Autor de lance único em leilão desiste de arrematar Arquivo Público

O prédio, portanto, ainda integra o patrimônio público

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  • Da Redação

Publicado em 24 de outubro de 2022 às 14:58

. Crédito: Reprodução

O proponente do lance único para arrematar o imóvel do Arquivo Público desistiu da aposta. O leilão foi realizado no último dia 17 de outubro. O prédio, portanto, ainda integra o patrimônio público do Estado da Bahia.

Segundo o governo do estado, a oferta, feita cinco dias antes da realização do leilão, era de R$5 milhões a menos do que o valor atribuído ao imóvel e, por isso, se apresentava como uma medida especulativa, o que "poderia provocar dano ao erário público".

A Procuradoria Geral do Estado reiterou o compromisso de manter esforços para garantir a manutenção do patrimônio. O órgão destacou que "fará uso de todos os expedientes legais possíveis para afastar as tentativas de apropriação deste bem fundamental para a cultura baiana e brasileira".

Leilão

O imóvel é avaliado em R$ 12.575.829,62, segundo o site da casa de leilões. O imóvel, chamado de Solar da Quinta dos Padres ou Quinta do Tanque, é tombado pelo Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) desde 1949. Desde 1980, o Apeb está sediado no endereço.

A notícia do leilão logo provocou uma enxurrada de notas de repúdio emitidas por entidades de arquitetos e arquivistas ligados ao patrimônio e à Universidade Federal da Bahia (Ufba). O presidente do Conselho de Arquitetura e Urbanismo da Bahia (CAU), Neilton Dórea, afirmou que "a edificação é tombada e não pode ser vendida nem ter outro tipo de mudança, só para outro ente federal, estadual ou municipal". O Instituto de Arquitetos do Brasil, departamento da Bahia, e o Instituto de Ciência da Informação da Ufba também repudiaram a venda. "É impressionante o descuido e desrespeito com o patrimônio público. Não abrem diálogo com a sociedade", afirma Dórea.A legislação proíbe a venda de prédios tombados, exceto se forem repassados para outros órgãos públicos.

De casa de repouso a acervo  O prédio foi construído no século 16 para ser a residência de padres jesuítas - por isso ele é conhecido como Solar da Quinta dos Padres ou Quinta do Tanque. Lá, o padre Antônio Vieira escreveu muitos dos seus sermões. Depois de servir de casa de repouso para os jesuítas, o Solar passou por obras no século 18, que o transformaram em um centro onde eram confinadas pessoas com hanseníase. No século 19, o prédio passou por novas reformas.

Só em 1980, o Arquivo Público passou a funcionar no imóvel. Pouco a pouco, tornou-se a meca dos pesquisadores baianos. Um deles é Vilson Caetano, antropólogo e professor da Ufba, que diz ter uma "relação visceral" com o Arquivo, sua "segunda casa".

Conforme adquiria experiência pelos corredores do Arquivo, Vilson aprendeu que o lugar tinha sua própria linguagem geográfica. Os pesquisadores costumam chamar as divisões do Arquivo de "fundos". Vilson vivia no "Fundo da República, ou seja, na documentação após 1889". "Para nós, que trabalhamos com memória, o Arquivo é esse lugar privilegiado que deve ser preservado e cuidado", diz Vilson. O Apeb é a segunda maior instituição arquivística do país e está entre as maiores do mundo. Ele armazena uma gama de documentos que, se organizados de maneira linear no chão, formariam um caminho de sete quilômetros. 

Entre os 40 milhões de documentos dos acervos, há destaque para os manuscritos e impressos originais, produzidos, recebidos e acumulados quando a cidade de Salvador se distinguiu por ser a capital político-administrativa do Estado do Brasil, de 1549 a 1763. O Apeb ficou fechado para reformas desde janeiro de 2019 e foi reaberto em novembro do ano passado.