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Carolina Cerqueira
Publicado em 20 de abril de 2022 às 05:00
- Atualizado há 2 anos
A Bahia possui 91 entidades filantrópicas que prestam atendimento pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Dessas, 52% estão endividadas, ou seja, encerraram o ano de 2021 com déficit financeiro. Nos últimos 5 anos, 11 fecharam de vez as portas no estado. As informações são da Federação das Santas Casas de Misericórdia, Hospitais e Entidades Filantrópicas do Estado da Bahia (Fesfba). Dentre as instituições em crise estão as Obras Sociais Irmã Dulce (Osid), que lançaran na segunda (18) uma campanha para arrecadar doações, o Hospital Infantil Martagão Gesteira e o Hospital Aristides Maltez, referência nacional em tratamento de câncer. >
A presidente da Fesfba, Doraides Nunes, aponta que aquelas entidades que não fecharam enfrentam outras consequências da crise, como corte de funcionários, serviços e materiais. Conforme a situação aperta, as instituições se veem obrigadas a recorrer a empréstimos e, assim, o déficit só faz crescer. Os repasses do SUS deveriam cobrir 100% dos custos dessas unidades, mas, na prática, não é o que acontece. Essas verbas são dadas pelo Ministério da Saúde ao governo do estado; este, por sua vez, repassa aos municipios. O repasse às entidades podem ser feitos diretamente pelo governo estadual ou pela administração municipal. >
“Já é comprovado hoje, matematicamente, que o SUS não custeia 100% dos procedimentos, fica apenas em 60%. Numa consulta médica, por exemplo, o SUS paga R$ 11; nenhum profissional se submete a isso”, afirma a presidente.>
De acordo com a Confederação das Santas Casas e Hospitais Filantrópicos (CMB), as dívidas já chegam a R$ 20 bilhões se somadas todas as Santas Casas do país. A Fesfba afirmou que ainda não há um balanço das dívidas na Bahia porque as entidades ainda estão fechando as contas referentes a 2021. >
Doraides Nunes ressalta que, durante a pandemia, o Governo Federal repassou R$ 2 bilhões para as Santas Casas do Brasil, mas que isso não foi suficiente, já que os custos desses hospitais, durante o período, triplicaram. “Além disso, tem uma ação que tramita no Congresso para aprovação do PL 2564/20, que daria reajuste aos salários dos profissionais da enfermagem. Mas o PL não tem indicação de fonte de recurso para viabilizar esses pagamentos. Isso causará um impacto direto nas folhas destas instituições em mais de 50% para enfermeiros e mais de 120% para técnicos e auxiliares de enfermagem”. Hospital Santo Antonio das Osid (Foto: Paula Fróes/CORREIO) Entidades pedem socorro>
O déficit das Obras Sociais Irmã Dulce (Osid) é de R$ 24 milhões. Segundo a instituição, já está sendo necessário renegociar contratos com fornecedores e prestadores de serviço. Os repasses do SUS para as Osid não tem reajuste há cinco anos. A instituição realiza cerca de 3,5 milhões de procedimentos ambulatoriais e acolhe 2,9 milhões de pacientes todos os anos. >
“Estamos renegociando contratos, fazendo todo tipo de economia possível com apoio dos funcionários, seja de água, luz, impressão. Tudo que a gente pode fazer para otimizar o pouco que temos está sendo feito. Estamos tendo um relativo atraso de pagamento de fornecedores e de médicos, mas todos entendendo esse momento e de mãos dadas para conseguir manter tudo em funcionamento”, conta a superintendente das Osid, Maria Rita Pontes. >
Maria Rita explica que o contrato das Osid com o Ministério da Saúde estabelece repasses mensais de R$ 13 milhões, mas as despesas são de R$ 19 milhões e que o governo não cobre a diferença. A previsão é de que, até o final de 2022, o déficit de R$ 24 milhões pode saltar para R$ 44 milhões. Para amenizar a situação, foi lançada na segunda (18) a campanha ‘Um Milhão de Amigos Para Santa Dulce’, para incentivar doações mensais à instituição. >
Genivaldete de Jesus Santos, 63 anos, é uma das pacientes atendidas na Unidade de Alta Complexidade em Oncologia (Unacon) das Osid. Ela recebeu o diagnóstico de câncer em 2015 e a estimativa de três meses de vida. Foi encaminhada para o tratamento, onde fez cirurgia, quimioterapia e radioterapia. Já são 7 anos desde o diagnóstico. “Foi nas Osid que as portas se abriram para mim e eu consegui tudo. Graças a Deus estou bem e em acompanhamento na instituição, onde sempre fui muito bem acolhida, com o melhor tratamento”, diz. >
Hospital infantil>
No Hospital Infantil Martagão Gesteira, o déficit mensal antes da pandemia era de R$ 500 mil; agora, já é de R$ 700 mil. A crise já tem consequências. “Ficamos com um padrão baixo de remuneração de funcionários. Não temos mais o que enxugar, não temos mais onde apertar. Ficamos com o básico e nossos projetos de expansão, aumento de serviços e melhora na qualidade do atendimento estão todos engavetados. Os recursos doados, que deveriam ser utilizados nesses projetos, estão indo para a sobrevivência do hospital”, revela o presidente da Liga Álvaro Bahia Contra a Mortalidade Infantil (entidade mantenedora do Martagão), Carlos Emanuel Melo. >
Por lá, são cerca de 80 mil pacientes e 500 mil atendimentos por ano. Trata-se do maior hospital pediátrico do Norte e Nordeste, com atendimento exclusivamente via SUS. “No Martagão, 50% dos pacientes atendidos têm renda familiar igual ou inferior a um salário mínimo. Ou seja, cuidamos das doenças mais graves que acometem a população que é mais desprovida de recursos financeiros”, acrescenta o presidente. >
Um dos serviços prestados é o de Transplante de Medula Óssea (TMO). Cada procedimento desse custa cerca de R$ 80 mil, sendo que apenas R$ 30 mil são repassados pelo SUS. O restante chega através de doações, mas, com a pandemia, essa ajuda reduziu. “Estamos sobrevivendo por causa das doações e empréstimos em bancos. Hoje, o Martagão acumula R$ 18 milhões vindos de bancos”, destaca Melo. O Aristidez Maltez atende 34% de todos os casos de câncer da Bahia (Foto: Divulgação/HAM) O Hospital Aristides Maltez, cuja mantenedora é a Liga Baiana Contra o Câncer, fechou 2021 com um déficit de R$ 10 milhões. Ele é o único Centro de Alta Complexidade em Oncologia da Bahia e funciona com atendimentos exclusivamente via SUS. No ano passado, foram mais de 167 mil consultas e 4 milhões de procedimentos realizados. Segundo Washington Couto, diretor administrativo do hospital, 34% de todos os casos de câncer da Bahia são atendidos pelo Aristides Maltez, que também recebe pacientes de outros estados.>
De acordo com Couto, a situação já era complicada e, com a pandemia, o cenário ficou ainda pior. “Tivemos uma queda nos atendimentos e, ao mesmo tempo, o aumento do preço dos insumos ligados à área de saúde. Aliado a isso, houve a diminuição das doações por conta da crise financeira que se arrasta até hoje”, diz. >
A costureira Elizete Queiroz de Freitas, de 55 anos, realiza tratamento de câncer de mama desde 2017 na instituição e lamenta a crise. “Aqui eu recebi muita atenção, tudo foi feito com muita rapidez; tive consultas, exames, tratamentos. O hospital tem estrutura, tem uma boa equipe, mas precisa de ajuda para manter isso. A gente vê que eles fazem de tudo com um orçamento apertado porque o objetivo principal é atender com qualidade. Os governos deveriam olhar mais para esses lugares que são muito importantes para muita gente que precisa”, opina. >
O que diz o governo>
O Ministério da Saúde, a Secretaria de Saúde do Estado da Bahia (Sesab) e a Secretaria de Saúde de Salvador (SMS) foram procurados para responder sobre a falta de reajustes e insuficiência de repasses para as filantrópicas. A Sesab disse, em nota, que “não houve alteração nos repasses da tabela de serviços remunerados pelo SUS, que não sofre reajustes há mais de dez anos. O que houve nos últimos dois anos é que, em função da pandemia, desde março de 2020 a tabela vinha sendo remunerada de forma cheia, conforme determinado pelas leis federais 14.601 de 2020 e 14.189, em vigor até dezembro de 2021. A partir de então, a tabela é paga por produção, como preconiza a legislação vigente”, diz o texto.>
A SMS respondeu que as entidades filantrópicas de Salvador sob gestão municipal recebem anualmente aproximadamente R$ 35.797.266,60 em incentivos federais. Além disso, o município aporta aproximadamente R$ 89.530.675,27 anuais em incentivos para complementar o financiamento das referidas instituições. "Entre os anos de 2019 e 2021, o aporte de recursos a título de incentivos – sejam federais ou municipais, destinados às instituições filantrópicas e/ou sem fins lucrativos, teve um crescimento de 29%, saltando de R$ 99.497.798,04 para R$ 128.261.281,03", diz a nota.>
O Ministério da Saúde, também por nota, disse que repassa mensalmente para as secretarias estaduais e municipais de saúde os recursos financeiros destinados ao custeio de serviços hospitalares de média e alta complexidade, incluindo os do setor filantrópico. “Em 2021, foram repassados aos fundos estaduais e municipais mais de R$ 67,7 bilhões para o custeio dos serviços em todo o país. Em 2021, entre janeiro e abril, já foram repassados R$ 18,6 bilhões para o custeio desses serviços”, diz o texto. A pasta não especificou quanto desses valores foram destinados à Bahia.>
Cenário nacional>
A Confederação das Santas Casas e Hospitais Filantrópicos (CMB) afirma que alguns repasses feitos pelo SUS para as filantrópicas não sofrem reajuste há 15 anos. Desde 2015, 315 instituições do setor fecharam as portas no Brasil. >
“Desta forma, se não houver políticas imediatas, consistentes, de subsistência para estes hospitais, dificilmente suas portas se manterão abertas e a desassistência da população é fatal”, salienta o presidente da CMB, Mirocles Véras. >
Segundo o CMB, desde o início do plano real, em 1994, a tabela SUS e seus incentivos foi reajustada, em média, em 93,77%, enquanto o INPC (Índice de Preços ao Consumidor) aumentou 636,07%, o salário-mínimo em 1.597,79% e o gás de cozinha em 2.415,94%. “Este descompasso brutal representa R$ 10,9 bilhões por ano de desequilíbrio econômico e financeiro na prestação de serviços do SUS, de todo o segmento”, pontua.>
O presidente da CMB lembra que as entidades filantrópicas são responsáveis por 70% de todo o atendimento de alta complexidade e de 50% dos atendimentos de média complexidade da rede SUS no país. “Nós atendemos as pessoas mais carentes, que não têm plano de saúde, e isso repercute diretamente na sociedade. Este alerta que estamos fazendo é para que os poderes municipais, estaduais e federal entendam que, se não tomarem providências, teremos que fechar leitos por questões financeiras”, afirma.>
Campanha Chega de Silêncio>
A Confederação das Santas Casas de Misericórdia (CMB) organizou ontem a campanha nacional Chega de Silêncio, para chamar a atenção para a crise do setor filantrópico no país. Com a campanha, algumas instituições suspenderam atendimentos eletivos. Esse foi o caso do Hospital Martagão Gesteira. Pela manhã, o ambulatório ficou vazio.>
“Nós resolvemos aderir e, se chegamos a esse ponto, se estamos expondo toda a situação e pedindo ajuda, é porque já tentamos de tudo. Trata-se de uma paralisação simbólica e todos os atendimentos foram reagendados desde a semana passada”, afirmou o presidente da liga mantenedora do Martagão, Carlos Emanuel Melo. Segundo ele, o nome da campanha é sugestivo e mostra que a quebra do silêncio é um pedido de socorro.>
“As filantrópicas formam um apoio fundamental à rede pública do SUS. Não podemos permanecer em silêncio e corremos risco futuro de termos que suspender serviços. Estamos falando de crianças de toda a Bahia assistidas pelo Martagão”, ressalta.>
Já as Osid não suspenderam o atendimento, mas realizaram um ato simbólico em apoio à campanha. Às 9h, profissionais da entidade fizeram um minuto de silêncio “para alertar a sociedade sobre a mais grave crise financeira já enfrentada pelo setor”. No momento, as luzes foram desligadas nos diversos setores de todas as unidades da instituição, desde os núcleos de atendimento até o Santuário Santa Dulce dos Pobres.>
O presidente da CMB (Confederação das Santas Casas e Hospitais Filantrópicos), Mirocles Véras, diz que a paralisação não prejudicou nenhum paciente. “Todos esses atendimentos foram remarcados. A urgência e emergência dos hospitais não sofreram nenhuma alteração. O objetivo principal é chamar a atenção das autoridades, então muitas entidades estão apoiando a campanha, divulgando a causa, sem necessariamente paralisar”. >
Como ajudar?Osid: Para participar da campanha “Um Milhão de Amigos Para Santa Dulce” e ajudar a Osid, basta acessar o site www.1milhaodeamigossantadulce.org.br e realizar sua doação. As pessoas podem doar a partir de R$ 10, mas o importante é continuar mantendo a doação todo mês. Dessa forma, será possível manter o legado de Santa Dulce dos Pobres.Aristides Maltez: Pix - CNPJ: 15180961000100 / Razão Social: Liga Bahiana Contra o Câncer>
Depósitos bancários - >
Banco do Brasil (AG: 3025-2/Conta Corrente: 9892-2); Santander (AG: 3041/Conta Corrente: 13.000.557-9); Bradesco (AG: 3679-1/Conta Corrente: 361-1); Itaú (AG: 0226/Conta Corrente: 47817-0); Caixa (AG: 1236/Operação: 003/Conta Corrente: 1477-0)>
Outras opções de doação podem ser conferidas no site https://www.aristidesmaltez.org.br/doacoes/ Martagão Gesteira:Pix - Chave: [email protected]>
Depósitos bancários ->
Bradesco (AG: 0286-4/Conta Corrente: 191228-3); Banco do Brasil (AG: 0346-8/Conta Corrente: 4016-9); Caixa (AG: 4248/Conta Corrente: 00902695-3); *Operação:03 Itaú (AG: 8872/Conta Corrente: 20869-2); Santander (AG: 3041/Conta Corrente: 13000059-8)>
Outras opções de doação podem ser conferidas no site https://martagaogesteira.com.br/doe-agora/ >
Telefone para informações sobre doação: (71) 3032-3773>
Martagão Gesteira Transferência bancária, depósito, boleto, débito em conta, cartão de crédito e PIX são as principais maneiras para realizar doações financeiras e ajudar o Martagão a levar mais saúde para milhares de crianças baianas.>
Para ajudar a instituição filantrópica, as doações podem ser feitas pelo telefone: (71) 3032-3773 e pelo site da instituição: https://martagaogesteira.org.br/doe-agora. Dos pacientes do hospital, cerca de 50% são oriundos de famílias cuja renda é igual ou inferior a um salário mínimo. As doações podem ser feitas, também, via PIX, sem taxas, por meio da chave [email protected].>