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Idoso é readmitido em emprego 59 anos após ser preso pela ditadura militar

Bancário passou 12 dias sob torturas em 1964

  • D
  • Da Redação

Publicado em 28 de abril de 2023 às 06:27

 - Atualizado há um ano

. Crédito: Reprodução

Um idoso de 80 anos foi readmitido no trabalho quase seis décadas após ser preso pela ditadura militar. Osmar Ferreira trabalhava no Banco do Estado da Bahia (Baneb), em Feira de Santana, e ficou 12 dias sob torturas dos militares. Ele se apresentou ao banco para readmissão nesta quarta-feira (26).

Em 8 de abril de 1964, o jovem Osmar tinha acabado de completar 21 anos. O que ele acreditava ser apenas mais uma quarta-feira de trabalho na agência se tornou um pesadelo: um sargento do Exército e dois sargentos da Polícia Militar entraram com metralhadoras no banco e levaram-no preso, sob a acusação de comunismo.

Ferreira começou a trabalhar no banco aos 17 anos. Durante o ensino médio, sempre foi envolvido com movimentos estudantis, chegando à liderança do Movimento Estudantil dos Secundaristas de Feira de Santana. Ele foi fundador, junto com um amigo, da Associação de Empregados dos Estabelecimentos Bancários, em 1961, que se tornaria mais tarde o Sindicato dos Bancários da cidade.

No dia 7 de abril, fez 21 anos. Nos 12 dias que se seguiram, Ferreira foi torturado e interrogado por informações que não tinha. Foi liberado condicionalmente no dia 20, com auxílio de advogados conhecidos. Foram duas semanas que ressoaram por toda a sombra da carreira que poderia ter tido, mas foi cortada precocemente. Ele foi demitido do banco e, com dificuldades de arranjar emprego na cidade, saiu de Feira de Santana e tornou-se caminhoneiro, como o pai. Depois, fez faculdade de Direito e começou a atuar como advogado.

O Banco da Bahia, antes público, foi comprado pelo Bradesco em 1999. Com o conhecimento adquirido na graduação, Ferreira fez um requerimento ao banco em 2003, que só foi julgado em dezembro de 2010. Abriu uma ação trabalhista, para que o banco pague os direitos trabalhistas desde o momento da demissão até hoje. 

A juíza responsável pelo caso homologou o pedido e mandou penhorar o valor devido a ele pelo banco. Entretanto, a instituição entrou com uma medida judicial, alegando que ele não tinha direito a nenhum pagamento, apenas à readmissão. 

E assim está sendo: por pedido da juíza, na quarta-feira (26) Osmar Ferreira se apresentou ao Bradesco para iniciar o processo de readmissão. Antes de voltar a trabalhar efetivamente, o idoso precisará passar pelos exames admissionais. Até agora, segundo o idoso, não há movimentação do banco para pagar os seus direitos trabalhistas. Entretanto, ainda assim, Ferreira mostra-se satisfeito só por voltar. “É aquela história: dinheiro não é tudo na vida. A honra e a dignidade são o mais importante para o ser humano, e eu me sinto honrado em ter sido readmitido”, diz.

Procurado pelo CORREIO, o Banco Bradesco disse que não vai comentar o caso.

Busca por justiça De acordo com Ferreira, a Comissão de Anistia foi essencial para a obtenção de justiça no seu processo de reclamação trabalhista. O órgão, criado em 2003 para analisar o requerimento de anistias para prisões e violências sofridas durante a ditadura militar, busca a restauração da justiça e da memória das violações cometidas nessa época.  

O bancário é anistiado político desde 2010. Ele só voltou a se envolver com o sindicato após a anistia, quando se refiliou. Segundo Ferreira, ele não podia fazer isso antes da anistia por risco de ser preso novamente.

Hoje, apesar de reconhecer a incapacidade de monetizar os traumas sofridos em 1964, Ferreira diz estar honrado por poder voltar ao trabalho. “Eu me sinto feliz. É uma vitória, mas não tem salário, não tem indenização nenhuma por tudo que eu sofri. Mesmo sendo uma vitória de pingo, vira um exemplo para a categoria bancária e para os trabalhadores brasileiros, que não devem desistir nunca de lutar por seus direitos. Aos 16 anos, eu adotei como lema de vida o seguinte: lutar sempre, não desistir jamais. O poder econômico é forte, mas não é invencível”, afirma.

Caso semelhante No estado de Alagoas, um bancário demitido no início da ditadura militar foi reintegrado em 2016, aos 76 anos. A luta judicial foi grande. Em 2020, Petrúcio Lages, que trabalhava no Banco do Nordeste do Brasil (BNB), foi demitido novamente pelo banco, sob a alegação de que já tinha idade superior a 75 anos, limite etário dos servidores públicos. 

O idoso, que faz parte da diretoria do Sindicato dos Bancários, foi readmitido e demitido mais duas vezes, uma em 2021 e outra em 2022. Entretanto, como há também a métrica do tempo de atuação de 15 anos, que Lages não atingiu por ter seu trabalho interrompido pela ditadura, ele conseguiu vencer essa disputa e continuar no seu novo-antigo emprego.

No dia 11 deste mês, foi determinado que o banco o reintegre, hoje aos 83 anos, na mesma função e recebendo o mesmo salário e com as mesmas vantagens que recebia antes de ser afastado. 

*Orientada pela subeditora Fernanda Varela.