades ocupadas e a repulsa pelos índios em Buerarema, a cidade viu parte do movimento migrar para cidades como Una e São José da Vitória, onde os índios se sentem mais aceitos e podem negociar os alimentos.

Agora, em Buerarema, a renda vem basicamente de aposentados, proprietários de terra com áreas fora da zona de conflito, servidores públicos e dos 2.149 beneficiários do Bolsa Família, que devem receber um total de R$ 2,7 milhões até o final do ano.

“É isso que movimenta o comércio hoje. Antes, os produtores rurais sempre estavam por aqui, comprando, fazendo negócios. Não era muita coisa, mas movimentava a cidade”, disse um comerciante que se apresentou apenas pelo apelido, Tibiriçá.

O comerciante é um dos 3.830 eleitores que escolheram Bolsonaro no primeiro turno, quando o candidato do PSL obteve 46,46% dos votos válidos. Haddad não ficou muito longe: teve 3.026 votos (36,71%).

Mas nenhum petista venceu em primeiro para senador, deputado federal ou estadual em Buerarema, e a diferença entre os candidatos ao governo foi maior: José Ronaldo, do DEM, teve 4.040 (54%) e o governador Rui Costa (PT, reeleito), 3.151 (42,79%).

Sem abertura O prefeito Vinícius Andrade Oliveira atribui o antipetismo na cidade também ao seu trabalho na oposição ao governador Rui Costa, de quem disse ter tentado se aproximar logo após ser eleito, mas não viu abertura. Prefeito Vinícius Andrade diz que tentou se aproximar do governador Rui Costa, mas não encontrou abertura (Foto: Divulgação) “Fui a vários eventos do governador no Sul e no Extremo Sul, mas nunca tive sequer dois minutos de conversa com ele. É aquela coisa, quando alguém não dá valor, temos de buscar quem nos dá”, disse o gestor de 32 anos, que se amparou em deputados.

Segundo Oliveira, Buerarema não recebe uma obra importante desde a última gestão de Paulo Souto como governador, de 2003 a 2006, quando o PT entrou no poder no governo da Bahia, com o hoje senador eleito Jaques Wagner.

Na época, Souto realizou uma obra de qualificação da feira, mas não foi bem aceita pela população local porque tinham de ser seguidas regras da Portaria 304/96 do Ministério da Agricultura, que regula o abate e o comércio de carne bovina.

“Fomos esquecidos tanto pelo governo federal quanto estadual, sob o comando do PT. Então, o sentimento aqui é de não acreditar mais nesse partido e ser a favor de quem está contra ele. Não reconhecemos um governo que não reconhece Buerarema”, disse.

A cidade está entre seis dos 417 municípios da Bahia onde Bolsonaro ganhou no primeiro turno – as outras vitórias ocorreram nos municípios de Itapetinga, Luís Eduardo Magalhães, Itabuna, Teixeira de Freitas e Eunápolis.

O resultado deste ano seguiu a votação das eleições de 2014, quando Buerarema foi a única cidade da Bahia a dar a vitória em Aécio Neves (PSDB), com 66,63% dos votos válidos, contra Dilma Rousseff (PT), que teve 25,74%.

No município cujo nome significa “madeira fedida” na língua indígena tupi, a última vez que um petista teve moral foi nas eleições para prefeito de 2008, vencida pelo médico Mardes Lima Monteiro de Almeida, mas ele perdeu a eleição seguinte.

O professor universitário Leandro Nascimento, 28, foi um dos eleitores de “dr. Mardes” em 2008 e que hoje tomou aversão ao PT.“A questão aqui é que a possível demarcação afetou a economia da cidade, as pessoas têm repulsa a isso”, afirmou.Início do problema No primeiro ano da gestão de “dr. Mardes”, em 2009, ocorreu o fato originário do problema atual: a Fundação Nacional do Índio (Funai) publicou no Diário Oficial da União o relatório de delimitação da terra indígena Tupinambá, com 47.376 hectares.

As ocupações de terras por parte dos índios, no entanto, só vieram a se intensificar no final de 2012 – os índios chamam essas ocupações de “retomadas” por entenderem que estão “retomando” o território tradicional habitado pelos antepassados deles.

Elas foram realizadas como forma de pressionar o Ministério da Justiça a publicar a portaria declaratória do território delimitado pela Funai, o que ainda não ocorreu. Além de Buerarema, a área indígena abrange partes das cidades de Una e Ilhéus.

Há cerca de 600 fazendas na área que os índios reivindicam. A Funai estima que cerca de 80% do território delimitado esteja com os Tupinambás, o que resultou no abandono das fazendas por parte dos proprietários.“Os proprietários estão com esperança de ter a terra de volta. A principal demanda da cidade é esta, pois sabemos que com a terra a nossa economia local volta ao que era antes, e que estava bem melhor que hoje”, disse o professor Leandro Nascimento.Na região, ainda se guarda na memória a época em que os conflitos entre índios e proprietários de terra (a maioria pequenos produtores com áreas de 10 a 15 hectares) se intensificaram de forma grave, no final de 2013, quando foi preciso o governo federal enviar tropas da Foça Nacional.

O saldo, entre 2012 e 2014 (quando os conflitos pararam) foi de quatro índios mortos, um trabalhador rural ferido a bala que ficou paraplégico, carros do governo federal e estadual incendiados e prédios públicos e particulares depredados em Buerarema.

“Vimos, por mais de uma vez, a cidade se transformar numa praça de guerra, e o governo do PT sem tomar nenhuma providência sobre as demarcações”, disse o vice-presidente do Sindicato dos Produtores Rurais de Buerarema Elizeu Nascimento.

De acordo com Nascimento, parte dos proprietários de terra cujas áreas foram ocupadas pelos índios possuía apenas aquele meio de sustento. “Com as ocupações, muita, muita gente deixou a cidade”, afirmou.